sexta-feira, 29 de junho de 2007

Clube Literário do Porto








A não perder, na próxima semana:

02 de Julho de 2007 – 2ª Feira
Piano-bar, 21:30
Poesia em Família

06 de Julho de 2007 – 6ª feira
Auditório, 21:30
Conferência sobre Bocage por Daniel Pires - Centro de Estudos Bocagianos


O Clube Literário do Porto fica na Rua Nova da Alfândega, n.º 22 - Porto
E o site, aqui: www.clubeliterariodoporto.org

Novidades Caminho






O PEN Clube Português e a Editorial Caminho vão homenagear Sophia de Mello Breyner Andresen com a edição do livro A Sophia, com textos dedicados à poeta, da autoria de dezenas de sócios do PEN Clube e seus companheiros de ofício.
A sessão de apresentação terá lugar no próximo dia 2 de Julho, pelas 18.30 horas, na Sede da Editorial Caminho - Auditório Vítor Branco (Avenida Almirante Gago Coutinho, 121 - Lisboa).

Encontro Poético no Palácio Galveias




Vai realizar-se amanhã, 30 de Junho, entre as 19h00 e as 20h30, mais um Encontro Poético no Palácio Galveias (Campo Pequeno – Lisboa) organizado pela Associação Portuguesa de Poetas, desta vez dedicado a Sophia de Mello Breyner Andersen.
Haverá ainda uma palestra por Piedade Tomé de Almeida.

Espectáculo de Poesia em Loulé





Vai realizar-se amanhã, 30 de Junho, pelas 15 horas, na Biblioteca Municipal Sophia de Mello Breyner, em Loulé, o Espectáculo "Poeta em Construção" com a Actriz Eunice Muñoz.
Este espectáculo está integrado no projecto “Letras ao Sul”, numa organização da Biblioteca, com coordenação da Direcção Regional de Cultura do Algarve, concepção e realização de Paulo Pires e Sónia Pereira do Grupo Experiment’art.
O projecto “Letras ao sul” realiza-se em todos os concelhos algarvios desde o último mês de Março até ao mês de Dezembro, integra diversas acções de promoção da leitura e do livro, em que participam reconhecidas personalidades do mundo da poesia, da ficção, da declamação e do teatro, e insere-se no âmbito do Plano Nacional de Leitura.
O título deste recital baseia-se no poema “Operário em Construção” de Vinicius de Moraes.
Os textos escolhidos para o recital são de autores contemporâneos como Jorge de Sena, Fernando Pessoa, Sophia de Mello Breyner Andresen, Alberto Pimenta, Mendes de Carvalho, Vinicius de Moraes, Adília Lopes, José de Almada-Negreiros, Florbela Espanca, Ferreira Gullar, José Carlos Ary dos Santos, Carlos Drummond de Andrade, Alexandre O’Neill e Nuno Júdice.
A entrada é livre.

Poemas em voz alta

Num meio-dia de fim de primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu tudo era falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas —
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque nem era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.

Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E que nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!

Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o Sol
E desceu no primeiro raio que apanhou.

Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as cousas.
Aponta-me todas as cousas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.

Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar no chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou —
"Se é que ele as criou, do que duvido." —
"Ele diz, por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres."
E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural.
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre,
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.

A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é o de saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.

Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo um universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.

Depois eu conto-lhe histórias das cousas só dos homens
E ele sorri, porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos-mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do Sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos dos muros caiados.

Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.

Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate as palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam?

Alberto Caeiro
(O Guardador de Rebanhos - VIII)

Na voz de Luís Gaspar:

quinta-feira, 28 de junho de 2007

Novidades Quasi







"Dióspiro"
Poesia reunida de Daniel Maia-Pinto Rodrigues

A apresentação terá lugar no Teatro do Campo Alegre (Rua das Estrelas), no Porto, na sessão Quintas de Leitura. Será no dia 5 de Julho, às 22 horas, no Café Teatro.
Contará com a participação especial de Yolanda Castaño e haverá leituras de Filipa Leal, Isaque Ferreira e Pedro Lamares.

Daniel Maia-Pinto Rodrigues nasceu no Porto em 1960. Este é o seu nono livro, tendo já publicado nas Quasi, o titulo O Afastamento Está Ali Sentado. Recebeu o Prémio Literário e uma menção honrosa atribuídos por Vasco Graça Moura, Fiama Hasse Pais Brandão, Jorge Velhote e Filomena Cabral. Em prefácios, imprensa, sessões públicas, escreveram ou falaram sobre a sua poesia nomes como Mário Cláudio, Manuel António Pina, José Emílio-Nelson, Pedro Eiras, Isabel Rio Novo, Maria Helena Padrão e Rosa Maria Martelo. Está representado em diversas antologias, entre as quais Os Poemas da Minha Vida de Marcelo Rebelo de Sousa.

quarta-feira, 27 de junho de 2007

Venham daí esses poemas felinos!














Quantos escritores e poetas não criaram as suas obras na companhia destes admiráveis animais? Alguns, transformaram-nos em personagens das suas obras ou teceram considerações filosóficas a respeito dessa ligação entre os gatos e a literatura.
Gatos e livros são, de facto, uma relação perfeita. Nenhum outro animal sabe respeitar tão bem o silêncio de quem lê ou de quem escreve. Será por isso que os elegemos como nossos companheiros de silêncio?
Ou serão os gatos que escolhem viver com os escritores e poetas? Quantos gatos não gostam de livros, de se deitar em cima deles, de se enfiar em estantes exíguas? Quantos não escolhem bibliotecas para viver?
O desafio que vos faço, desta vez, é que me enviem os vossos poemas sobre gatos. Como de costume, publicarei todos, mas um será escolhido para ser gravado em audio pelo locutor Luís Gaspar. Esse poema escolhido entrará também na rubrica "Lugar aos Outros" do audioblogue do locutor Luís Gaspar e, também, no recém-criado blogue sobre gatos: queridos-gatos.blogspot.com.
Como estamos já em tempo de férias, receberei os vossos poemas "felinos", até ao dia 31 de Agosto, pelo e-mail: inesramos.designer@gmail.com
Os poemas serão publicados a 9 de Setembro.

Boa inspiração!

domingo, 24 de junho de 2007

Livro de Dick Hard (Luís Graça) no "Show do Unas"





Continuando no tema da poesia erótica/satírica, aqui vos deixo o vídeo de um dos últimos programas de Rui Unas, inteiramente dedicado ao livro de Luís Graça.

Como já aqui tinha anunciado, Luís Graça editou recentemente (juntamente com outros dois livros de contos) o livro de poesia satírico-erótica "De Boas Erecções está o Inferno Cheio - King Kong Size". Esta é uma edição de autor (que aqui assina com o pseudónimo Dick Hard), que vem no seguimento de uma edição anterior, da Polvo, de 2004.
Esta edição recente, bastante aumentada, tem quase toda a poesia erótica e satírica de Luís Graça escrita entre 1989 e 2007, e, também, uma secção de poesia lírica com 72 poemas.



Neste "Show do Unas" (obviamente devido ao público-alvo do programa), Rui Unas escolheu, talvez, os mais "obscenos". E, claro que, num programa com poucos minutos, é impossível mostrar todo o panorama genial da poesia erótica e satírica de Luís Graça. A única opção é comprar o livro.
De toda a maneira, deixo-vos com mais dois poemas (um da secção "Satírica" e outro da secção "Líricas"). Tal como Bocage, na sua época, Luís Graça sente, ainda em pleno séc. XXI, o peso da incompreensão pela sua poesia. O "poeta maldito", só talvez daqui a uns séculos venha a ocupar o lugar que merece. Talvez nessa altura os seus livros não sejam escondidos e, finalmente, algumas editoras façam "fila" para editar os seus poemas.



TOMBSTONE

Há sempre um primeiro verme para nos bicar
o caixão desceu à terra há pouco tempo
há sempre um verme feioso que é mais atrevido
cheira a verme, sabe a verme, é mesmo verme

Estamos quietos, ledos, calmos, dóceis, indefesos
deitados em silêncio, horizontais, a cal no focinho
tal como gostam os vermes atrevidos e feiosos
que avançam nas trevas para nos bicar

Afagam-nos os lábios, o nariz, as orelhinhas
lambem-nos os dedos, petiscam-nos as unhas
afiam os dentinhos e avançam decididos
p'ra mais um lauto banquete da sua vérmica existência

Pensam que tudo lhes será permitido
até saborear o nosso cérebro que gostava de praia
até mexer no nosso sexo que gostava de seios
até puxar os nossos pelos que cresciam viçosos

Só nos resta a dignidade de ser Homens
só nos resta a solução final
abrir a boca em fogo e vomitar:
"Some-te verme, aqui jaz um poeta!"



