segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Concerto para Poemas no CCB

Dirigida pela sua maestrina titular Julia Jones, a Orquestra Sinfónica Portuguesa apresenta um concerto intimista, em que a música surge, de forma surpreendente, aliada à poesia portuguesa.
Hoje, 30 de Novembro, pelas 21H00, no Grande Auditório do Centro Cultural de Belém.

Para este concerto pleno de poesia, a Orquestra Sinfónica Portuguesa convidou Natália Luiza para interpretar uma selecção de poemas portugueses, intercalando-os com a obra Seis peças para Grande Orquestra op. 6, de Anton Webern. Serão ainda interpretados três andamentos de Lulu Suite do compositor austríaco Alban Berg, assim como a Sinfonia n.º 6 de Anton Bruckner, obra formalmente complexa e extensa que vive de uma imponência e grandiosidade que só tem paralelo nas óperas de Wagner e posteriormente nas sinfonias de Mahler.

O "Concerto para Poemas" é o terceiro de um total de sete a realizar no CCB no âmbito da temporada sinfónica 2009/2010 do Teatro Nacional de São Carlos.

Sugestão da Andante para esta semana


Tardes Estivais

Tardes estivais. Sol nas funduras.
Os povoados como faróis de neve sobre um mar.
Nuvens de cinzento e vermelho como peitos de aves.
Vibrações ardentes sobre céus suaves.
Águas paradas... Imenso dormitar...

Tardes estivais. Solidão dourada.
Caminhos silenciosos, cintas de claridade.
Alamedas verdes em fundos passionais.
Acordes de ouro vivo parecem os trigais.
Inquietante quietude. Raro tom de fa.

Tarde estivais. Triunfo da carne.
O amor ardente cruza o campo veloz.
Num fundo sangrento e de ouros deslumbrantes
abraçam-se Pan e Vénus cercados de bacantes.
Choros e cantares. Som de foices.

Tardes estivais. Carne, carne e carne.
As estrelas fortes dos grandes desejos
iluminam gloriosas, cheias de sonolência,
os doces mancebos, arautos de impotência
que riem eternos, formosos e feios.

Tardes estivais. Tardes estivais.
A luxúria esconde-se sobre a vossa calma.
A ânfora grandiosa das vossas inquietudes
ao derramar-se mata as azuis virtudes.
Chorosas tardes. Naufrágios da alma.

Federico García Lorca
(tradução: Carlos do Rosário)

Interpretado pela Andante:

Música: Recolha de Federico Garcia Lorca; Voz: Cristina Paiva; Canto: Lia Vohlgemuth; Piano: Joaquim Coelho; Guitarra clássica: Miguel Nogueira

A Andante, esta semana, vai estar...


30 Novembro de 2009
Amnésia
8º aniversário da Biblioteca Municipal de Loures: 21H30

2 Dezembro de 2009
Às avessas
Fórum Cultural de Alcochete: 10H30

4 Dezembro de 2009
Às escuras, o amor
Escola Lima de Freitas - Setúbal: 14H30

5 Dezembro de 2009
A leitura em voz alta*
Biblioteca Municipal de Moimenta da Beira: às 10H00 e às 17H00
*Integrado no programa de itinerâncias da DGLB

Mais logo, em Madrid

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


As Mulheres Bonitas
Não Viajam de Autocarro
João Villalobos
Arbusto Editores, 2007







As mulheres bonitas não viajam de autocarro.
Ardem no segredo dos cabeleireiros, flutuam dissolutas
nos ramos mais altos da manhã.

