terça-feira, 31 de outubro de 2006
Portal Pessoa
O Portal Pessoa, da Associação A Alma - Associação da Literatura Modernista (uma nova associação, sem fins lucrativos, dedicada à literatura portuguesa e modernista) é um portal de internet dedicado ao poeta Fernando Pessoa onde se publica ensaios sobre literatura portuguesa, provenientes de todo o mundo.
É, assim, um novo espaço onde académicos, profissionais, e outros interessados podem publicar os seus trabalhos e partilhá-los com outros leitores. A intenção é que a publicação contínua de novos trabalhos forme uma valiosa base de dados de ensaios sobre a literatura portuguesa e modernista.
Neste momento, o Portal Pessoa já tem três ensaios — dois ensaios em português, da autoria de José Blanco e de Richard Zenith e um ensaio em inglês, da autoria de Bernard O’Donoghue, e procura novos trabalhos para publicar.
Pode ser visitado em: http://www.portalpessoa.org
Aqui fica, Luís, uma prenda de aniversário (minha e do Luís Gaspar). Uma gravação audio do teu poema “Afectos”:
Afectos
Fiquei a saber num destes fins-de-tarde
que se podia estar subnutrido de ternura
e afoguei-me no desânimo que me acenava do horizonte
Caiu-me uma pérola húmida do olhar
pensei apenas em guardar em mim
a saudade das carícias tecidas em silêncio
Não foi possível, acendeste-me o desejo dos teus dedos
apetecia-me beijar-te como quem afaga um charuto com os lábios
vendo subir aos céus o fumo do teu cio
Fiquei a saber numa destas noites de lua cheia
que se podia estar subnutrido de ternura
caiu-me uma pérola húmida do olhar
Apesar de os lobisomens
não se poderem dar ao luxo de cultivar mágoas
nas plantações do estio que passa
Apenas lhes é concedido o grato subterfúgio
de uivar nas trevas como quem urde um poema
às escondidas de Deus
Fiquei a saber numa destas manhãs de trovoada
que o teu corpo era feito de raios e coriscos
e que os teus pais não te deixavam fazer amor sozinha
Por terem medo
dos teus gritos de prazer
na hora de te sentires mulher
Mesmo assim fazias amor sozinha
dispensando-me o teu corpo
em marés de luz
Fiquei a saber numa destas madrugadas de fogo
que a ternura está guardada num baú
disfarçado de cofre à prova de sentimentos
Nessa mesma hora
senti o meu ser
a dissolver-se devagar
Ao longe, muito ao longe
lembro-me de ter sentido um arrepio na alma
como se tivesses pintado o teu sorriso no meu peito
Luís Graça
Afectos
Fiquei a saber num destes fins-de-tarde
que se podia estar subnutrido de ternura
e afoguei-me no desânimo que me acenava do horizonte
Caiu-me uma pérola húmida do olhar
pensei apenas em guardar em mim
a saudade das carícias tecidas em silêncio
Não foi possível, acendeste-me o desejo dos teus dedos
apetecia-me beijar-te como quem afaga um charuto com os lábios
vendo subir aos céus o fumo do teu cio
Fiquei a saber numa destas noites de lua cheia
que se podia estar subnutrido de ternura
caiu-me uma pérola húmida do olhar
Apesar de os lobisomens
não se poderem dar ao luxo de cultivar mágoas
nas plantações do estio que passa
Apenas lhes é concedido o grato subterfúgio
de uivar nas trevas como quem urde um poema
às escondidas de Deus
Fiquei a saber numa destas manhãs de trovoada
que o teu corpo era feito de raios e coriscos
e que os teus pais não te deixavam fazer amor sozinha
Por terem medo
dos teus gritos de prazer
na hora de te sentires mulher
Mesmo assim fazias amor sozinha
dispensando-me o teu corpo
em marés de luz
Fiquei a saber numa destas madrugadas de fogo
que a ternura está guardada num baú
disfarçado de cofre à prova de sentimentos
Nessa mesma hora
senti o meu ser
a dissolver-se devagar
Ao longe, muito ao longe
lembro-me de ter sentido um arrepio na alma
como se tivesses pintado o teu sorriso no meu peito
Luís Graça
Luís Graça
Luís Graça nasceu em 31 de Outubro de 1962 em Lisboa (como ele próprio costuma dizer, nasceu de cesariana no Dia das Bruxas, à hora em que a cidade acordava para mais um dia de trabalho).
Frequentou o curso de Direito na Universidade Clássica de Lisboa até ao 2º ano, que interrompeu quando se apaixonou pela escrita publicitária (foi redactor criativo na Team/Protásio — actualmente Young & Rubicam) e mais tarde, dedicou-se ao jornalismo.
