segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Do Verbo e da Luz

"Do Verbo e da Luz", livro com fotografias de Guilherme Duarte e poemas de Luís Graça e Jerónimo Nogueira, vai ser apresentado no próximo dia 30 de Novembro, pelas 19H00, no Museu da Água (Mãe d'Água), ao Jardim das Amoreiras, em Lisboa.
Haverá leitura de poemas e uma pequena sessão musical.


Novo livro de Tiago Moita


Vai ter lugar, na Biblioteca Pública Municipal do Porto, no dia 30 de Novembro, às 21H30, a apresentação do livro "Post Mortem e Outros Uivos" de Tiago Moita, editado pela WorldArtfriends/Corpos Editora.
A apresentação será feita pelo poeta Aurelino Costa.



O SILÊNCIO SAIU À RUA

O silêncio saiu à rua sem aviso prévio
num sarcasmo saído de uma sede invisível
de rosto descalço e peito fustigado
pela febre azul do desassossego

vestia pele de cobra
com tatuagens de sombras
rosas sangue nos olhos
e um fogo índigo na alma
lavrando a palavra e o corpo

alastrava cego e surdo
como um incêndio
por entre ruas e avenidas
despia máscaras com um grito
e o poder com a presença

por onde passava
multiplicava desejos e sonhos
multiplicava-se
diluindo o medo
no lume brando da vida

não trazia relógio nem calendário
nem bilhete de identidade ou passaporte
apenas o eco exangue do estômago
ignorado pela metafísica das sondagens

talvez precisasse de dicionários
para cada legenda dos seus uivos
talvez precisasse de agendas
para cada intervalo de fúria

poderia ser qualquer coisa...
fulgor de chama sem sangue
pseudónimo almiscarado de uma bandeira nua
ruído de fundo de um buraco negro
poderia ser tudo...

menos silêncio...

domingo, 25 de novembro de 2012

"Pela Leonor Verdura" pelo grupo Mandrágora

Ao completar 33 anos de vida associativa, o grupo Mandrágora - Centro de Cultura e Pesquisa de Arte, apresenta "Pela Leonor Verdura" - um novo projecto marcado por uma linguagem teatral/performativa e com base na poesia experimental/concreta portuguesa.

Dias: 29 e 30 de Novembro
1, 7 e 8 de Dezembro
31 de Janeiro
1 e 2 de Fevereiro
Horário: 21h30

Encenação: M. Almeida e Sousa
com: Bruno Vilão e Íris Santos
Som: Ricardo Mestre
Vídeo: Bruno Corte-Real

Na Sociedade de Instrução Guilherme Cossoul (Santos - Lisboa)

A acção percorrerá a poesia experimental dos poetas: - EMERENCIANO - ANA HATHERLY - MÁRIO CESARINY DE VASCONCELOS - LIBERTO CRUZ - JAIME SALAZAR SAMPAIO - ALBERTO PIMENTA - E. MELO E CASTRO - ANTÓNIO ARAGÃO - ABÍLIO JOSÉ SANTOS - SALETTE TAVARES - JOSÉ OLIVEIRA - ALEXANDRE O'NEIL - FERNANDO AGUIAR - CESAR FIGUEIREDO - M. ALMEIDA E SOUSA - ANTÓNIO DANTAS - ARMANDO MACATRÃO - JOSÉ ALBERTO MARQUES - SILVESTRE PESTANA

No primeiro dia (estreia), após a representação haverá um debate informal com alguns dos poetas representados (no bar da Sociedade Guilherme Cossoul) sobre a poesia experimental portuguesa - "movimento" que marcou uma geração de poetas lusos nos anos 60 e aos quais prestamos a nossa homenagem com este "Pela Leonor Verdura".

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Poesia reunida de Carlos Poças Falcão

Lançamentos do livro "Arte Nenhuma", poesia reunida de Carlos Poças Falcão, editada pela Opera Omnia:

Dia 24 de Novembro, pelas 21H30, na Convívio Associação Cultural (Largo da Misericórdia, 7 e 8), em Guimarães.

Dia 29 de Novembro, pelas 22H00, na Livraria Paralelo W (Rua dos Correeiros, 60-1º Esq.) em Lisboa.

Tertúlia na Biblioteca Anexa Municipal de Souselas


quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Hoje há Poesia na Barraca!

E é o aniversário do Miguel Martins!