Inclino-me agora, espreito o teu umbigo
desguardado

e encontro um caroço de maçã.

domingo, 29 de novembro de 2009

Cantata para Un Silencio

Cantata para un silencio de Daniel Schvetz
30 de Novembro • 21h30
Centro Cultural Olga Cadaval - Auditório Jorge Sampaio
Sintra
Coro Sinfónico Lisboa Cantat - Maestro Jorge Alves
Estreia Mundial

O texto que serve de base à obra é uma montagem da prosa e poesia de cinco autores latino-americanos e um português. Nasceu do desafio feito pelo compositor, Daniel Shvetz, à escritora argentina Paula Ramos. O cubano Alejo Carpentier e o seu El reino de este mundo e Los pasos perdidos revelam-nos, com uma abordagem barroquista, uma visão lírica das primeiras épocas a seguir à colonização da América Central; o peruano Cesar Vallejo, um dos maiores representantes da poesia hispano-americana, brinda-nos com a sua constante inspiração e com as mais belas sonoridades do castelhano; Padre António Vieira, um dos pais da portugalidade e de língua portuguesa, através de excertos do seu conhecido Sermão de Santo António aos Peixes, dirigindo-se-lhes como se eles fossem homens; Manuel Scorza e a sua descrição, em prosa poética, das revoltas dos camponeses nos anos sessenta, em Redoble por Rancas; Juan Rulfo, considerado pelo seu único romance Pedro Páramo, o maior dos romancistas em língua espanhola, descreve como ninguém o silêncio nas suas diferentes vertentes, a distância, a solidão, a saudade, a busca impossível do parente perdido; e, finalmente, Jorge Luis Borges e a sua refinada forma de encadear pensamentos de forma particularmente sintética e clara.

Mais informações aqui.

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


Viagem de Inverno
Helder Macedo
Editorial Presença, 1994







Paguei a conta da viagem grátis
anos depois
a prestações com juros agravados
quando era já difícil recordar
para onde vim
e ao que vinha quando aqui cheguei.

Não sobra nunca muito a quem só chega
nem o regresso
que seria outro chegar ao não-lugar
que só existe no se ter deixado
e assim ficou
como um jardim coberto em selva escura.

Tenho ainda o recibo e a mala velha
onde trazia
o guia de turismo traduzido
da língua original que já esqueci
ou nunca soube
noutra língua também desconhecida.

sábado, 28 de novembro de 2009

Mais logo, na Corunha

(clicar para ampliar)

Outras sugestões para os próximos dias


30 de Novembro (segunda-feira):

LISBOA - Bar Na Cave
Dia 30 de Novembro: Lançamento do livro
“XX Dias”, de Rui Miguel Ribeiro, editado pela Averno.
R. da Imprensa Nacional, 116b (na cave do Restaurante Bs).




BRAGA - Estaleiro Cultural Velha-a-Branca
Recital de Poesia no dia 30 de Novembro, pelas 22 horas, no Estaleiro Cultural Velha-a-Branca (Largo da Senhora-a-Branca, nº 23 – Braga).
Poemas de Adélia Prado, ditos por Ana Arqueiro, Carolina Losa, Manuela Martinez, Marta Catarino (que dirige) e Sandra Andrade.

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1 de Dezembro (terça-feira):

PORTO - Clube Literário do Porto
Dia 1 Dezembro, no Piano-bar do Clube Literário do Porto, pelas 17h00, a apresentação do livro "Ciência para meninos em poemas pequeninos" de Regina Gouveia (editora Gatafunho).
O livro será apresentado pelo Professor Manuel Rangel e contará, para além da autora, com as presenças de Ana Paula Faria, representando a Editora, e o ilustrador.
(30% dos direitos de autor serão destinados às crianças da Guiné Bissau, através da Ajuda Amiga)
O Clube Literário do Porto fica na Rua Nova da Alfândega, n.º 22.

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2 de Dezembro (quarta-feira):

COIMBRA – Universidade de Coimbra
Apresentação/sessão de leitura de "Emparedada/Uit de Muur" de Joana Serrado no dia 2 de Dezembro, na Universidade de Coimbra, num evento organizado pelo Leitorado de Neerlandês.
Às 15 horas, na sala 14-A.



PORTO - Bar Labirintho
No dia 2 de Dezembro, pelas 23H00, vai ter lugar no Bar Labirintho, o lançamento do livro de poesia “Pormenor que eu Seja” de Maria Teresa Mota.
Apresentação: Minês Castanheira.
Performance: Carolina Rocha e Isabel Martins.
Acompanhamento musical: Xavier Ramos (cítara).
O Bar Labirintho fica na Rua Nossa Senhora de Fátima, 334, Porto.