A escrita, mais do que uma profissão é para ele uma devoção. Começou no DN Jovem e ficou-lhe o “vício”. Tem alguns prémios de teatro, o último dos quais na edição 2000 do concurso “Novos Textos” (Inatel), com a peça "Meia dúzia de maldades", que obteve o terceiro lugar. Em 1987 uma peça sua premiada pelo FAOJ ("Viver é o que está a dar o tilintar das almas") esteve em cena durante um mês, no palco do Trindade.
Também já foi premiado em poesia, conto e pintura.
Obteve também o 1º prémio semanal DN Jovem, com o poema “Conto de fadas”; menção honrosa no concurso de poesia de Fânzeres/Gondomar, com a obra “Veneno de Outubro” (1992).
Um poema seu foi incluído na colectânea de poesia "Ventana à la nueva poesia portuguesa", editada no México pela Editora Desierto.
Luís Graça escreve de tudo: contos, poesia, romances, crítica de banda desenhada, argumentos para banda desenhada... e postais, bilhetes, bocados de toalhas de papel dos restaurantes... para os amigos.
É um amante de BD, Jazz, literatura, cinema, desporto e muito recentemente... de hidroginástica.
Luís Graça é um Bocage dos tempos modernos. O humor é o seu território de eleição, mas ao espírito cáustico gosta de juntar uma pitada de romantismo. Como ele próprio diz, a sua bússola é o humor; mais do que fazer amor, importa fazer humor com as palavras, para que estas não se percam.
Gosta de se apelidar de “poeta maldito”, mas Luís é um “poeta bendito”. Bendito pela Musa, pelo Humor e pela Amizade.
Obras individuais:
“A Idade das Trovas” (Universitária Editora, 1998), sob o pseudónimo de Inocêncio Pinga Amor (poesia); “Meia Dúzia de Maldades” (Inatel), teatro; “O homem que casou com uma estrela porno e outros contos perversos” (Editora Polvo, 2003, contos); “De Boas Erecções está o Inferno Cheio” (Editora Polvo, 2004, poesia erótica); “Neura 2004” (Editora Oficina do Livro, 2004, romance); “Fado, Futebol e Farpas” (Edição de autor, 2006, romance).
Principais obras colectivas: “100 Anos Federico Garcia Lorca, homenagem dos poetas portugueses” (Universitária Editora); “Antologia da Poesia Erótica” (Universitária Editora); Antologia DN Jovem (Editorial Notícias); participações nos “Florilégios de Natal” (Universitária Editora), Cadernos
de poesia “Viola Delta” (Edições MIC), “SOL XXI” (Edições SOL XXI), fólios de poesia “Petrinia” (Liga dos Amigos de Alpedrinha); “Neruda, Cem anos Depois” (Universitária Editora, 2004).
Na net: www.escritateatral.net (em Dramaturgos), com links para página da APAD (Associação Portuguesa de Argumentistas e Dramaturgos) e Jota Mais (DN Jovem); página da Portuguese Film Comission; várias edições da storm magazine.com, com um conto na rubrica sobre Comunidades de Leitores e críticas literárias. Recensões de BD em www.centralcomics.com e www.bizarro.cc.
Blogues pessoais:
http://15desatinonimos.blogspot.com
http://gandaordinarice.blogspot.com
http://sexonanoite.blogspot.com
Frequentou o curso de Direito na Universidade Clássica de Lisboa até ao 2º ano, que interrompeu quando se apaixonou pela escrita publicitária (foi redactor criativo na Team/Protásio — actualmente Young & Rubicam) e mais tarde, dedicou-se ao jornalismo.
A escrita, mais do que uma profissão é para ele uma devoção. Começou no DN Jovem e ficou-lhe o “vício”. Tem alguns prémios de teatro, o último dos quais na edição 2000 do concurso “Novos Textos” (Inatel), com a peça "Meia dúzia de maldades", que obteve o terceiro lugar. Em 1987 uma peça sua premiada pelo FAOJ ("Viver é o que está a dar o tilintar das almas") esteve em cena durante um mês, no palco do Trindade.
Também já foi premiado em poesia, conto e pintura.
Obteve também o 1º prémio semanal DN Jovem, com o poema “Conto de fadas”; menção honrosa no concurso de poesia de Fânzeres/Gondomar, com a obra “Veneno de Outubro” (1992).
Um poema seu foi incluído na colectânea de poesia "Ventana à la nueva poesia portuguesa", editada no México pela Editora Desierto.
Luís Graça escreve de tudo: contos, poesia, romances, crítica de banda desenhada, argumentos para banda desenhada... e postais, bilhetes, bocados de toalhas de papel dos restaurantes... para os amigos.
É um amante de BD, Jazz, literatura, cinema, desporto e muito recentemente... de hidroginástica.