OS MEUS BEIJOS DE ONTEM

Ao cair da tarde
descobri uma manada de beijos
fora do tempo

Andavam aos saltos
como crianças
a provocar o sol

Dançavam valsas
mordiam na brisa
e contavam mentiras

Ganhei coragem
e perguntei
de coração nas mãos:

“Quem sois vós
que desafiais os deuses
com tanta alegria?”

“Não sabes?” — responderam
“Somos os beijos que não deste
no tempo certo”



O livro pode ser adquirido enviando um e-mail para o Luís Graça:
lg.vongrazen@gmail.com

sábado, 23 de junho de 2007

Poesia Erótica

Conforme prometido, aqui ficam todos os poemas recebidos até 15 de Junho:



Foi num adeus que mais te amei
nas nossas mãos as cores cantaram
numa harmonia de saudades futuras
nos quereres contorcidos em ondas quentes
onde o lenço imaginado corria pelo vento
nas ruas da nossa cidade encantada
só de palavras e afeições longas
olhávamos as folhas em silêncio
por tanto querermos os toques
em arrepios de ternuras
lânguida corri pelo teu corpo
por nada nele deixar de querer
fiquei embevecida com o teu canto
por infinitos tempos das nossas peles

Constança Lucas

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Momento

Piano de fundo,
é Jarrett em Viena,
um murmúrio
na roupa
que largamos em cena...
Umas mãos saudosas,
suaves e quentes,
invadem
teus espaços
incandescentes...
A boca de nós dois
resolve o mistério
por detrás
do sabor
de um beijo sério...
As verdades que vestimos
deixámos à porta,
que aqui dentro,
o momento,
é só o que importa...
Tens na pele
marcado
o mestrado da vida
e eu tenho na minha
suavidade contida...
Gritas e gemes
no teu mar revolto,
arrepios
atravessam-te
quando te volto...
Com as mãos na parede
eu entro em teu corpo,
vês que na verdade
ele tem estado
morto...
As mãos saudosas,
que agarram o arrepio,
são vivas lembranças
do teu rodopio...
Deixaste-me o corpo,
escorrendo prazer,
encontrei-te
nas nuvens
e refiz-te Mulher...
Se o orgasmo que soltas
for um grito infinito,
nós dois cantaremos
no prazer
deste calor...
bendito.

Rui Diniz

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Invento-me...

Invento-me neste desejo de te abraçar...

Invento-me hera, planta trepadeira,
agarro minhas gavinhas,
minhas expansões, com força,
em tuas estacas, para me poder à terra fixar...

Invento-me abelha, insecto,
Apenas para invadir a tua flor,
Que nasceu de meu desejo,
Para em teu mel, esse néctar,
a minha sede eu poder saciar ....

Invento-me leoa perdida de seu cio,
À procura de um trilho, um sinal, rasto teu,
Para que na floresta da vida,
Eu te possa encontrar...

Invento-me vento, Nortada, brisa, aragem,
Para de forma empolgada,
Agitar teu rio, ondular teu mar...

Invento-me, nestas todas metamorfoses
de ser eu própria, que trago silenciadas no meu espírito,
E ensaio-me assim, neste ser,
Nestas mil formas adoptadas,
Só porque te encontro ao inventar-me,
Mas porque te invento somente a ti!

Beatriz Barroso

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Paráfrase sobre a "Canção das Canções"

Desce a noite. Despedi-me dos pastores.
Inebriado pelo perfume do mosto olho para a minha amada.
Surge-me como a aurora, bela como a lua, brilhante como o sol.
Desperta no leito de cedro coberta de penas de pomba.
A mais bela de todas as mulheres extasia-se ao ver-me.
E pelo seu corpo verdejante como floresta perfumada
Pastam rebanhos de gazelas, corços, veados saltaricando na sombra dos seus cabelos.
A sua voz doce de favos, reclama-me e extasia-me.
- Leva-me contigo, meu amado. Ou deita-te a meu lado e canta-me amores.
Sou morena. Sou formosa. Sou tua. Ponho no meu pescoço
O colar de pérolas que exala o perfume do nosso vinho.
Repousa a tua cabeça nos meus seios, no meu ventre de lírios,
Na doçura da minha boca de frutos silvestres,
Quero desfalecer de amor nos teus braços fortes. Conforta-me.
Como és encantador e belo, meu amor. Vamos para o festim da floresta
Que já entoa a chegada da Primavera.
E introduz-me uvas passas na minha boca que espera a tua.
Saboreia a minha saliva e ouve a minha voz que te segreda palavras de conforto
Porque esta noite procurei-te e não te encontrei. Desejo ser tua
Como na primeira vez quando nos encontrámos nos outeiros.
Quero conceber dum amor frenético, penetrante, quente, aromático.
Oh! meu amado amigo e esposo. Os ninhos já estão prontos.
Escolhamos o nosso.
E faz-me ouvir a tua voz desfalecida quando me abraças e me possuis.
Como são deliciosos os teus afagos, as tuas carícias,
Os beijos com que cobres o meu corpo inteiro. O aroma que vem de ti
Excede o de todos os aromas.
Desfaleço de amor. Os teus lábios são lírios, que destilam a mirra mais preciosa.
Bebe do nosso vinho perfumado, sacia a tua sede de desejo e toma-me.
Leva-me.
Desfaleço de amor mas não tenhamos pressa.
Quando regressarem os pastores
Estamos escondidos na ilha dos amores.

Luís Pinto

.....................

Meu falo, meu touro

Meu falo, touro
em ponta, desembolado
alfange, mouro, em ronda
sempre excitado

Eu calo, rouco
e tu zonza, nua num estrado
que range, pouco
numa onda, sodomizado

Meu halo, louco
é santo divinizado
abrange in loco e conta
que é castrado

Empalo, touro
meu falo, desembolado
alfange, mouro, em ronda
foi sepultado

Luís Graça

.....................


E, finalmente, o poema que foi escolhido para ser gravado em audio pelo locutor Luís Gaspar:


Anelo

Quem me dera ser o vento:
tu, nua, receberias
nos teus seios meu alento.

Ou ser rosa:
a cortarias, no teu peito a deporias
como adereço opulento.

António Salvado




A todos, muito obrigada pela participação.
E até ao próximo desafio!

.................

Nota posterior à publicação deste post:
O locutor Luís Gaspar fez um programa no seu audioblogue “Estúdio Raposa” dedicado à poesia erótica, declamando todos os poemas que participaram neste evento sobre Poesia Erótica, que vos convido a ouvir, aqui.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

Novidades Campo das Letras





CESÁRIO VERDE

Visões de artista
Organização de Helena Carvalhão Buescu e Paula Morão

Ensaios de diversos especialistas vindos de universidades portuguesas e estrangeiras — e também de fora da instituição académica — participantes no colóquio que assinalou os 150 anos do nascimento de Cesário Verde, mostrando perspectivas complementares no estudo de aspectos muito diversos quer da obra poética, quer da correspondência de Cesário Verde a que temos acesso.
Ensaios de autoria de professores universitários, de professores do ensino secundário e de estudantes de pós-graduação, estudos de intenção didáctica, virada para o estudo da obra no ensino secundário, e de coordenadores de bibliotecas públicas, os quais deram conta de práticas de divulgação da leitura do poeta para públicos muito diversificados.

Textos de: Ana Jardim, Ana Luísa Alves, Ana Santos, Duarte Drumond Braga, Fátima Rodrigues, Fernando Cabral Martins, Fernando Pinto do Amaral, Gabriel Magalhães, Helder Macedo, Helena Carvalhão Buescu, Inês Cordeiro Silva Dias, Isabel Rio Novo, João Minhoto Marques, José Carlos Seabra Pereira, Luís Mourão, Maria das Graças Moreira de Sá, Nicola Cooney, Paula Morão e Teresa Cristina Cerdeira.

quinta-feira, 21 de junho de 2007

Um olhar italiano sobre a Poesia portuguesa contemporânea




O Ciclo Encontros com a Poesia portuguesa e italiana contemporânea é uma iniciativa do Instituto Italiano de Cultura de Lisboa para promover o conhecimento e o amor pela leitura da poesia e pela escrita poética contemporânea.