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3 de Dezembro (quinta-feira):

PORTO – Bertrand Porto Gran Plaza
Lançamento do livro de poesia "Gramática do @mor Tecnológico" de Paulo Alexandre e Castro (Papiro Editora) no dia 3 de Dezembeo, pelas 18H00, na Livraria Bertrand Porto Gran Plaza-Shopping (Rua Fernandes Tomás, Loja 18/19), no Porto.
Apresentação da obra a cargo de Alexandra de Pinho.


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4 de Dezembro (sexta-feira):

BRAGA - Estaleiro Cultural Velha-a-Branca
Recital de Poesia no dia 4 de Dezembro, pelas 22 horas, no Estaleiro Cultural Velha-a-Branca (Largo da Senhora-a-Branca, nº 23 – Braga).
Poemas de Adélia Prado, ditos por Ana Arqueiro, Carolina Losa, Manuela Martinez, Marta Catarino (que dirige) e Sandra Andrade.

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5 de Dezembro (sábado):

BARREIRO – Cooperativa Cultural Popular Barreirense
Apresentação do livro/CD “Gente Povo Todo o Dia” de Filipe Chinita, na Cooperativa Cultural Popular Barreirense, no dia 5 de Dezembro, pelas 21 horas.
Apresentação de Manuel Gusmão e leitura de poemas por Manuel Alpalhão.
A Cooperativa Cultural fica na Rua Miguel Bombarda, 64-C, no Barreiro.

LISBOA – Auditório Campo Grande
Apresentação do livro "Hierofania dos Dedos" de Jorge Vicente (edição Temas Originais) no dia 5 de Dezembro, pelas 19 horas, no Auditório do Campo Grande, 56, em Lisboa.
Obra e autor serão apresentados pelo poeta Rui Sousa e a sessão contará com um momento musical por Patrícia Domingues.




LISBOA - Palácio Galveias
Lançamento do livro de Henrique Mendes “Quotidiano Subtil” (edição Temas Originais) no Palácio das Galveias, no dia 5 de Dezembro, pelas 19H30.
Com a presença do autor.






BRAGA - Mosteiro de Tibães

Lançamento da antologia “Trago-te um sonho nas mãos” (edição Temas Originais) nas antigas cavalariças do Mosteiro de Tibães, em Braga, no dia 5 de Dezembro, pelas 15H30.
A obra será apresentada por Xavier Zarco.
Evento promovido por: ASAS - Associação de Solidariedade e Acção Social de Santo Tirso, VI Encontro Luso-Poemas e Editora Temas Originais.

PORTO - Clube Literário do Porto
Lançamento do livro «Poesia Reunida» de Maria Teresa Horta (Edições Dom Quixote) no dia 5 de Dezembro, no Piano-bar do Clube Literário do Porto, pelas 18H30.

Mais logo, em Braga

O Canto III dos Lusíadas contado por António Fonseca.
28 de Novembro, 22H00

Depois do Canto I e II, António Fonseca conta, sem cortes, sem paragens e sem livro o Canto III do livro Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões.

Na Livraria 100ª Página: Casa Rolão, Av. Central nº 118-120, Braga

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


A Luz da Madrugada
Fernando Pinto do Amaral
Dom Quixote, 2007







Vê como se aproxima o fim do mundo
que alguém te confiou desde o primeiro
agosto do teu corpo noutro corpo
e respira de novo na certeza
dos passos que te levam rumo ao fim
do tempo conhecido. Nada sabes
dos rostos que tiveste noutras vidas,
de quem foste ou fizeste, quem amaste
antes de tu seres tu. Ninguém te diz
que matéria foi essa, qual o sangue
aceso nesses corpos que passaram
por ti fora de ti. Quem te sonha
desde sempre na sombra do teu sono?