Luís Graça é um Bocage dos tempos modernos. O humor é o seu território de eleição, mas ao espírito cáustico gosta de juntar uma pitada de romantismo. Como ele próprio diz, a sua bússola é o humor; mais do que fazer amor, importa fazer humor com as palavras, para que estas não se percam.
Gosta de se apelidar de “poeta maldito”, mas Luís é um “poeta bendito”. Bendito pela Musa, pelo Humor e pela Amizade.
Obras individuais:
“A Idade das Trovas” (Universitária Editora, 1998), sob o pseudónimo de Inocêncio Pinga Amor (poesia); “Meia Dúzia de Maldades” (Inatel), teatro; “O homem que casou com uma estrela porno e outros contos perversos” (Editora Polvo, 2003, contos); “De Boas Erecções está o Inferno Cheio” (Editora Polvo, 2004, poesia erótica); “Neura 2004” (Editora Oficina do Livro, 2004, romance); “Fado, Futebol e Farpas” (Edição de autor, 2006, romance).
Principais obras colectivas: “100 Anos Federico Garcia Lorca, homenagem dos poetas portugueses” (Universitária Editora); “Antologia da Poesia Erótica” (Universitária Editora); Antologia DN Jovem (Editorial Notícias); participações nos “Florilégios de Natal” (Universitária Editora), Cadernos
de poesia “Viola Delta” (Edições MIC), “SOL XXI” (Edições SOL XXI), fólios de poesia “Petrinia” (Liga dos Amigos de Alpedrinha); “Neruda, Cem anos Depois” (Universitária Editora, 2004).
Na net: www.escritateatral.net (em Dramaturgos), com links para página da APAD (Associação Portuguesa de Argumentistas e Dramaturgos) e Jota Mais (DN Jovem); página da Portuguese Film Comission; várias edições da storm magazine.com, com um conto na rubrica sobre Comunidades de Leitores e críticas literárias. Recensões de BD em www.centralcomics.com e www.bizarro.cc.
Blogues pessoais:
http://15desatinonimos.blogspot.com
http://gandaordinarice.blogspot.com
http://sexonanoite.blogspot.com
segunda-feira, 30 de outubro de 2006
Um Bar que é uma livraria de Poesia
Depois do bar, a livraria de Poesia. Os “Da Mariquinhas”, que também aceitam ser conhecidos por “Os Mariquinhas”, dão-nos notícia da abertura da outra parte do estabelecimento. Se na primeira sala funciona um simpático bar, abrirá agora a segunda sala para, espantem-se os amigos e clientes, provavelmente, a única livraria de poesia de Lisboa e arredores.
Segundo eles próprios “éclogas recentes, livros raros, alcóois fortes, e empregados poliglotas que falam com enorme desconhecimento da causa.”
Uma livraria que terá livros das editoras: &etc, frenesi, cotovia, editorial lumen, visor de poesía, l&pm, assírio & alvim, asa, mariposa azual, city lights books, quasi, presença, teorema, quetzal, relógio d'água e, claro, edições de autores.
A abertura será já depois de amanhã, quarta-feira 1 de Novembro, ao meio-dia. O encerramento está previsto para a meia-noite.
Posso já adiantar-vos que a abertura terá três livros em promoção: “O Tanatoperador”, de Manuel da Silva Ramos (Fenda); “Mancebos Solteiros do Mar”, de Carlos Mota de Oliveira (ed. autor); e “Poemas da Prisão e do Exílio”, de Nazim Hikmet (& etc).
Não é preciso dizer mais nada, pois não?
Eu, vou!
Ah! “Da Mariquinhas” fica na Rua dos Cordoeiros, 8/10, ao Largo de Santo Antoninho, Bica, Lisboa.
E o blogue deles está em: http://da-mariquinhas.blogspot.com
Segundo eles próprios “éclogas recentes, livros raros, alcóois fortes, e empregados poliglotas que falam com enorme desconhecimento da causa.”
Uma livraria que terá livros das editoras: &etc, frenesi, cotovia, editorial lumen, visor de poesía, l&pm, assírio & alvim, asa, mariposa azual, city lights books, quasi, presença, teorema, quetzal, relógio d'água e, claro, edições de autores.
A abertura será já depois de amanhã, quarta-feira 1 de Novembro, ao meio-dia. O encerramento está previsto para a meia-noite.
Posso já adiantar-vos que a abertura terá três livros em promoção: “O Tanatoperador”, de Manuel da Silva Ramos (Fenda); “Mancebos Solteiros do Mar”, de Carlos Mota de Oliveira (ed. autor); e “Poemas da Prisão e do Exílio”, de Nazim Hikmet (& etc).
Não é preciso dizer mais nada, pois não?
Eu, vou!
Ah! “Da Mariquinhas” fica na Rua dos Cordoeiros, 8/10, ao Largo de Santo Antoninho, Bica, Lisboa.