Poesia às Quintas – com Miguel Martins – 6ª sessão – Bar a Barraca – 22 de Novembro – 22.30h – entrada livre  

22 de Novembro, dia de Santa Cecília, padroeira da música. O ano é 1969. Um menino nasce. Seu nome? Miguel Martins. Por muitos (ou, pelo menos, por si próprio) considerado o novo Cristo, o profeta, o guru, o basbaque, o banana, enfim. 
No dia em que se cumprem as suas 43 primaveras (e 29 anos desde que perdeu a virgindade, às mãos de um bombeiro do Sarzedelo), Miguel, entre outros poemas, partilhará connosco o seu primeiro livro, “Seis poemas para uma morte”, o qual, ainda hoje, 17 anos volvidos sobre a sua publicação, e para vergonha da cooperação cultural luso-brasileira, continua à espera de ser vertido para o formato samba-enredo, não obstante o suposto interesse de nomes que vão de Villa-Lobos a Nelson Ned. 
Miguel, que se acompanhará à melódica, terá a seu lado, desenhando, com o furor tão característico dos artistas plásticos Jeovás, a brilhante e escultural Ana Tecedeiro, acerca de quem a revista norte-americana “Watercolour” afirmou: “C’um caneco!”. 
No final, a obra produzida será leiloada, com uma base de licitação do tempo da outra senhora. Quem não aparecer passará o Natal a comer filhós com o Isaltino.  
Miguel Martins

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Poesia no Bar A Barraca

Poesia às Quintas – com Miguel Martins – 5ª sessão – Bar a Barraca – 15/11 - 22.30h – entrada livre    

Emanuel Félix foi um dos mais notáveis e originais poetas do século XX português, infelizmente desconhecido por muitos, até dos poucos que (por cá e no mundo) lêem poesia. Na próxima Quinta, Miguel Martins e Rui Miguel Ribeiro darão voz a alguns dos seus poemas, prometendo fazer o melhor que possam e saibam. 
Posto este intróito, escrito com o comedimento que a veneração impõe, passemos à palhaçada: Mas que Rui Miguel Ribeiro é este? O poeta dos imortais versos de “XX Dias”? O intrépido globetrotter de quem se afirma ser o último homem vivo a ter palmilhado o istmo sicilo-tunisino com alpercatas? O devasso e decadente boémio conhecido por “trombeiro da Areosa”, que, ao que consta, é detentor de 5% de uma casa de meninas em Baleizão? Sim!, ele é estes três e muitos mais! E a sua voz de sopranino abaritonado promete despertar sensações há muito esquecidas em todas as octogenárias que decidam assistir à leitura. Quem não aparecer é porque acha que literatura é as patacoadas do Chiquinho Viegas. Até Quinta!  

Miguel Martins

Leituras encenadas no Clube Estefânea

No Clube Estefânia, em Lisboa, no próximo dia 17 de Novembro, às 21H30, haverá leituras encenadas de poemas de Rui Almeida (com a presença do autor).


Novo livro de poesia de Paula Raposo

Lançamento no Porto...

E em Coimbra...

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

44 imagens de Mia Couto


 Poemas inéditos de Manuel Neto dos Santos, inspirados em textos de Mia Couto.


1
A melhor maneira de fugir é ficar parado
há um voo acorrentado às penas
um mergulho respirado pelas guelras
um deslizar brilhante à flor da pele
ir
é chegar antes
de
partir

2
A melhor maneira de mentir é ficar calado
Havia um silêncio gritado pelos olhos
Um segredo açoitado no (pé)lourinho
Da moral
E tudo foi dito no desmuronar da cal calúnia
A verdade é a fronteira
Entre
O mal-e-o-mal

3
O silêncio não é ausência da fala é dizer-se tudo sem nenhuma palavra
O ruído maior é a vertical idade rastejante do poema
Ex-crito
O cheiro da tinta
O lancinante grito

4
Quem come pouco fala pouco
Lambuzio- me de palavras na comezaina dos outros
Peito co- lado às costas no arquejar galgo e redondo de um céu
Todo ele arrotando azul
De todos os pontos cordiais
Só leste o sul; o mar que ainda ressoa,
Sou eu… pelos areais.