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Mais logo, em Évora

27 de Novembro • 22H00
O POEMAS (A)CORDA
por Nuno Mangas-Viegas e João Mendes de Sousa
No Bibliocafé Intensidez

Este projecto nasce de uma sede mútua. Surge como questionamento e como resposta, como desejo e como ânsia de trilhar novos caminhos, de desafiar e testar até onde poderão a poesia e música sulcar a mesma terra. E daqui brota uma simbiose despertadora e provocadora.
Música e a Poesia reúnem-se numa só entidade, híbrida: um corpo fluente e dinâmico, alimentado de naufrágios, amamentado pelo quente seio do Sentir.
O Humano perante a Criação; a Criação defronte da Multiplicidade, do pluralismo de vozes e murmúrios interiores.
O Poema “vendo-se e pensando-se” ao espelho da música, enquanto o Homem se problematiza enquanto semi-deus fecundante e redentor de si mesmo.
E a sofreguidão, e o choro, e a demência… serão a rejeição, o retirar de peso ao Tempo.
O Caos e a Subconsciência invadem-nos, subjugam-nos… Mas O Poema (A)Corda, despertando em nossos olhos, a senda medular da dimensão artística: A Palavra e o Som serão a matéria-prima para o construir deste edifício.
“A sensibilidade esbatida na ausência, consagra-nos neste inabalável tormento…”, o de sermos mártires e senhores de uma identidade insaciável…

Nuno Mangas-Viegas: Poemas / Voz
Natural de Tavira. Reside actualmente em Évora. Aluno do terceiro ano do Curso de Línguas, Literaturas e Culturas, perfil de Literatura e Artes, da Universidade de Évora.*

João Mendes de Sousa: Guitarra Eléctrica / Programação Electrónica
Natural de Lisboa. Reside em Montemor-o-Novo. Aluno do terceiro ano do Curso de Línguas, Literaturas e Culturas, perfil de Estudos Portugueses e Espanhóis, da Universidade de Évora.*

* Ambos co-directores da Revista “Alma Ibérica”.


O Intensidez Bibliocafé fica na Rua Escrivão da Câmara, 10, em Évora.

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


Poesia
Eugénio de Andrade
Fundação Eugénio de Andrade, 2005
(2ª edição revista e acrescentada)







O ofício


Recomeço.
Não tenho outro ofício.

Entre o pólen subtil
e o bolor da palha,
recomeço.

Com a noite de perfil
a medir-me cada passo,

recomeço,
pedra sobre pedra,
a juntar palavras;

quero eu dizer:
ranho baba merda.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


Poemas Reunidos
1934-1953
Dylan Thomas
Tradução de Ivan Junqueira
José Olimpo Editora, 2003
(2ª edição revista)





Parto esse pão


Parto esse pão que outrora foi centeio,
Esse vinho sobre uma árvore estranha
Submersa em seus frutos;
O homem durante o dia ou o vento à noite
Derrubaram as searas e esmagaram a alegria das uvas.

Outrora nesse vinho, o sangue do verão
Pulsava na carne que recobria a videira,
Outrora nesse pão
O centeio era feliz ao vento;
Mas o homem dilacerou o sol e abateu o vento.

Essa carne que despedaças, esse sangue que permites
Trazer desolação às veias
Eram as uvas e o centeio
Nascidos da seiva e de sensuais entranhas;
Meu vinho que bebes, meu pão que abocanhas.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Livrarias de culto

Fez 1 ano que abriu, em Lisboa, a Livraria Poesia Incompleta, uma livraria de poesia, no n.º 11 da Rua Cecílio de Sousa (entre o Príncipe Real e a Praça das Flores). Parabéns!
O blogue pode ser visitado aqui.

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


Previsão de Tempo para Utopia e Arredores
Charles Simic
Selecção e tradução de José Alberto Oliveira
Assírio & Alvim, 2002





Happy End

E depois carregaram no melão
E ouviram-no estalar
E depois comeram até rebentar
E depois o pássaro cantou oh tão docemente
Enquanto se sentavam coçando-se sem malícia
Bom disse eu pois nesse momento
Os coxos começaram a dançar dobre a mesa
Nessa noite encontrei uma espécie de anjo
Tens lume perguntou ela
Quando eu lhe desapertava o vestido
Já havia muitos deles
Que tinham trepado para o tecto
Amantes chamavam-lhes e seguravam
Rosas entre os dentes enquanto a Primavera
Prosseguia para lá das grandes janelas abertas
E até um pau usado para bater em crianças
Floriu junto à estrada tortuosa
Que um palpite me mandou seguir

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Saudades da terra

Uns olhos que me olharam com demora,
não sei se por amor se caridade,
fizeram-me pensar na morte, e na saudade
que eu sentiria se morresse agora.