E o blogue deles está em: http://da-mariquinhas.blogspot.com
domingo, 29 de outubro de 2006
Poemas em voz alta
Tabacaria
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei-de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Génio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho génios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora génios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas —
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas —,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito-hipotético mais humanidade do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chuva, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, sem rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu, que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno — não concebo bem o quê —,
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e, não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.
Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando os pés e a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, e eu deixarei versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?),
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
Álvaro de Campos
15/1/1928
Na voz de Luís Gaspar:
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei-de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Génio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho génios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora génios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas —
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas —,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito-hipotético mais humanidade do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chuva, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, sem rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu, que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno — não concebo bem o quê —,
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e, não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.
Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando os pés e a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, e eu deixarei versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?),
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
Álvaro de Campos
15/1/1928
Na voz de Luís Gaspar:
sábado, 28 de outubro de 2006
Prémio hispano-luso de tradução tem o nome do poeta José Bento
O Prémio Hispano-Luso de Tradução terá a partir de agora o nome do poeta e tradutor português José Bento, o primeiro autor distinguido com este galardão. Esta decisão foi anunciada em Cáceres, Espanha, onde decorreu o encontro «Agora, o debate peninsular».
Numa cerimónia realizada no Palacio de la Diputácion Provincial de Cáceres, o presidente do júri e da Associação de Escritores Extremenhos, Antonio Saéz, declarou que, deste modo, se reconhece e distingue «o excelente trabalho» de José Bento, responsável pela tradução de mais de 50 obras de poetas espanhóis.
Na sua intervenção, José Bento agradeceu o prémio concedido pela Junta da Extremadura, que definiu como «a entidade que mais e melhor se tem dedicado ao conhecimento luso-espanhol» e evocando a sua carreira de poeta e tradutor, enumerou algumas das figuras ilustres da poesia espanhola cuja obra procurou trazer ao conhecimento dos portugueses.
Para o poeta e tradutor Francisco Brines, também presente na cerimónia, a obra de Bento «é a mais completa de tradução do espanhol para qualquer língua. (...) Se desaparecessem todos os livros da poesia espanhola e apenas ficasse a obra de Bento, o nosso legado poético estaria a salvo».
José Bento nasceu no litoral da zona de Aveiro, em 1932. Estudou no Porto e em Lisboa.
Nos anos 50, revelou-se como poeta em revistas de poesia como Árvore, Eros, Cadernos do Meio-Dia e Cassiopeia, de que foi um dos directores. É autor de vários livros de poesia, entre os quais «Sequência de Bilbau» (1978), «O enterro do senhor de Orgaz» (1986), «Silabário» (1992) e «Um sossegado silêncio» (2002).
Poucas vezes se preocupou em reunir os seus poemas em livro, pelo que o seu nome é normalmente citado como excelente tradutor de numerosos poetas de língua espanhola, clássicos ou actuais (S. Juan de la Cruz, Pablo Neruda, Cernuda, Quevedo, Jorge Manrique, Lorca, Vicente Aleixandre, César Vallejo). Traduziu também para português «Dom Quixote», de Miguel de Cervantes.
sexta-feira, 27 de outubro de 2006
E agora... recordando Verlaine e... Ferré
Chanson d'automne
Les sanglots longs
Des violons
De l'automne
Blessent mon coeur
D'une langueur
Monotone.
Tout suffocant
Et blême, quand
Sonne l'heure,
Je me souviens
Des jours anciens
Et je pleure
Et je m'en vais
Au vent mauvais
Qui m'emporte
Deçà, delà,
Pareil à la
Feuille morte.
Paul Verlaine
Ainda recordando Rimbaud
Acerca do post publicado neste blogue no dia 20 de Outubro passado (data do nascimento de Jean Arthur Rimbaud), Joaquim Cascais, “habitué” cá da casa enviou-nos, para nosso deleite, esta preciosa informação:
«Rimbaud é, como soe dizer-se em relação às palavras, como as cerejas, começa-se procurando os seus poemas, entra-se na biografia e aos poucos vai-se descobrindo variadíssimas manifestações em torno da sua obra acabando por encontrar-se Léo Ferré.
Foi assim que descobri uma versão do “Les Assis” dita por Léo Ferré, um libelo contra os bibliotecários que se recusam a deixar suas poltronas para atender os leitores e, a partir dela, encontrar a história do amor que Ferré nutria por Rimbaud e Verlaine.
Em 10 Outubro de 2004, um apaixonante CD duplo foi lançado pela editora discográfica (um editora familiar) “La Mémoire et la Mer” sob o título “Maudits soient-ils” dedicado a Rimbaud e a Verlaine e cantado ou dito pelo terceiro poeta “maldito” Léo Ferré.