No âmbito do mesmo ciclo, hoje, 21 de Junho, às 18h30, no Instituto Italiano de Cultura de Lisboa, terá lugar a Conferência UM OLHAR ITALIANO SOBRE A POESIA PORTUGUESA CONTEMPORÂNEA, por Maria Luisa Cusati, Cônsul Honorário de Portugal em Nápoles e docente de Língua e Literatura Portuguesa no Istituto Universitario Orientale e na Università degli Studi Suor Orsola Benincasa de Nápoles, e por Manuel Simões e com a participação do poeta e escritor português Manuel Alegre, autor, entre outros, da colectânea de poemas “O canto e as armas”, “Senhora das tempestades”, tendo este livro ganho o grande prémio de poesia “APE-CTT” e o Prémio da Critica em 1988.

Durante o encontro será analisado o tema do acolhimento da poesia portuguesa em Itália, o interesse dos últimos anos pelos autores portugueses e pela poesia contemporânea, bem como a importância da tradução.

O Instituto Italiano de Cultura fica na Rua do Salitre, 146, em Lisboa.

terça-feira, 19 de junho de 2007

VOLTE-FACE




Performance VOLTE-FACE, dia 23 de Junho, pelas 22 horas.
O detonar dos sentidos de volta em pleno VOLTE-FACE!
Nova ocasião para conhecer de perto na CrewHassan (www.crewhassan.org) estes encantadores poetico-visuais em performance de bradar palavra + música + vídeo/multumefia + dança, unidos para o acender da chama deVida!
Rua das Portas de Santo Antão, 159 – 1º

Luís de Camões na Tertúlia de Poetas de Sintra




A Tertúlia de Poetas de Sintra avança, este mês de Junho, em direcção à obra de Luís de Camões.
Esta tertúlia será o nono e último ponto de paragem de uma viagem literária, principalmente da poesia.
A iniciativa, que já passou pelas localidades de Queluz, Agualva-Cacém, Montelavar, Rio de Mouro, Algueirão-Mem Martins, Gouveia/S.João das Lampas, Pero Pinheiro e Colares, o Traço Comum ruma agora ao centro da vila de Sintra.
O encontro terá lugar no dia 21 de Junho, no Café Central, no centro da vila de Sintra (em frente ao palácio da Vila).
O poeta local representado será Carlos de Melo, com o intérprete João Baião. Uma iniciativa do Ginásio Clube de Queluz e a Casa das Cenas - Educação pela Arte.

Conversas de Poesia



Hoje, na Livraria Bulhosa do Linda-a-Velha Central Park (em colaboração com a Junta de Freguesia de Linda-a-Velha), pelas 17 horas, haverá:
Conversas de Poesia
Por Tito Lívio
Com Joaquim Pessoa

Jograis "U...Tópico"












Quarta-feira, 27 de Junho, no Café Império
(Av. Almirante Reis - Lisboa)
De novo no Café Império, na última quarta-feira do mês, o Grupo de Jograis "U...Tópico" leva a efeito um recital, pelas 21h30, que será apresentado por Maria do Céu Miguel, em que dirá a poesia do multifacetado artista angolano (compositor, cantor, artista plástico e poeta) Eleutério Sanches. A sua poesia, que estabelece uma ponte lusófona e afectiva entre Angola e Portugal, — sobretudo Luanda e Lisboa — irá sendo dita pelos Jograis e seguidamente cantada pelo próprio que se fará acompanhar pela sua viola e pela de seu irmão Carlos Sanches.

Mais informações em: http://www.jograis-utopico.com

segunda-feira, 18 de junho de 2007

“Terra de Húmus e Neblinas”






O Livro de poesia “Terra de Húmus e Neblinas”, de João-Maria Nabais será lançado no próximo dia 23 de Junho, pelas 16.00 horas, no Auditório da Biblioteca Municipal do Barreiro.
A apresentação está a cargo de Francisca Trindade, da CMB, e a leitura de poemas será feita por Alexandra Santos e pelo autor.
Da sua obra literária fazem parte os livros: O Silêncio das Palavras; Crepúsculo das Noites Breves; Instantes e Vivências; POEMAS; Novos Navegantes; Memórias de Amor e Sedução; Cidade dos Rios; Sons de Urbanidade; Espírito do Vento; Monsaraz; Palhais; Criança, Um Tempo de Fuga; Interior à Luz; O Lugar e o Mito e Terra de Húmus e Neblinas.
João-Maria Nabais é Licenciado em Medicina e Cirurgia na Faculdade de Medicina da Universidade Clássica de Lisboa. Pertence ao grupo de Fundadores da revista literária “SOL XXI” e da Direcção da Associação Cultural “SOL XXI”. Escreve regularmente em revistas e jornais.
Foi galardoado com os Prémios António Patrício de Poesia – 1996, 2002, e 2006 com os livros: Poemas, Sons de Urbanidade e O Lugar e o Mito, todos estes pela Sociedade Portuguesa de Escritores e Artistas Médicos; e a Medalha de Mérito Cultural da Associação de Escritores Médicos e Jornalistas de Bucareste – Roménia / 04

sábado, 16 de junho de 2007

quinta-feira, 14 de junho de 2007

Homenagem a Couto Viana


No próximo sábado 16 de Junho, a Associação Portuguesa de Poetas vai prestar homenagem ao poeta António Manuel Couto Viana, num almoço no Restaurante “Vá Vá”, (Av. Estados Unidos da América, 100 C – Lisboa) pelas 13 horas.
O poeta estará presente para receber da Associação Portuguesa de Poetas o título de Sócio Honorário e ainda um cartão em prata e um diploma de associado da APP.
Depois do almoço, os poetas da APP dirão poemas de António Manuel Couto Viana ou poemas de sua autoria a ele dedicados.

Centro Vitorino Nemésio


A Câmara Municipal da Praia da Vitória vai inaugurar na próxima quarta-feira um Centro de Estudos e Museológico sobre a vida e obra de Vitorino Nemésio, localizado na casa onde o autor nasceu, que vai fazer parte de um roteiro turístico nemesiano a criar pela autarquia da Praia da Vitória.

Poeta, ficcionista, crítico, biógrafo e investigador literário, Vitorino Nemésio nasceu em 1901 na Praia da Vitória (Terceira) e faleceu em Lisboa em 1978.
O seu romance mais conhecido é «Mau Tempo no Canal» (1944), mas a sua primeira obra foi o livro de poesia «Canto Matinal» (1916).


A Concha

A minha casa é concha. Como os bichos
Segreguei-a de mim com paciência:
Fachada de marés, a sonhos e lixos.
O horto e os muros só areia e ausência.

Minha casa sou eu e os meus caprichos.
O orgulho carregado de inocência
Se às vezes dá uma varanda, vence-a
O sal e os santos esboroou nos nichos.

E telhados de vidro e escadarias
Frágeis, cobertas de hera, oh bronze falso!
Lareira aberta ao vento, as salas frias.

A minha casa... Mas é outra a história:
Sou eu ao vento e à chuva, aqui descalço,
Sentado numa pedra de memória.

Vitorino Nemésio

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Hoje nasceu...




13 de Junho de 1888

Fernando Pessoa

Poeta português




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Lisbon Revisited
Não digas nada!...
Na sombra Cleópatra jaz morta...
O menino da sua mãe
Paira à tona de água...
Quando vier a Primavera...
Que noite serena!...
Santo António
Se sou alegre ou sou triste?...
Sou um evadido...
Tabacaria
Tenho dó das estrelas
Tenho uma grande constipação...
Todas as cartas de amor são...