E pensei que da vida não teria
nem saudade nem pena de a perder,
mas que em meus olhos mortos guardaria
certas imagens do que pude ver.

Gostei muito da luz. Gostei de vê-la
de todas as maneiras,
da luz do pirilampo à fria luz da estrela,
do fogo dos incêndios à chama das fogueiras.
Gostei muito de a ver quando cintila
na face de um cristal,
quando trespassa, em lâmina tranquila,
a poeirenta névoa de um pinhal,
quando salta, nas águas, em contorções de cobra,
desfeita em pedrarias de lapidado ceptro,
quando incide num prisma e se desdobra
nas sete cores do espectro.

Também gostei do mar. Gostei de vê-lo em fúria
quando galga lambendo o dorso dos navios,
quando afaga em blandícias de cândida luxúria
a pele morna da areia toda eriçada de calafrios.

E também gostei muito do Jardim da Estrela
com os velhos sentados nos bancos ao sol
e a mãe da pequenita a aconchegá-la no carrinho e a adormecê-la
e as meninas a correrem atrás das pombas e os meninos a jogarem ao futebol.

A porta do Jardim, no inverno, ao entardecer,
à hora em que as árvores começam a tomar formas estranhas,
gostei muito de ver
erguer-se a névoa azul do fumo das castanhas.

Também gostei de ver, na rua, os pares de namorados
que se julgam sozinhos no meio de toda a gente,
e se amam com os dedos aflitos, entrecruzados,
de olhos postos nos olhos, angustiadamente.

E gostei de ver as laranjas em montes, nos mercados,
e as mulheres a depenarem galinhas e a proferirem palavras grosseiras,
e os homens a aguentarem e a travarem os grandes camiões pesados,
e os gatos a miarem e a roçarem-se nas pernas das peixeiras.

Mas... saudade, saudade propriamente,
essa tenaz que aperta o coração
e deixa na garganta um travo adstringente,
essa, não.

Saudade, se a tivesse, só de Aquela
que nas flores se anunciou,
se uma saudade alguém pudesse tê-la
do que não se passou.
De Aquela que morreu antes de eu ter nascido,
ou estará por nascer – quem sabe? – ou talvez ande
nalgum atalho deste mundo grande
para lá dos confins do horizonte perdido.

Triste de quem não tem,
na hora que se esfuma,
saudades de ninguém
nem de coisa nenhuma.

António Gedeão

Na voz de Luís Gaspar:

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


A Festa das Letras
António Simões
Edição do autor, 1995
(com ilustrações de Manuel Abreu Lima)







D


Arco em repouso

Apenas
um arco em repouso:
flechas de silêncio
prontas a disparar
na corda
só em pensamento retesada,
para que o silêncio redondo
trespasse o ar —

Mais nada.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


Visões de Bruma
Américo Teixeira Moreira
Direcção Geral dos Assuntos Culturais - Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1987
(Prémio "Antero de Quental" Concurso Literário Açores 1986)




Quantos mares extasiados
lentos e sussurrantes ardem
na lagoa do meu peito a pedir água
para a sede vulcânica dos teus olhos!
A alma errante pelos becos da ribeira
alonga-se na mansidão do fogo
a cada fluir da névoa
repartida na nostalgia de uma saudade
ou na certeza das aluviões tranquilas
a mergulhar no crepúsculo em agonia.
Uma sucessão de sonos encalhados na furna
resiste ao encalhar das ondas e vai
modulando o ilhéu migrador
dos últimos devaneios calados
na memória.

domingo, 22 de novembro de 2009

Um texto de Henrique Fialho sobre o recente livro de poesia de Sérgio Godinho para ler no Rascunho, aqui.