É constituído, em parte, por registos encontrados nas cassetes de trabalho do cantor: ao que consta registos que o próprio Ferré fazia para o seu gravador pessoal muitas vezes deambulando pelo apartamento enquanto “dizia” para o suporte magnético. Posteriormente viria, por vezes, a musicar alguns dos poemas. Grande parte dos incluídos neste álbum são inéditos (21 poemas de Rimbaud e 24 de Verlaine) uns cantados à capela outros acompanhados ao piano. Pode-se dizer que este álbum surge graças ao filho de Ferré, Mathieu, que depois da morte do pai veio a descobrir estas gravações.
Não era a primeira vez que surgia um álbum de Ferré sobre estes dois poetas, bem pelo contrário, desde 1964 que eles apareceram. O primeiro editado pela Barclay em 01-06-64 era um LP de 33 rotações “Verlaine et Rimbaud chantés par Léo Ferré” - contendo apenas 24 poemas no total dos dois poetas, contudo, muito material de preparação do disco ficou por gravar, tendo sido já algum aproveitado numa reedição em 1991 e outra parte nesta edição de 2004.
Para além destes Ferré dedicou a Rimbaud, que eu me recorde, pelo menos outro dos seus álbuns “Une Saison en Enfer” e musicou vários poemas dele (La Maline; Le Bateau Ivre; etc) dispersos por outros álbuns.
Vários poemas ditos à capela ou acompanhados ao piano, para ouvir ou para telecarregamento, estão à disposição de quem consultar o site www.leo-ferre.com»
Joaquim Cascais
«Rimbaud é, como soe dizer-se em relação às palavras, como as cerejas, começa-se procurando os seus poemas, entra-se na biografia e aos poucos vai-se descobrindo variadíssimas manifestações em torno da sua obra acabando por encontrar-se Léo Ferré.
Foi assim que descobri uma versão do “Les Assis” dita por Léo Ferré, um libelo contra os bibliotecários que se recusam a deixar suas poltronas para atender os leitores e, a partir dela, encontrar a história do amor que Ferré nutria por Rimbaud e Verlaine.
Em 10 Outubro de 2004, um apaixonante CD duplo foi lançado pela editora discográfica (um editora familiar) “La Mémoire et la Mer” sob o título “Maudits soient-ils” dedicado a Rimbaud e a Verlaine e cantado ou dito pelo terceiro poeta “maldito” Léo Ferré.
É constituído, em parte, por registos encontrados nas cassetes de trabalho do cantor: ao que consta registos que o próprio Ferré fazia para o seu gravador pessoal muitas vezes deambulando pelo apartamento enquanto “dizia” para o suporte magnético. Posteriormente viria, por vezes, a musicar alguns dos poemas. Grande parte dos incluídos neste álbum são inéditos (21 poemas de Rimbaud e 24 de Verlaine) uns cantados à capela outros acompanhados ao piano. Pode-se dizer que este álbum surge graças ao filho de Ferré, Mathieu, que depois da morte do pai veio a descobrir estas gravações.
Não era a primeira vez que surgia um álbum de Ferré sobre estes dois poetas, bem pelo contrário, desde 1964 que eles apareceram. O primeiro editado pela Barclay em 01-06-64 era um LP de 33 rotações “Verlaine et Rimbaud chantés par Léo Ferré” - contendo apenas 24 poemas no total dos dois poetas, contudo, muito material de preparação do disco ficou por gravar, tendo sido já algum aproveitado numa reedição em 1991 e outra parte nesta edição de 2004.
Para além destes Ferré dedicou a Rimbaud, que eu me recorde, pelo menos outro dos seus álbuns “Une Saison en Enfer” e musicou vários poemas dele (La Maline; Le Bateau Ivre; etc) dispersos por outros álbuns.
Vários poemas ditos à capela ou acompanhados ao piano, para ouvir ou para telecarregamento, estão à disposição de quem consultar o site www.leo-ferre.com»
Joaquim Cascais
Papoilas em Julho
Pequenas papoilas, pequenas chamas do inferno,
Vocês não fazem mal?
E tremeluzem. Não posso tocar-vos.
Ponho as minhas mãos entre as chamas. Nada queima.
E fico exausta ao olhar-vos
A tremeluzir assim, pregueadas e de um vermelho vivo, como a pele de uma
boca
Uma boca que acabou de sangrar.
Pequenas bainhas ensanguentadas!
Há fumos que não posso tocar.
Onde está o vosso ópio, essas cápsulas que dão náuseas?
Se eu pudesse esvair-me em sangue, ou dormir –
Se a minha boca pudesse casar com uma ferida assim!
Ou se os vossos venenos pudessem penetrar em mim, nesta cápsula de vidro,
Para me entorpecerem e aquietarem.
Mas sem cor. Sem cor nenhuma.