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“Manuscritos de Pessoa com acesso universal”
“Portal Pessoa”
"Tabacaria", de Álvaro de Campos
“Pessoa para os mais novos”
“Fernando Pessoa no Salão do Livro de Casablanca”
“Fernando Pessoa por Nuno Miguel Henriques”
“A Música em Pessoa”
"As Mensagens da Mensagem - O Desvendar dos Mistérios"
BN adquiriu caderno manuscrito de Pessoa
Fernando Pessoa, uma das personalidades mais influentes da cultura europeia
Ciclo de Conferências "O Guardador de Papéis"
SPA comemora os 120 anos do nascimento de Fernando Pessoa
Pessoa, Pessoas
Fernando Pessoa em hip hop
Concerto Pessoano
Poesia de Fernando Pessoa Para Todos
Poemas de Alberto Caeiro traduzidos para a língua checa
Espólio de Pessoa na internet
Pessoa na Banda Desenhada
Mostra de livros de Fernando Pessoa na UFP
Curta metragem Pessoalmente

Na estante de culto:
“Fernando Pessoa – Obra poética”

Fernando Pessoa

Fernando António Nogueira Pessoa nasceu em Lisboa no dia 13 de Junho de 1888.
Após a morte do pai, causada por tuberculose, a família foi obrigada a leiloar parte dos seus bens e depois do segundo casamento da mãe, por procuração, com o comandante João Miguel Rosa, cônsul de Portugal em Durban, Fernando Pessoa partiu com a mãe e um tio avô para a África do Sul (Durban).
Em 1894 criou o seu primeiro heterónimo, Chevalier de Pas. Frequentou várias escolas, recebendo uma educação inglesa, passando por um colégio de freiras irlandesas da West Street (1897), e pela Durban High School, onde criou o heterónimo Alexander Search (1899). A partir de 1901 escreveu os primeiros poemas em inglês. A família retornou a Lisboa em 1902, mas Pessoa voltou sozinho para a África do Sul. Em 1903 submeteu-se ao exame de admissão à Universidade do Cabo da Boa Esperança. Não obteve uma boa classificação, mas tirou a melhor nota entre os 899 candidatos no ensaio de estilo inglês. Em 1904 terminou os estudos na África do Sul.
Regressou a Portugal em 1905 e fixou-se em Lisboa, onde se matriculou no Curso Superior de Letras (que abandonou em 1907). Foi a partir desta data que começou a sua intensa actividade literária, continuando a escrever poemas em inglês. Em 1910, escreveu poesia e prosa em português, inglês e francês. Em 1912, Pessoa estreou-se como crítico literário, provocando polémicas na intelectualidade portuguesa. Em 1913 escreveu "O Marinheiro". Em 1914, devido à sua capacidade de "outrar-se", criou mais heterónimos (Alberto Caeiro — criado em 1914 e "morto" em 1915), Álvaro de Campos, Ricardo Reis, Bernardo Soares, etc.), assinando as suas obras de acordo com a personalidade de cada heterónimo. Foi também neste ano que escreveu os poemas de "O Guardador de Rebanhos" e o "Livro do Desassossego".
Simpatizante da Renascença Portuguesa, no início, afastou-se depois, e em 1915 com Mário de Sá-Carneiro e Almada Negreiros entre outros, esforçou-se por renovar a literatura portuguesa através da criação da revista Orpheu (cujo primeiro número saiu em 1915), veículo de novas ideias e novas estéticas. Em 1916 suicidou-se o seu grande amigo Mário de Sá Carneiro. Em 1918, Pessoa publicou poemas em inglês, com destaque, no "Times". Em 1921 fundou a editora Olisipo, onde publicou poemas em inglês.
Em 1924 surgiu a revista "Atena", dirigida por Fernando Pessoa e Ruy Vaz. Em 1926, Fernando Pessoa requereu patente da invenção de um Anuário Indicador Sintético, por Nomes e Outras Classificações, Consultável em Qualquer Língua e dirigiu, com o seu cunhado, a Revista de Comércio e Contabilidade.
Em 1927 passou a colaborar com a Revista "Presença". Em 1934 publicou "Mensagem", que ganhou no mesmo ano o concurso literário promovido pelo Secretariado de Propaganda Nacional, categoria B.
Em 29 de Novembro de 1935, foi internado com o diagnóstico de cólica hepática. A sua última frase, escrita em inglês, dizia: "I know not what tomorrow will bring". Morreu no dia 30, com 47 anos, deixando grande parte da sua obra ainda inédita. Fernando Pessoa é considerado universalmente um dos maiores poetas de sempre.
Livros e colectâneas de poesia publicadas em vida:
"35 sonnets", 1918.
"Antinous", 1918.
"English Poems I II", 1921.
"English Poems III", 1921.
"Mensagem", 1934.

O espólio literário de Fernando Pessoa, (guardado na sua famosa arca onde guardava a sua obra para a posteridade) que se encontrava em casa de sua irmã, D. Henriqueta Madalena Nogueira Rosa Dias, e cuja inventariação, promovida pelo Ministério da Educação Nacional, terminou em Julho de 1972, compreendia, além de 29 cadernos de variado conteúdo, 25.426 originais (escritos pelo poeta) assim repartidos: manuscritos: 18.816; dactilografados: 3.948; mistos: 2.662.
Boa parte destes originais, em prosa e verso, eram fragmentos para o Livro do Desassossego de Bernardo Soares. Havia ainda textos sobre Política, Sociologia, História, poesia em inglês, textos de ficção, etc.

Santo António

Nasci exactamente no teu dia —
Treze de Junho, quente de alegria,
Citadino, bucólico e humano,
Onde até esses cravos de papel
Que têm uma bandeira em pé quebrado
Sabem rir...
Santo dia profano
Cuja luz sabe a mel
Sobre o chão de bom vinho derramado!

Santo António, és portanto
O meu santo,
Se bem que nunca me pegasses
Teu franciscano sentir,
Católico, apostólico e romano.

(Reflecti.
Os cravos de papel creio que são
Mais propriamente, aqui,
No dia de S. João...
Mas não vou escangalhar o que escrevi.
Que tem um poeta com a precisão?)

Adiante... Ia eu dizendo, Santo António,
Que tu és o meu santo sem o ser.
Por isso o és a valer,
Que é essa a santidade boa,
A que fugiu deveras ao demónio.
És o santo das raparigas,
És o santo de Lisboa,
És o santo do povo.
Tens uma auréola de cantigas,
E então
Quanto ao teu coração —
Está sempre aberto lá o vinho novo.

Dizem que foste um pregador insigne,
Um austero, mas de alma calma e ansiosa,
Et cetera...
Mas qual de nós vai tomar isso à letra?
Que de hoje em diante quem o diz se digne
Deixar de dizer isso ou qualquer outra cousa.

Qual santo! Olham a árvore a olho nu
E não a vêem, de olhar só os ramos.
Chama-se a isso ser doutor
Ou investigador.

Qual Santo António! Tu és tu.
Tu és tu como nós te figuramos.
Valem mais que os sermões que deveras pregaste
As bilhas que talvez não concertaste.
Mais que a tua longínqua santidade
Que até já o Diabo perdoou,
Mais que o que houvesse, se houve, de verdade
No que — aos peixes ou não — a tua voz pregou,
Vale este sol das gerações antigas
Que acorda em nós ainda as semelhanças
Com quando a vida era só vida e instinto,
As cantigas,
Os rapazes e as raparigas,
As danças
E o vinho tinto.

Nós somos todos quem nos faz a história.
Nós somos todos quem nos quer o povo.
O verdadeiro título de glória,
Que nada em nossa vida dá ou traz,
É haver sido tais quando aqui andámos,
Bons, justos, naturais em singeleza,
Que os descendentes dos que nós amámos
Nos promovem a outros, como faz
Com a imaginação que há na certeza
O amante a quem ama,
E o faz um velho amante sempre novo.
Assim o povo fez contigo
Nunca foi teu devoto; é teu amigo,
Ó eterno rapaz.

(Qual santo nem santeza!
Deita-te noutra cama!)
Santos, bem santos, nunca têm beleza.
Deus fez de ti um santo ou foi um Papa?...
Tira lá essa capa!
Deus fez-te santo? O Diabo, que é mais rico
Em fantasia, promoveu-te a manjerico.

És o que és para nós. O que tu foste
Em tua vida real, por mal ou bem,
Que coisas ou não-coisas se te devem
Com isso a estéril multidão arroste
Na nora de erros
Duns burros que puxam, quando escrevem,
Essa prolixa nulidade, a que se chama história.
Quem foste tu ou foi alguém,
Só Deus o sabe, e mais ninguém.

És pois quem nós queremos, és tal qual
O teu retrato, como está aqui,
Neste bilhete postal.
E parece-me até que já te vi.

És este, e este és tu, e o povo é teu —
O povo que não sabe onde é o céu,
E nesta hora em que vai alta a lua
Num plácido e legítimo recorte,
Atira risos naturais à morte,
E, cheio de um prazer que mal é seu,
Em canteiros que andam enche a rua.