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


Caras Baratas
Adília Lopes
Selecção e Posfácio de Elfriede Engelmayer
Relógio d'Água, 2004







O taxista
que me leva
para casa
quer ser meu namorado
você deve ser uma moça porreira
e eu tristíssima gorda disforme
digo-lhe que não pode ser
pelo telefone
(numa inspiração
tinha-lhe dito o meu nome
e dado o meu número de telefone)
o cumprimento do taxista
tão gentil
foi a minha paga
de mais um ano de estudos perdido
a dormitar e a rilhar areias

sábado, 21 de novembro de 2009

Outras sugestões para os próximos dias

23 de Novembro (segunda-feira):

MOITA - Biblioteca Municipal
Dia 23 de Novembro, a Associação Artística Andante vai apresentar o espectáculo "Anatomias" na Biblioteca Municipal da Moita, às 11H00 e às 14H30.
Um espectáculo com textos de Manuel António Pina, António Gedeão, Herman Melville, Jacques Prévert, Antoine de Saint-Exupéry, João Pedro Mésseder e outros.
Integrado no programa de itinerâncias da DGLB.

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25 de Novembro (quarta-feira):

LISBOA – Casa Fernando Pessoa
A apresentação do novo livro de Ana Luísa Amaral, Se Fosse um Intervalo (D. Quixote/ LeYa), terá lugar na Casa Fernando Pessoa, no próximo dia 25 de Novembro às 18h30.
Sobre o livro falará Isabel Allegro de Magalhães.
A autora e o actor Luís Lucas farão uma leitura de poemas.



PORTO - Clube Literário do Porto
Dia 25 de Novembro, no Piano-bar, pelas 22 horas:
Quartas Mal Ditas - Sessão de poesia
Tema: Poesia & Gastronomia
Organização e colagem de textos: Anthero Monteiro.
Leituras por: António Pinheiro, Diana Devezas, Isabel Marcolino, Luís Carvalho, Mário Vale Lima, Manuela Correia, Marta Tormenta, Rafael Tormenta.
O Clube Literário do Porto fica na Rua Nova da Alfândega, n.º 22

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26 de Novembro (quinta-feira):


LISBOA - Casa Fernando Pessoa
O poeta brasileiro Carlos Nejar irá apresentar na Casa Fernando Pessoa, dia 26 de Novembro pelas 18h30, a conferência Cecília Meireles e o Mar das Descobertas.
Nejar tratará do vínculo de Cecília às raízes portuguesas, relacionando o mar de Cecília e o de Pessoa (Álvaro de Campos), e o mar de Sophia de Mello Breyner Andresen. Haverá ainda lugar à leitura de poemas da autoria desta voz singular e universal.

LISBOA – Bulhosa de Entrecampos
Dia 26, quinta-feira, 18.30h
Lançamento de Livro de poesia “Cores Inquietas” de Isabel Rebelo Barbosa (Papiro Editora).

CALDAS DA RAINHA - Biblioteca Municipal
No dia 26 de Novembro, a Andante apresenta o espectáculo de poesia "Às escuras, o amor" na Biblioteca Municipal de Caldas da Rainha, pelas 14H30.






LISBOA - Bar Na Cave
No dia 27 de Novembro, vai ter lugar no Bar Da Cave:
Lançamento da segunda edição do livro “onde não estou, tu não existes”, de Marta Chaves, e relançamento de “conta-gotas”, de Filipe Homem Fonseca, ambos editados pela Tea For One.
O Bar Na Cave fica na R. da Imprensa Nacional, 116b (na cave do Restaurante Bs).

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27 de Novembro (sexta-feira):


LISBOA - Palácio Galveias
Lançamento do livro de poesia “Varandas de Luar” de Dalila Moura Baião (edição Temas Originais) no Palácio das Galveias, no dia 27 de Novembro, pelas 19H30.
Obra e autora serão apresentadas pelo poeta António MR Martins e por Maria Lina Faria, respectivamente.