Sylvia Plath
Vocês não fazem mal?
E tremeluzem. Não posso tocar-vos.
Ponho as minhas mãos entre as chamas. Nada queima.
E fico exausta ao olhar-vos
A tremeluzir assim, pregueadas e de um vermelho vivo, como a pele de uma
boca
Uma boca que acabou de sangrar.
Pequenas bainhas ensanguentadas!
Há fumos que não posso tocar.
Onde está o vosso ópio, essas cápsulas que dão náuseas?
Se eu pudesse esvair-me em sangue, ou dormir –
Se a minha boca pudesse casar com uma ferida assim!
Ou se os vossos venenos pudessem penetrar em mim, nesta cápsula de vidro,
Para me entorpecerem e aquietarem.
Mas sem cor. Sem cor nenhuma.
Sylvia Plath
Pela água
Um lago negro, um barco negro, duas pessoas negras em papel recortado.
Para onde vão as árvores negras que bebem aqui?
As suas sombras devem cobrir o Canadá.
Das flores aquáticas sai filtrada uma luz ténue.
As suas folhas não querem que nos apressemos:
São circulares e sem relevo, cheias de conselhos obscuros.
Mundos frios agitam-se com os remos.
O espírito da escuridão está em nós, está nos peixes.
Um ramo submerso ergue uma mão pálida em despedida;
As estrelas abrem-se entre os lírios.
Não ficas cego com a mudez de tais sereias?
Este é o silêncio das almas já perturbadas.
Sylvia Plath
Para onde vão as árvores negras que bebem aqui?
As suas sombras devem cobrir o Canadá.
Das flores aquáticas sai filtrada uma luz ténue.
As suas folhas não querem que nos apressemos:
São circulares e sem relevo, cheias de conselhos obscuros.
Mundos frios agitam-se com os remos.
O espírito da escuridão está em nós, está nos peixes.
Um ramo submerso ergue uma mão pálida em despedida;
As estrelas abrem-se entre os lírios.
Não ficas cego com a mudez de tais sereias?
Este é o silêncio das almas já perturbadas.
Sylvia Plath
Sylvia Plath
Sylvia Plath nasceu em Boston (nos Estados Unidos) em 27 de Outubro de 1932.
Em 1940 morreu o seu pai, Otto Plath (um cientista de ascendência germânica), facto que a marcaria para toda a sua vida. Sylvia tinha então oito anos e o irmão, Warren, cinco.
Aurelia Plath, sua mãe, suportou estoicamente aquela morte, transmitindo em certo sentido esse gesto aos filhos, trabalhando arduamente para lhes proporcionar uma educação que se enquadrasse nos cânones da classe média da Nova Inglaterra.
A infância e a adolescência de Sylvia foram marcadas por um percurso escolar exemplar. Obteve sempre as notas máximas, entrou para o Smith College com uma bolsa e publicou vários trabalhos literários, tendo ganho diversos concursos.
Em 1952, a publicação na revista Mademoiselle, de "Sunday at the Minton’s", proporcionou-lhe uma bolsa para frequentar, no ano seguinte, um seminário em Nova Iorque. Nessa época, Sylvia escreveu uma carta à mãe, revoltando-se por ela ter votado em Eisenhower, demonstrando-se uma opositora radical do senador McCarthy e do envolvimento americano na Coreia. Ao regressar a casa, em Agosto, deixou um bilhete à mãe dizendo-lhe que tinha ido dar um longo passeio. Muniu-se de um frasco de comprimidos e escondeu-se num espaço remoto da sua casa. Foi a sua primeira tentativa de suicídio. Descoberta dois dias depois, passou cinco meses em McLean’s, uma clínica psiquiátrica de Belmont. A escritora Olive Higgins custeou o seu internamento.
Em 1954 regressou ao Smith College e trabalhou obsessivamente em torno da sua dissertação sobre as duplas personalidades em alguns passos da obra de Dostoiévski. Colaborou entretanto em revistas, como Seventeen, Mademoiselle, Atlantic Monthly, e em publicações universitárias. Sylvia acabou em 1955 o curso no Smith College e recebeu uma bolsa Fulbright graças à qual foi ensinar para Inglaterra. Aí conheceu o poeta Ted Hughes, com quem casou em 1956. Viajaram por Paris e por Espanha. No ano seguinte foram ambos para os Estados Unidos dar aulas. Nesse ano, Sylvia recebeu o Prémio Bess Hokin da revista Poetry. Resolveu então abandonar o ensino para se dedicar, a tempo inteiro à produção literária, e regressou em definitivo a Inglaterra.
Em 1960 nasceu a primeira filha do casal, Frieda. No mesmo ano, Sylvia publicou o seu primeiro livro de poesia "The Colossus". No ano seguinte, concluiu "The Bell Jar" (A Campânula de Vidro), o qual seria editado em 1963 sob o pseudónimo de Victoria Lucas.