5
Nascemos para ser escolhidos, vivemos para escolher
Os dados
Comprados
Estão lançados
Pintas as pintas depois de escolheres as faces
Criando teu próprio rosto
A gosto
Em Agosto

6
Quem chora dormindo pode também rezar sem despertar
Regresso ao rio da memória
À (in)segura timidez da nascente
Discreto gotajar por entre duas rochas justas
Postas
Ora
São os reflexos da água que abalam e embalam
O sono das encostas

7
Dá azar um homem deixar de ver a sua própria sombra
Penduro
Num cabide
Um metro e cinquenta e um de sombra
Sepultura rasgada no asfalto
Para enterrar a lua

8
Um sonho só pode ser contado num outro sonho
Viro as pálpebras do avesso
Atrás do horizonte linear
Há uma linha sinuosa
Para a recriação do lugar

9
Quem não vê os seus sonhos é porque está sonhando aquilo que está vendo
Nada vendo
Vendo o contorcionismo dos instantes
Sonhar é a visão do H perdido
Pela vida
Nos mares ainda sem fundo
SONAR
A que falta o eco imundo

10
Toda a morte tem o seu quê de suicídio
Uma força
Uma forca
A cicuta
A lanceta
Uma seta
O sol suicida-se por acaso no ocaso
No caso vagido inicial
De quem já é poeta

11
Todos rezam para pedir ela rezaria para dar

David
Dá vida
A hora são as molas que esmolas
Por aqui
Sal
Ti
Tão

12
Se é para voltar volta antes de partir
Não vás, não és Luiz
Que o som do primeiro passo
É quase um truz
Por um triz

13
A viagem não começa quando se percorrem distâncias mas quando se atravessam as nossas próprias fronteiras
Há uma sensual idade das pupilas acariciando o corpo dos campos
Em restolho
O universo é tudo
O resto
O olho

14
O que faz uma igreja( ) é o silêncio que mora lá dentro
O tecto arredondado de abóbada como abóbora
Do orgasmo
É a cúpula da cópula do silêncio
Que não cega mas é seguinte

15
Quem se lembra tanto de tudo é porque não espera mais nada da vida
Ver sem pensar no que vejo
Tudo é real em si
E em mim
O resto?
O que me falta de sobejo

16
A saudade é um morcego cego que falhou o fruto e mordeu a noite
Passo a passo
Passo a ferro as pregas da memória
O que não me liga os dedos
É que é a estória

17
A casa da infância é como o rosto da mãe
Dá-me o colo do teu riso
Como a albi planura da açoteia
A casa o teu olhar
O luar esta saudade
Amei-a

18
As pessoas é que abrigam a casa a ternura
é que sustenta o tecto
Roubo
À penedia o dia
Dois lanços de lanças de granito
Sustento de um telhado ainda não
A casa sou eu mesmo
Redopiando
Quase rente ao chão

19
Ter só um nome é isso que apressa a morte
Tenho em mim todas as coisas que vivi
A eterna idade
Não morro nem morro
Só que não estou aqui

20
O pranto convoca os espíritos da desgraça
O choro é a alegria maior mas ao contrário
Tudo vai para onde já muito há
Cada lágrima tem um brilho de gargalhada
Extra ordinário

21
No grávido círculo da felicidade
A obesa gravidade da alegria
O Sancho tem a pança da vela do moinho
E a moinha é a dor como um mosquito
Junto ao ouvido
Parto pelo parto em ângulo recto
Qu(e)ixoso
Ferido

22
A saudade é a dor que nos faz esquecer as outras dores
Vergasto o ver
Gasto de não olhar
Domo a dor maior no circo
Que me cerca entre a saudade
Que sai algures
E fica no verbo
Seristar

23
A velhice é uma gordura na alma
Mandei a alma a banhos
Não foi
Por não encontrar facto que servisse
É imoral a nudez perante o infante mar
A descomunal
E intemporal
Velhice

24
A tristeza é uma doença a alegria é um veneno
Não ando em mim
Ando do outro lado da saúde
Com pã ninhos
Não se cura
Senhor cura
A hesitação entre o choro e o riso
Com que a vida se ilude

25
Grandes palavras escondem grandes enganos
Granulo o grânulo
Em vogais e consoantes
Consoante o que me der na telha
Ou no telhado
Resta a poeira do pó
Na eira que resta do resto
No almofariz do que passando
É passado

26
A igreja é onde guardamos um silêncio
Sou cego porque sossego o sossego
Da lonjura
Que longe
Jura a pernas arqueadas
O silêncio
Só erguendo
Na paisagem o pó dos remoinhos
Pelas estradas