Sê sempre assim, nosso pagão encanto,
Sê sempre assim!
Deixa lá Roma entregue à intriga e ao latim,
Esquece a doutrina e os sermões.
De mal, nem tu nem nós merecíamos tanto.
Foste Fernando de Bulhões,
Foste Frei António —
Isso sim.
Por que demónio
É que foram pregar contigo em santo?

Fernando Pessoa
9/6/1935

terça-feira, 12 de junho de 2007











Numa colaboração inédita entre as editoras portuguesas Assírio & Alvim, Cotovia e Relógio D’Água nasceu uma nova colecção de livros de bolso reunindo alguns dos principais autores clássicos e contemporâneos: a Biblioteca Independente.
Em 2007 serão publicados vinte e um títulos prosseguindo a colecção com três títulos mensais, repartidos pela ficção narrativa, poesia e ensaio.
Coloca-se assim ao alcance dos leitores portugueses obras a partir de 4 € e com a qualidade de tradução, o rigor na fixação do texto e o grafismo que têm caracterizado as editoras participantes no projecto.
Pretendem estas três editoras deste modo alargar o espaço da edição cultural, fornecendo uma alternativa à monótona avalanche de romances de enredo esotérico e aos ensaios que se dissolvem na espuma dos dias.
A distribuição será assegurada em conjunto pelas três editoras e vai ser referenciada através de expositores colocados nos principais postos de venda, com natural destaque para as melhores livrarias em cada localidade.
A Biblioteca Independente vai também integrar obras que não fazem parte do catálogo das três editoras fundadoras.

A próxima sessão de apresentação da Biblioteca Independente está marcada para 18 de Junho às 19 horas, na Sala de Leitura do Centro Cultural de Belém.
Nesta sessão será servido um Porto de Honra e os primeiros exemplares da colecção serão oferecidos aos jornalistas presentes.

domingo, 10 de junho de 2007

Na estante de culto






Antologia Poética
Nicolás Guillén

Selecção, tradução e notas de Albano Martins

A sua poesia, de cunho acentuadamente lírico, mas social e politicamente empenhada, é marcada por um forte sentido do ritmo, a que não é estranha, aqui e ali, a influência da música popular cubana, de raiz afro-espanhola.
A presente antologia segue o texto e a ordenação estabelecidos na 3.ª edição da "Obra Poética", em 2 tomos, publicada pela Editorial Letras Cubanas, Havana, 1995.
No final, introduzem-se algumas notas julgadas indispensáveis para o melhor entendimento dos respectivos poemas. (Albano Martins)

Edição Campo das Letras (Campo da Poesia)
Ano de Edição: 2002

Hoje nasceu...






10 de Junho de 1902

Nicolás Guillén

Poeta cubano








Artigos relacionados:
Biografia
Poemas: Pétala ; Palavras fundamentais ; Little Rock ; Relógio ; West Indies, Ltd. ; Bares

Nicolás Guillén

Nicolás Cristóbal Guillén Batista, nasceu em Camagüey (Cuba), no dia 10 de Junho de 1902, filho do jornalista Nicolás Guillén Urra e de Argelia Batista Arrieta.
Seu pai morreu às mãos de soldados que reprimiam uma revolta política em 1917, quando Nicolás Guillén tinha apenas 15 anos. Com a memória do pai sempre presente, Guillén o evocaria intensamente muitos anos depois, na década de 50, na sua "Elegía Camagüeyana".
Começou a publicar os seus versos em 1920 e a colaborar em revistas como "Camagüey Gráfico" e "Orto". Em 1922 terminou o volume de poesia "Cerebro y corazón" marcado pela estética modernista, que não publicou na altura, tendo só chegado ao público quando, meio século mais tarde, apareceram as suas "Obras Completas".
Estudou Direito na Universidade de Havana, tendo abandonado mais tarde as aulas desencantado com a situação deprimente da Universidade, impressão que deixou reflectida num dos seus poemas: "Al margen de mis libros de estudio" onde satirizava a mediocridade da vida naquela universidade e que atingiu notoriedade quando publicado no primeiro número da revista "Alma Mater", dirigida por Julio Antonio Mella.
Guillén exerceu várias profissões, entre elas, tipógrafo, revisor e jornalista. Dirigiu a revista "Lys" (que teve uma curta duração), foi revisor e mais tarde jornalista no jornal "El Camagüeyano". Trabalhou também no Ayuntamiento de Camagüey.
Quando regressou a Havana, em 1926, com o objectivo de mudar de vida, começou a trabalhar na Secretaría de Gobernación e decidiu instalar-se definitivamente na capital cubana. Ali se intensificaram os seus interesses intelectuais e literários, e conheceu Federico Garcia Lorca e o grande poeta negro norte americano Langston Hughes, cuja amizade e influência marcaria Guillén.
Em Abril de 1930 escreveu "Motivos de Son", que, ao ser publicado no "Diario de la Marina", lançou Guillén numa espécie de celebridade polémica, porém, com ampla ressonância popular, tendo este poema sido musicado por vários compositores como Alejandro García Caturla e os Grenet, o que aumentou ainda mais a sua popularidade. Por outro lado, a publicação deste poema também lhe ofereceu a amizade de outro poeta, também camagüeyano, Emilio Ballagas.
Guillén recebeu em 1932 uma carta de Unamuno em que este manifestava uma grande admiração pelo seu trabalho.
Depois do triunfo da Revolução Cubana, em 1959, participou activamente na vida pública de Cuba. Em 1961 foi eleito presidente da União dos Escritores e Artistas Cubanos, (cargo que exerceu até à sua morte) e em 1962, nomeado Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República de Cuba. Em 1975, a convite da Associação de Amizade Portugal Cuba, veio a Lisboa, tendo sido homenageado pela Associação Portuguesa de Escritores e pelo Movimento das Forças Armadas (MFA). Nessa estadia em Portugal, visitou também o Porto. Em 1983 foi galardoado com o Prémio Nacional de Literatura. A sua poesia, acentuadamente lírica, mas também social e de intervenção política, tem também o ritmo da música popular cubana, de raiz afro-espanhola. Nicolás Guillén faleceu em Havana, em 1989.
Obras:
"Motivos de son", 1930.
"Sóngoro cosongo; poemas mulatos", 1931.
"West Indies, Ltd", 1934.
"Claudio José Domingo "Brindis de Salas", el rey de las octavas", 1935.
"Cantos para soldados y sones para turistas", 1937.
"España. Poema en cuatro angustias y una esperanza", 1937.
"Sóngoro cosongo y otros poemas", (com uma carta de Miguel de Unamuno), 1942.
"Estampa de Lino D´ou", 1944.
"El son entero, suma poética (1929 1946)?, 1947.
"Elegía a Jacques Roumain en el cielo de Haití", 1948.
"Elegía a Jesús Menéndez", 1951.
"Elegía cubana", 1952.
"La paloma de vuelo popular" (elegias), 1958.
"Sus mejores poemas", 1959.
"Poesías", 1962.
"Prosa de prisa" (crónicas), 1962.
"Tengo", 1964.
"Poemas de amor", 1964.
"Antología mayor", 1964.
"El gran zoo", 1967.
"Antología mayor", (2ª edição aumentada), 1969.
"El diario que a diario", 1972.
"La rueda dentada", 1972.
"Obras completas", 1972 1973.
"Prosa de prisa", 1975.
"Páginas vueltas", 1982.
"Sol de domingo", 1982.
Póstumas:
"Las grandes elegías", 1992.
"New love poetry. Nueva poesía de amor", 1994.

Pétala

Braços que assentariam bem à Vénus de Milo;
olhos com resplendores de estrela ou de punhal…
Quem tivesse, senhora, a glória de oferecer-vos
o coração e um madrigal!

Nicolás Guillén
Tradução de Albano Martins

Palavras fundamentais

Faz com que a tua vida seja
sino que repique
ou sulco onde floresça e frutifique
a árvore luminosa da ideia.
Alça a tua voz sobre a voz sem nome
de todos os demais, e faz com que ao lado
do poeta se veja o homem.

Enche o teu espírito de lume;
procura as eminências do cume
e, se o esteio nodoso do teu báculo
encontrar algum obstáculo ao teu intento,
sacode a asa do atrevimento
perante o atrevimento do obstáculo.

Nicolás Guillén
Tradução de Albano Martins

Na voz de Luís Gaspar:

Little Rock

Um blues chora com lágrimas de música
na manhã fria.
O Sul branco agita
o seu chicote e fere. Entre espingardas
pedagógicas as crianças negras vão
à sua escola de medo.
Quando chegarem às aulas
Jim Crow será o professor,
filhos de Lynch serão os condiscípulos
e haverá em cada carteira
de cada criança negra
tinta de sangue, lápis de fogo.