Em 1962 nasceu o segundo filho, Nick. No mesmo ano completou "Three Women: A Monologue for Three Voices". Alguns meses depois, separou-se do marido. Nesse espaço de tempo começou a ser produzida a poesia da sua obra prima, "Ariel" e "Winter Tree". A Inglaterra conheceu então um inverno como não havia memória, a água gelava nos canos e o aquecimento rareava. Sylvia sofreu de uma pneumonia mas continuou a escrever diariamente. Algumas semanas depois do lançamento do seu livro "The Bell Jar", Silvya fechou-se na cozinha ainda de madrugada, calafetou portas e janelas, ingeriu alguns comprimidos, sentou-se no chão com cabeça dentro do forno e abriu o gás. Tinha deixado leite para as crianças e uma carta destinada a uma psiquiatra com quem mantinha desde há muito uma relação de amizade.
"Ariel" foi publicado em 1965, sob a orientação de Ted Hughes.
Em 1940 morreu o seu pai, Otto Plath (um cientista de ascendência germânica), facto que a marcaria para toda a sua vida. Sylvia tinha então oito anos e o irmão, Warren, cinco.
Aurelia Plath, sua mãe, suportou estoicamente aquela morte, transmitindo em certo sentido esse gesto aos filhos, trabalhando arduamente para lhes proporcionar uma educação que se enquadrasse nos cânones da classe média da Nova Inglaterra.
A infância e a adolescência de Sylvia foram marcadas por um percurso escolar exemplar. Obteve sempre as notas máximas, entrou para o Smith College com uma bolsa e publicou vários trabalhos literários, tendo ganho diversos concursos.
Em 1952, a publicação na revista Mademoiselle, de "Sunday at the Minton’s", proporcionou-lhe uma bolsa para frequentar, no ano seguinte, um seminário em Nova Iorque. Nessa época, Sylvia escreveu uma carta à mãe, revoltando-se por ela ter votado em Eisenhower, demonstrando-se uma opositora radical do senador McCarthy e do envolvimento americano na Coreia. Ao regressar a casa, em Agosto, deixou um bilhete à mãe dizendo-lhe que tinha ido dar um longo passeio. Muniu-se de um frasco de comprimidos e escondeu-se num espaço remoto da sua casa. Foi a sua primeira tentativa de suicídio. Descoberta dois dias depois, passou cinco meses em McLean’s, uma clínica psiquiátrica de Belmont. A escritora Olive Higgins custeou o seu internamento.
Em 1954 regressou ao Smith College e trabalhou obsessivamente em torno da sua dissertação sobre as duplas personalidades em alguns passos da obra de Dostoiévski. Colaborou entretanto em revistas, como Seventeen, Mademoiselle, Atlantic Monthly, e em publicações universitárias. Sylvia acabou em 1955 o curso no Smith College e recebeu uma bolsa Fulbright graças à qual foi ensinar para Inglaterra. Aí conheceu o poeta Ted Hughes, com quem casou em 1956. Viajaram por Paris e por Espanha. No ano seguinte foram ambos para os Estados Unidos dar aulas. Nesse ano, Sylvia recebeu o Prémio Bess Hokin da revista Poetry. Resolveu então abandonar o ensino para se dedicar, a tempo inteiro à produção literária, e regressou em definitivo a Inglaterra.
Em 1960 nasceu a primeira filha do casal, Frieda. No mesmo ano, Sylvia publicou o seu primeiro livro de poesia "The Colossus". No ano seguinte, concluiu "The Bell Jar" (A Campânula de Vidro), o qual seria editado em 1963 sob o pseudónimo de Victoria Lucas.
Em 1962 nasceu o segundo filho, Nick. No mesmo ano completou "Three Women: A Monologue for Three Voices". Alguns meses depois, separou-se do marido. Nesse espaço de tempo começou a ser produzida a poesia da sua obra prima, "Ariel" e "Winter Tree". A Inglaterra conheceu então um inverno como não havia memória, a água gelava nos canos e o aquecimento rareava. Sylvia sofreu de uma pneumonia mas continuou a escrever diariamente. Algumas semanas depois do lançamento do seu livro "The Bell Jar", Silvya fechou-se na cozinha ainda de madrugada, calafetou portas e janelas, ingeriu alguns comprimidos, sentou-se no chão com cabeça dentro do forno e abriu o gás. Tinha deixado leite para as crianças e uma carta destinada a uma psiquiatra com quem mantinha desde há muito uma relação de amizade.
"Ariel" foi publicado em 1965, sob a orientação de Ted Hughes.
Hoje nasceu...