27
As pálpebras são o pano do esquecimento
Aferrolho o olhar ao cair do pano
À boca de cena estreita
Estreito nos braços
A persona de Nemésia
É o abismo que justifica a falésia

28
A sua sombra já andava pelo chão a farejar caminhos para ser terra
Declaro que se em terra a noite
É mais anoitecida
A sombra assombra apenas as penas
Do que sendo
Não fomos pela vida

29
Estou para aqui todo crepusculado
Aguado
Como uma aguarela
Aguardo e guardo o estertor da tarde
O vagido da noite
Só que não sei se é ela
Ou
Ela

30
Uma casa morre se não é habitada por amor.
Com templo, em todas as coisas se resume o óbito do hábito.
É na surpresa que a presa se resume à ideia da casa
Onde habito; entre as cinzas e o lume.

31
É assim que estamos na vida, como se ela fosse um território arrendado
Arrotando a arroteia de passar por aqui, a teia feudal do suserano é o sussurro do que pensamos ser a vida e… é engano

32
A gente nunca sabe quando está morta
Morre-se e pronto.
Ponto por ponto a ponte entre o longe e o horizonte
Da carne que arrefece… e fica morta.
Nada se a travessa não nos diz corre, não nos importa; nem janela.
A morte, só por si, é toda ela.

33
A prisão é um lugar onde se dorme muito
E o sonho substitui o viver.
Vejo, pelas grades da insónia, os salpicos da realidade.
As grilhetas sou eu mesmo, num sonho que se esvai,
Quando me invade.

34
O choro é o nosso primeiro idioma.
Bé à cá

Pá,

Má… sorte
O riso, que preciso?
A morte!

35
Pela dança, voltamos ao ventre materno.
A vaga mais concreta arredonda-se
E de onde ser ergue há um todo uterino que se arqueja;
A dança é o que não fica; por muito que se desenhe, ou que se veja.

36
Há lições que começam antes de nascer.
Na ardósia mais celeste escrevi, pelos olhos dos meus pais,
O verso antes da face ou da fronte, defronte do mar para domar, rasurando a espuma, nas raízes de amendoais.

37
Os lugares morrem como os frutos; quando já não dão semente.
Por terra este lugar de antanho, onde vivi;
Lembranças são abelhas, reavendo a seiva e o suco;
A al-gravidez maior
É o não caber-se em si, no Agosto da cigarra
No Maio do mês do cuco.
Assim, eternamente
O berço onde nasci.

38
As mãos nada são sem o coração.
As mãos, em concha, recortam-me a forma de um coração;
Fruto maduro na horta do poeta;
Ventríloquo da alma na veia cava que não cava mas monda
Pelo superior destino; diástole e sístole; fluxo e refluxo do espanto da palavra, e da surpresa
De mãos abertas à incerteza… numa cadência de onda.
Pois então.

39
O encantamento é uma casa que tem o silêncio por tecto.
O meu silêncio é plano e recto como uma açoteia;
A casa é a Língua que me não serviu e…
Açoitei-a.

40
Só cuidas das partes escondidas quem as vai mostrar a alguém.
Há fímbrias e debruns,
Pregas e recessos, vincos, dobras…
Em tudo quanto escrevo;
Tudo limpo e engomado
No poema escrito…
O que ainda não disse… são as sobras.

41
Não há conhecer sem lembrar e o lembrar é uma mentira
Recordo;
Dar é recor dar a verdade de que a mentira é a verdade mais perfeita;
Incógnito é o halo do pôr-do-sol…
Que a colina enfeita.

42
O problema da solidão, é que não temos ninguém a quem mentir
Presto juramento ao silêncio;
Que nada mais exista no espaço indivisível entre nós dois.
Nem eu nem tu mas antes o que é depois.

43
Como a ave escura no meio da noite.
Nada distingo nem discirno atravês do xaile do breu.
Digo que era, fui, sou, estou a ser ou hei-de vir a ser…
E, em nada disso existo eu.

44
Eu tenho pouco corpo, nem me cabem doenças.
Hipocondríaco dos sons, o antídoto para a alma, macilenta,
É a receita prescrita e carimbada;
Versos anémicos na brancura duma sebenta
E a compulsão da escrita;
De todos desenganada.