Assim é o Sul. O seu chicote não pára.

Naquele mundo faubus,
sob aquele duro céu faubus de gangrena,
as crianças negras podem
não ir com as brancas à escola.
Ou ficar suavemente em casa.
Ou (nuca se sabe)
deixar-se ferir até à morte.
Ou não se aventurar pelas ruas.
Ou morrer entre balas e cuspo.
Ou não assobiar à passagem duma rapariga branca.
Ou, enfim, baixar os olhos yes,
dobrar o corpo yes,
ajoelhar-se yes,
naquele mundo livre yes
de que fala Foster tonto de aeroporto em aeroporto,
enquanto a bolinha branca,
uma graciosa bolinha branca,
presidencial, de golfe, como um planeta mínimo,
rola na relva pura, tersa, fina
verde, casta, terna, suave, yes.

E agora,
senhoras e senhores, meninas,
agora, meninos,
agora, velhos peludos e pelados,
agora, índios, mulatos, negros, zambos,
pensai agora o que seria
o mundo todo sul,
o mundo todo sangue e todo chicote,
o mundo todo escola de brancos para brancos,
o mundo todo Rock e todo Little,
o mundo todo ianque, todo faubus…
Pensai por um momento,
imaginai-o só por um instante.

Nicolás Guillén
Tradução de Albano Martins

Relógio

Gosto de certas horas, como as 3 menos um quarto,
porque o relógio parece que tem
uma atitude fraterna, acolhedora,
como se fosse dar-nos um abraço.

O tempo, assim, é um Cristo agonizante
que pela ferida das costas
vai perdendo sangue subtilmente
entre o Futuro e o Passado.

Nicolás Guillén
Tradução de Albano Martins

West Indies, Ltd.

1.
West Indies! Nozes de coco, tabaco e aguardente…
Este é um escuro povo sorridente,
conservador e liberal,
ganadeiro e açucareiro,
onde às vezes corre muito dinheiro,
mas onde se vive sempre muito mal.
O sol cresta aqui todas as coisas,
do cérebro às rosas.
Sob o relampagueante fato de cetim
trazemos ainda a tanga;
gente simples e terna, descendente de escravos
e daquela chusma incivil
de variadíssima espécie,
que em nome de Espanha
Colombo cedeu às Índias em atitude gentil.

Aqui há brancos e negros e chineses e mulatos.
Trata-se, sem dúvida, de cores baratas,
pois através de tratos e contratos
se confundiram os tons e não há uma cor estável.
(Se alguém pensa o contrário, que avance um passo e fale.)
Há aqui tudo isso, e há partidos políticos
e oradores que dizem: “Nestes momentos críticos…”
Há bancos e banqueiros,
legisladores e bolsistas,
advogados e jornalistas,
médicos e porteiros.
Que pode faltar-nos?
E mesmo que nos faltasse mandá-lo-íamos buscar.
West Indies! Nozes de coco, tabaco e aguardente.
Este é um escuro povo sorridente…

Ah, terra insular!
Ah, terra estreita!
Não é verdade que parece feita
só para plantar um palmar?
Terra na rota do “Orinoco”,
ou de outro barco excursionista,
repleto de gente sem um artista
e sem um louco;
portos onde o que regressa de Taiti,
do Afeganistão ou de Seul
vem a comer o céu azul,
regando o com Bacardi;
portos que falam em inglês
que começa em yes e acaba em yes.
(Inglês de cicerones a quatro pés.)
West Indies! Nozes de coco, tabaco e aguardente.
Este é um escuro povo sorridente.

Rio-me de ti, nobre das Antilhas,
macaco que andas saltando de mata em mata,
palhaço que suas para não meter a pata
e sempre a metes até aos joelhos.
Rio-me de ti, branco de verdes veias
— vêem se bem, embora procures ocultá-las! —
rio-me de ti porque falas de aristocracias puras,
de engenhos florescentes e arcas cheias.
Rio-me de ti, negro macaqueador,
que abres os olhos diante do automóvel dos ricos,
e tens vergonha de olhar a tua pele escura,
quando tens o punho tão duro!
Rio-me de todos: do polícia e do bêbedo,
do pai e do seu rapaz,
do presidente e do bombeiro.
Rio-me de todos; rio-me do mundo inteiro.
Do mundo inteiro, que se emociona diante de quatro peludos erguidos muito inchados atrás dos seus ruidosos escudos
como quatro selvagens ao pé dum coqueiro.

6.
West Indies! West Indies! West Indies!
Este é um povo hirsuto,
de cobre, multicéfalo, onde a vida rasteja
com a lama seca estampada na pele.
Este é o presídio
onde cada homem tem atados os pés.
Esta é a grotesca sede de companies e trusts.
Aqui estão o lago de asfalto, as minas de ferro,
as plantações de café,
os port docks, os ferry boats, os ten cents…
Esta é a terra do all right
onde tudo está muito mal;
esta é a terra do very well,
onde ninguém está bem.

Aqui estão os servidores de Mr. Babbit.
Os que educam os filhos em West Point.
Aqui estão os que guincham: hello baby
e fumam “Chesterfield” e “Lucky Strike”.
Aqui estão os dançarinos dos fox trots,
os boys do jazz band
e os veraneantes de Miami e Palm Beach.
Aqui estão os que pedem bread an butter
e coffe and milk.
Aqui estão os absurdos jovens sifilíticos,
fumadores de ópio e marijuana,
exibindo em vitrinas as suas espiroquetas
e vestindo um fato cada semana.
Aqui está o melhor de Port au Prince.
O mais puro de Kingston, a high life de Havana…
Mas aqui estão também os que remam em lágrimas,
galerianos dramáticos, galerianos dramáticos.

Aqui estão eles,
os que trabalham com um feixe de clarões
a pedra dura onde a pouco e pouco se crispa
o punho dum titã. Os que acendem a chispa
vermelha, sobre o campo seco.
Os que gritam: ?Já vamos!?, e responde lhes o eco
de outras vozes: “Já vamos!” Os que em fero tumulto
sentem latir o sangue com sílabas de insulto.
Que fazer com eles,
Se trabalham com um feixe de clarões?

Aqui estão os que cotovelo com cotovelo
tudo arriscam, tudo
dão com generosas mãos;
aqui estão os que se sentem irmãos
do negro, que dobrando sobre a vala escura
a fronte, se derrete em suor puro,
e do branco, que sabe que a carne é argila
má quando a fere o chicote, e pior se a humilha,
sob a bota, porque então levanta
a voz, que é como um trovão brutal na garganta.
Esses são os que sonham acordados,
os que no fundo da mina lutam,
e ali a voz escutam
com que gritam os vivos e os mortos.

Esses, os iluminados,
os párias desconhecidos,
os humilhados,
os preteridos,
os esquecidos,
os desalinhados,
os amarrados,
os inteiriçados,
os que diante da mauser exclamam. “Irmãos soldados!”
e rolam feridos
com um fio vermelho nos lábios roxos.
(Que o tumulto siga a sua marcha!
Que flutuem as bárbaras bandeiras
e que as bandeiras ardam
sobre o tumulto!)

Nicolás Guillén
Tradução de Albano Martins

Bares

Amo os bares e as tabernas
junto ao mar,
onde as pessoas conversam e bebem
apenas para beber e conversar.
Onde João Ninguém chega e pede
o seu trago elementar,
onde estão João Bronco e João Navalha
e João Narizes e até o João
sem mais, o apenas, o simplesmente
João.

Ali bate a onda branca
da amizade,
uma amizade de gente sem retórica,
uma onda de olá! e como estás?
Ali cheira a peixe,
a mangue, a rum, a sal
e a camisa suada a secar ao sol.

Procura-me, irmão, e achar-me-ás
(em Havana, no Porto
em Jacmel, em Xangai)
com a gente simples
que apenas para beber e conversar
enche os bares e as tabernas
junto ao mar.

Nicolás Guillén

Tradução de Albano Martins

Sugestão da Andante para esta semana

A ERVA DANINHA


Sou uma erva daninha.
Nem princesa, nem rainha.

Não tenho eira nem beira.
Nem ninguém que me queira.

Comigo ninguém se importa.
Todos me querem ver morta.