ODIVELAS – Centro de Exposições

Vai realizar-se, no dia 27 de Novembro, mais uma sessão da tertúlia quinzenal "Palavreando", pelas 22 horas, na Casa do Largo, Centro de Exposições de Odivelas.
Um local onde os tertulianos poetas, escritores, amantes da poesia, anónimos ou conhecidos conversam, ouvem e lêem poesia.

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28 de Novembro (sábado):

FARO – Livraria Pátio de Letras
Sábado, dia 28 de Novembro, pelas 17h00:
Lançamento do novo livro de poesia de Teresa Rita Lopes "O Sul dos Meus Sonhos" (Ed. Gente Singular), Livraria Pátio de Letras.
Apresentação pelo Prof. José Louro e pela autora.
A Livraria Pátio de Letras fica na Rua Dr. Cândido Guerreiro, 26-30, em Faro.



LISBOA - Auditório do Campo Grande
Lançamento do livro de poesia de António MR Martins “Quase do Feminino” (edição Temas Originais) no Auditório do Campo Grande, 56, Lisboa, no dia 28 de Novembro, pelas 16H00.
Obras e autor serão apresentados por Catarina Boavida.




PORTO - Clube Literário do Porto
Lançamento do livro "Poemas Suados a Negro" de Adrião de Abreu Pereira da Cunha (editora Edita-me), no Clube Literário do Porto, no dia 28 de Novembro pelas 16H00.
Com apresentação a cargo de Carlos Lopes da editora Edita-Me, e com a participação da diseur Celeste Pereira e do músico Miguel Motta (piano e voz).


LISBOA - Palácio Galveias

Uma iniciativa da Associação Portuguesa de Poetas:
Dia 28 de Novembro, das 19h00 às 20h30, no Palácio Galveias (Campo Pequeno – Lisboa):
Palestra pela pintora Catarina Malanho Semedo "A Pintura e a Poesia".
Entrada livre.

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


SUD-EXPRESS
poesia francesa de hoje
Antologia coordenada por Guilhermina Jorge, Jean-Pierre Léger e Etienne Rabaté
Relógio d'Água, 1993







O momento do caracol


Para fazer esta experiência
coloca-se no cimo de uma bola
a flutuar numa bacia
um caracol da Borgonha
que mantemos em reptação
no lugar através de uma pinça
fixada na casca. Depois
fazemos oscilar-lhe sob o nariz
um curto pau horizontal. Ao ritmo
de três vibrações por segundo
o caracol fica na bola. Ao ritmo
de quatro por segundo
lança-se porque o pau
para ele está imóvel. Assim
o belta splendens prepara-se
para a luta quando distingue
trinta vezes por segundo
a imagem de um congénere.

Pierre Alferi
(Tradução de Fernando Pinto do Amaral)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Mais logo, no Porto

No Maria vai com as outras
22H30
R. do Almada, 443, Porto

Poesia nos Jerónimos

Voz: Luís Machado
Piano: Inês Rodrigues Correia

21 de Novembro: Sophia de Mello Breyner
5 de Dezembro: Eugénio de Andrade
19 de Dezembro: Poemas de Natal
9 de Janeiro: Ary dos Santos

Sessões: Sábados às 17H00

Uma iniciativa de Luís Machado, no Museu Nacional de Arqueologia (Praça do Império - Mosteiro dos Jerónimos), Lisboa

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


Recôndito
António Salvado
Livraria Amato Lusitano, 1972

(2ª edição)







O astro


Onde se queima a luz, translúcido, no astro
o horizonte surge do seu curso —
e alucinado, amorfo, enquanto o grito
em vento se traduz, o gesto apaga
lúgrube e fresco a força do infinito.

Eu fico entre a surpresa e o desânimo,
pois entreguei meus dedos inseguros
à lucidez da véspera: toldou
assim meu ser a cicatriz das horas
e o dia que esperava não soou.

Quebro na sombra aquela dor longínqua
como recordação em chaga revivida...
O astro se perdeu: dentro de mim o vejo,
ele permuta o sol e a escuridão
envolto no silêncio em que rastejo.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009