Sei que sou amaldiçoada.
porque não sirvo pra nada.

Mas a culpa não é minha,
de ser uma erva daninha.

Inventaram o herbicida,
pra me complicar a vida.

Mas isto não fica assim.
Vamos ver quem ri por fim.

Nem princesa nem rainha.
Sou uma erva daninha.


Jorge de Sousa Braga



Interpretado pela Andante:



Voz: Cristina Paiva; Música: Django Reinhart; Sonoplastia: Fernando Ladeira


A Andante, esta semana, vai estar nos seguintes locais:
14 Junho de 2007:
"Às avessas"
Biblioteca Municipal de Aljustrel, pelas 14.00H

16 Junho de 2007:
"À volta da língua"
Biblioteca Municipal de Leiria, pelas 17.00H

Ah! Só mais uma novidade: A Andante agora também tem um blogue, onde se pode ler, ouvir, comentar, partilhar...
Visitem-no!

sexta-feira, 8 de junho de 2007

Novo livro de Rui Diniz







Rui Diniz acaba de editar o seu segundo livro de poesia.
Depois de "Corte d'El-Rei" editado no ano passado juntamente com um CD de mp3 com declamações do locutor Luis Gaspar, eis "Bandeiras & Fogo" que reúne 43 poemas escritos pelo poeta no último ano.

Neste volume, Luis Gaspar escreve:
"O Rui é um poeta. Diferente. Usando a linguagem da matemática, o Rui é um poeta ao quadrado. Como todos os poetas, escreve. Como poucos poetas, depois de escrever, lê. E o poema escrito, depois de dito, é outro poema. Nunca uma cópia, outro poema. Sendo a minha forma de estar na vida ler o que os poetas escrevem, esta duplicidade do trabalho do Rui encanta-me. O Rui é, por outro lado, o típico poeta dos Novos Tempos, os tempos da Internet. Nela nasceu, nela escreve, nela lê, nela será famoso. Rapidamente, porque na Internet tudo acontece, já. Que tal rapidez não apague o que de bom por lá anda. Que o Rui não seja meteorito que se perde no Universo mas aquele que cai nos braços da Terra e permanece para nos recordar os que voam alto porque são poetas."

Que voe muito alto este novo trabalho do Rui Diniz, é também o que desejo!

"Bandeiras & Fogo" está disponível no blogue do autor, aqui.

quinta-feira, 7 de junho de 2007

"Saloon" de A. Pedro Ribeiro













"Saloon", o novo livro de poesia de A. Pedro Ribeiro, publicado pelas Edições Mortas vai ser apresentado no Diana Bar, na Póvoa de Varzim, na próxima sexta, dia 8 de Junho, pelas 21,30 horas.
"Saloon" sucede a "Declaração de Amor ao Primeiro-Ministro. Manifestos do Partido Surrealista Situacionista Libertário" (Objecto Cardíaco, 2006), a "Sexo, Noitadas e Rock n' Roll" (Edição Pirata, 2004) , a "Á Mesa do Homem Só. Estórias" (Silêncio da Gaveta, 2001) e a “Gritos.Murmúrios” (Braga, Grémio Lusíada, 1988).
A apresentação da obra vai estar a cargo de António Oliveira (Edições Mortas), do poeta e diseur Rui Lage , do autor e do “diseur” Bruno Neiva.


RUA

A rua é sempre a mesma
Acima abaixo
Abaixo acima
Entras nas casas nos bares
Nas camas
Falas
Calas
Encontras este e aquela
Entras neste e naquela
Fornicas a solidão
Facas guerras guitarras
Ilhas descobertas
A coisa arde queima
Cais
Levantas-te
E depois sais
Como se fosse nada

É sempre a mesma rua
O mesmo copo
A mesma canção
E tu gostas.

A. Pedro Ribeiro

Homenagem a Al Berto (1948-1997)












Dez anos depois da sua morte

(em colaboração com o Centro Cultural Emmerico Nunes, Sines)
Mostra bibliográfica para ver na Casa Fernando Pessoa, entre os dias 12 e 19 de Junho.
Entrada livre.

Hoje nasceu...






7 de Junho de 1910

Firmino Rocha

Poeta brasileiro





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Poemas: Deram um fuzil ao menino

Firmino Rocha

Firmino Rocha nasceu em Itabuna (Brasil), no dia 7 de Junho de 1910. Foi um artista que exerceu grande influência em muitos poetas brasileiros de gerações posteriores à sua. Lírico, místico e com um estilo repleto de simplicidade e musicalidade, a sua obra não reflecte nenhuma complexidade académica. Os seus versos, próximos da prosa, têm uma linguagem acessível, rimas simples, trazidas de um universo emotivo que se manifesta com espontaneidade e expressivo lirismo. Em vida, escreveu "O Canto do Dia Novo" e "Momentos". Também publicou poemas, com frequência regular, na imprensa local.
O seu poema mais conhecido, "Deram um Fuzil ao Menino", é um terno apelo contra a violência da guerra (refere-se à II Guerra Mundial) e, encontra-se hoje gravado em placa de bronze, na sede da ONU (Organização das Nações Unidas).
Firmino Rocha, era boémio e sonhador. Fazia da sua poesia de versos simples a expressão terna e telúrica da sua gente e da sua terra natal. Faleceu em Ilhéus em Julho de 1971.

Deram um fuzil ao menino

Adeus luares de Maio.
Adeus tranças de Maria.
Nunca mais a inocência,
nunca mais a alegria,
nunca mais a grande música
no coração do menino.
Agora é o tambor da morte
rufando nos campos negros.
Agora são os pés violentos
ferindo a terra bendita.
A cantiga, onde ficou a cantiga?
No caderno de números,
o verso ficou sozinho.
Adeus ribeirinhos dourados.
Adeus estrelas tangíveis.
Adeus tudo que é de Deus.
DERAM UM FUZIL AO MENINO.

Firmino Rocha

(Este poema encontra-se gravado numa placa de bronze na sede da ONU (Organização das Nações Unidas) e foi publicado numa colectânea sobre a Paz editada pela ONU e distribuída em todo mundo.)

Na voz de Luís Gaspar:

quarta-feira, 6 de junho de 2007

Dick Hard









Luís Graça editou recentemente (juntamente com outros dois livros de contos) o livro de poesia satírico-erótica "De Boas Erecções está o Inferno Cheio - King Kong Size". Esta é uma edição de autor (que aqui assina com o pseudónimo Dick Hard), que vem no seguimento de uma edição anterior da Polvo de 2004.
Esta edição recente, bastante aumentada, tem quase toda a poesia erótica e satírica de Luís Graça escrita entre 1989 e 2007, e, também, uma secção de poesia lírica com 72 poemas.


MEU FALO, MEU TOURO

Meu falo, touro
em ponta, desembolado
alfange, mouro, em ronda
sempre excitado

Eu calo, rouco
e tu zonza, nua num estrado
que range, pouco
numa onda, sodomizado

Meu halo, louco
é santo divinizado
abrange in loco e conta
que é castrado

Empalo, touro
meu falo, desembolado
alfange, mouro, em ronda
foi sepultado



A ÚLTIMA CEIA

Felizes os que morrem a sonhar
infelizes os convidados
para uma ceia de horror

Este é o bode de Satã
que inventou o pecado
no Mundo

Violou o espírito
dos fracos, oprimidos
órfãos e viúvas

Arrotou a vida
com odor a morte
bisturizou cortes
nas essências

Este é o seu corpo
tomai e ardei
este é o seu sangue
pronto a sorver

Néctar fálico
de falsos amores
jorro em lava fumegante
de prazeres vomitados

Sugai o sexo a Lúcifer
porque Satanás se esvai
todos os dias
em Maldade

Comei agora cérebros ferventes
que polvilham de malícia
o coração de jovens
que nunca foram puros

Dai autógrafos nas hóstias
e disparai lasers com o olhar
na hora de subir
o cálice aos céus

Pois a premência
é a descida aos Infernos
e os altares querem-se
de negro pintados

Este é o bode de Deus
que põe o pecado no Mundo
o sátiro dos bosques
com cheiro putrefacto

Este é o riso atroz
dos dentes podres
na ira galáctica
das estrelas

Desflorai o corpo jovem
de seios tenros
olhos azuis
e cabelos de oiro

Corrompei-o com urgência
fazei rápido
porque esta é
a Última Ceia


Rui Unas dedicou ontem, 5 de Junho o seu "Show do Unas" totalmente a este livro de Luís Graça. Para quem não viu, será possível assistir à repetição do programa na próxima terça-feira 12 de Junho (SIC RADICAL, Canal 9, 22h45m).

O livro pode ser adquirido nos blogues do Luís Graça:
www.gandaordinarice.blogspot.com
www.oprazerdamesa.blogspot.com
www.sexonanoite.blogspot.com
www.15desatinonimos.blogspot.com

Ainda na Feira do Livro do Porto

Dia 9 de Junho na Feira do Livro do Porto, vão estar também os dois poetas:




EDUARDO PITTA. Poeta, ficcionista, ensaísta, crítico literário do Jornal Público e autor do blogue Da Literatura.
18:30H: Quidnovi (QN II) - Pavilhão Nº I-9



JOSÉ RUI TEIXEIRA. Poeta, professor no colégio Luso-Francês e teólogo do Centro Catecumenal da Igreja do Porto. Está representado em diversas antologias, manuais escolares e revistas literárias, e é autor do blogue ISTMO.
21:00H: Quasi Edições - Pavilhão Nº C-11

segunda-feira, 4 de junho de 2007

Homenagem a Luís de Camões





Dia 10 de Junho, das 15h00 às 17h00.
À semelhança do que vem acontecendo desde Junho de 2002, a Associação Portuguesa de Poetas vai homenagear Luís Vaz de Camões, no Mosteiro dos Jerónimos.
O programa será o seguinte:
1. Deposição de uma coroa de flores junto do túmulo de Camões.
2. Breve palestra pela Presidente da Direcção da APP sobre Luís de Camões.
3. Recital pelo Coral Eclipse, dirigido pela maestrina Helena Marques, associada da APP.
4. Os Poetas da APP dirão poemas de Camões.

Poesia nas Feiras do Livro

Feira do Livro de Lisboa:

Dia 4 de Junho
18:30-19:30
Auditório
Ciclo Poetas de Macau (3ª sessão), com a presença do escritor e poeta José Jorge Letria.

Dia 5 de Junho
19:00-20:00
Auditório
Oficina do Livro: lançamento do livro Os Melhores Poemas para Crescer da actriz Rosa Lobato de Faria.

Dia 7 de Junho
17:00
Auditório
Fernando Tordo / Apresentação do seu livro de poesia: Quando não souberes copia.
Apresentação por Maria Lúcia Lepecki.

Dia 9 de Junho
18:00 - 19h00
Sala Pequena
Assírio & Alvim: Sessão sobre Walter Benjamin, moderada por João Barrento.


Feira do Livro do Porto:

Dia 9 de Junho
18:00
Homenagem a Vasco Graça Moura
A obra de Vasco da Graça Moura e as suas raízes na Cidade do Porto será apresentada por Gil Moreira dos Santos, José Manuel Mendes e Luís Miguel Queirós.
Alberto Serra lerá textos de Vasco da Graça Moura, escolhidos pelo autor.

Dia 9 de Junho
21:30
Biblioteca Almeida Garrett
Fernando Tordo / Apresentação do seu livro de poesia: Quando não souberes copia.
Apresentação por José Manuel Mendes.

Sugestão da Andante para esta semana

Outro Testamento

Quando eu morrer deitem-me nu à cova
Como uma libra ou uma raiz,
Dêem a minha roupa a uma mulher nova
Para o amante que a não quis.

Façam coisas bonitas por minha alma:
Espalhem moedas, rosas, figos.
Dando-me terra dura e calma,
Cortem as unhas aos meus amigos.

Quando eu morrer mandem embora os lírios:
Vou nu, não quero que me vejam
Assim puro e conciso entre círios vergados.
As rosas sim; estão acostumadas
A bem cair no que desejam:
Sejam as rosas toleradas.
Mas não me levem os cravos ásperos e quentes
Que minha Mulher me trouxe:
Ficam para o seu cabelo de viúva,
Ali, em vez da minha mão;
Ali, naquela cara doce...
Ficam para irritar a turba
E eu existir, para analfabetos, nessa correcta irritação.

Quando eu morrer e for chegando ao cemitério,
Acima da rampa,
Mandem um coveiro sério
Verificar, campa por campa
(Mas é batendo devagarinho
Só três pancadas em cada tampa,
E um só coveiro seguro chega),
Se os mortos têm licor de ausência
(Como nas pipas de uma adega
Se bate o tampo, a ver o vinho):
Se os mortos têm licor de ausência
Para bebermos de cova a cova,
Naturalmente, como quem prova
Da lavra da própria paciência.

Quando eu morrer. . .
Eu morro lá!
Faço-me morto aqui, nu nas minhas palavras,
Pois quando me comovo até o osso é sonoro.

Minha casa de sons com o morador na lua,
Esqueleto que deixo em linhas trabalhado:
Minha morte civil será uma cena de rua;
Palavras, terras onde moro,
Nunca vos deixarei.

Mas quando eu morrer, só por geometria,
Largando a vertical, ferida do ar,
Façam, à portuguesa, uma alegria para todos;
Distraiam as mulheres, que poderiam chorar;
Dêem vinho, beijos, flores, figos a rodos,
E levem-me - só horizonte - para o mar.


Vitorino Nemésio

Interpretado pela Andante:

Voz: Cristina Paiva; Música: Dirty Three; Sonoplastia: Fernando Ladeira

sábado, 2 de junho de 2007

Novidades do Brasil





Marina Andrade, cantora e compositora de Brasília (Brasil), musicou poemas de Cecília Meireles, Manuel Bandeira, Fernando Pessoa, Carlos Drummond de Andrade e Augusto dos Anjos.
Em Abril deste ano, a convite da Fundação Cultural de João Pessoa, participou nos eventos de homenagem aos 123 anos do nascimento de Augusto dos Anjos, onde cantou os poemas deste poeta.
Nas suas cantorias pelos bares, Marina Andrade mesclava estes poemas musicados com clássicos da MPB, como Noel Rosa, e outros compositores.
O CD “Versos Íntimos”, é o fruto do seu encontro musical e poético com Augusto dos Anjos.
Um outro trabalho de Marina Andrade, com poemas de Cecília Meireles, Manuel Bandeira, Fernando Pessoa e Drummond, está já em fase final de produção. Em breve o divulgarei também neste blogue.
Mais informações sobre esta cantora e compositora brasileira, estarão brevemente disponíveis no site http://www.marinandrade.com.br
Para já, a Marina Andrade poderá ser contactada pelo e-mail: marinapandrade@uol.com.br
Os meus agradecimentos a Marina Andrade pela partilha e os meus votos de sucesso para os seus trabalhos.













Eterna mágoa

O homem por sobre quem caiu a praga
Da tristeza do Mundo, o homem que é triste
Para todos os séculos existe
E nunca mais o seu pesar se apaga!

Não crê em nada, pois, nada há que traga
Consolo à Mágoa, a que só ele assiste.
Quer resistir, e quanto mais resiste
Mais se lhe aumenta e se lhe afunda a chaga.

Sabe que sofre, mas o que não sabe
E que essa mágoa infinda assim não cabe
Na sua vida, é que essa mágoa infinda

Transpõe a vida do seu corpo inerme;
E quando esse homem se transforma em verme
É essa mágoa que o acompanha ainda!






Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos nasceu em Paraíba do Norte, em Abril de 1884 e morreu em Minas Gerais em de Novembro de 1914. Recebeu em casa a primeira instrução. Bacharelou-se em Letras, na Faculdade do Recife, no ano de 1907, e, três anos depois, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde exerceu durante algum tempo o magistério.
Do Rio, transferiu-se para Leopoldina, por ter sido nomeado para o cargo de director de um grupo escolar.
Morreu nessa cidade, com pouco mais de trinta anos.
Augusto dos Anjos publicou quase toda a sua obra poética no livro "Eu", editado em 1912. O livro foi depois enriquecido com outras poesias esparsas do autor e tem sido publicado em diversas edições, com o título "Eu e Outros Poemas". Apesar de nos ter deixado apenas este trabalho, o poeta merece um lugar na tribuna de honra da poesia brasileira, não só pela profundidade filosófica que transpira dos seus pensamentos, como pela fantasia das suas divagações pelo mundo científico. São versos que transportam a dor humana ao reino dos fenómenos sobrenaturais. É conhecido como um dos poetas mais estranhos do seu tempo, e até hoje a sua obra causa impacto, tanto em leigos quanto em críticos literários.