27 de Outubro de 1932
Sylvia Plath
Poetisa norte-americana
Artigos relacionados:
Biografia
Poemas: Pela água ; Papoilas em Julho
Na estante de culto: Ariel
quinta-feira, 26 de outubro de 2006
Já saiu o 8º volume da revista “Saudade”
Este volume 8 da revista de poesia “Saudade”, é dedicado ao conceito de universalidade em Arte e tem poemas de 40 poetas (portugueses, galegos, brasileiros e um angolano), nomeadamente Amadeu Baptista, António Salvado, Carlos Vaz, Casimiro de Brito, Daniel Gonçalves, Fernando Grade, João Ricardo Lopes, José Luís Peixoto, Juliana Miranda, Maria do Sameiro Barroso, Nicolau Saião, Pompeu Martins e Sérgio Pereira, entre outros, que dialogam com a ideia-epígrafe de Ruy Belo “O receio da morte é a fonte da arte”.
Esta revista semestral surgiu em 2001 no âmbito da programação da Associação Amarante Cultural, dirigida por António José Queirós, inspirando-se no testemunho poético de António Nobre e Teixeira de Pascoaes.
Com uma tiragem de 500 exemplares, a revista “Saudade”, que insiste em contrariar o “vazio” no mercado da poesia, encontra-se já disponível nas livrarias de todo o país, podendo igualmente ser pedida na sede da Associação Amarante Cultural.
Aqui fica um “cheirinho”, com um poema de Carlos Vaz:
por entre as coisas da sala
há uma jarra cheia de água
os objectos que a perpassam
tomam um corpo arredondado a meio e esguio no alto
encerrando nela uma forma geometricamente descoordenada de existir
tomo-a como o centro de uma circunferência
e giro em redor como só os satélites o fazem
entre mim e as coisas, jogam-se, assim, novas formas de ver
o mundo que está no mundo
no lado diurno da circunferência
habitam os rostos e os objectos que me observam
aprisionados como os génios em lamparinas
ou secretas mensagens à deriva numa garrafa
no lado nocturno, habitam os olhares dos cegos
que, como borboletas, avançam na espiral do jogo
até as sombras da incerteza e as imagens descuradas do real
encherem o copo do poema
Carlos Vaz
quarta-feira, 25 de outubro de 2006
Poemas em voz alta
Autopsicografia
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama o coração.
Fernando Pessoa
(Cancioneiro)
Na voz de Luís Gaspar:
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama o coração.
Fernando Pessoa
(Cancioneiro)
Na voz de Luís Gaspar:
terça-feira, 24 de outubro de 2006
Poesia de Picasso
Sob o título “Textos Espanhóis (1894 - 1968)” é-nos revelada uma das facetas desconhecidas de Pablo Picasso, a poesia, num livro que comemora o 125º aniversário do seu nascimento.
Os textos foram recolhidos pelo investigador Rafael Inglada, um dos principais estudiosos da vida e obra de Picasso.
A obra reúne 39 poemas escritos por Picasso entre 1894 e 1968, textos originais em espanhol e também obras em francês com referências dominantes a Espanha.
A faceta literária de Picasso é praticamente desconhecida do grande público conhecendo-se apenas uma edição completa das suas obras, “Picasso écrite”, publicada pela editora francesa Gallimard em 1979.
"Tabacaria", de Álvaro de Campos
Acaba de sair uma nova edição de «Tabacaria», de Fernando Pessoa, acompanhada da tradução em quatro línguas e ilustrada com fotografias inéditas a preto e branco de Luís Miguel Castro, editada pela editora Guerra & Paz.
Neste livro, o cruzamento entre a palavra e a imagem é potenciado pelo facto de um só poema de Pessoa, a "Tabacaria” de Álvaro de Campos, surgir publicado em cinco línguas: português, francês, espanhol, italiano e inglês. A cada uma das versões foram acrescentados rápidos apontamentos biográficos que ajudam a compreender Pessoa e, às vezes, os seus heterónimos.
As fotografias são de Luís Miguel Castro que, através de um "modelo pessoano" (o actor Victor Rua) criou uma linha narrativa que remete tanto para o poema e para as reflexões que dele emanam, como para o imaginário pessoano, desde o que hoje imaginamos que tenha sido o seu quotidiano, até aos locais de Lisboa a que, usualmente, associamos o poeta.
As traduções foram, no caso do espanhol e do italiano, encomendadas respectivamente a Ramiro Fonte e a Neva Cerantola, enquanto que, para as versões inglesa e francesa, foram usadas as traduções de Jonathan Griffin e de Armand Guibert.
O poema «Não sou nada/Nunca serei nada/Não posso querer ser nada/à parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo», que inicia «Tabacaria», é a entrada para o universo de uma das figuras imortais da literatura portuguesa, falecida em 1935.
segunda-feira, 23 de outubro de 2006
Poemas em voz alta
Na sombra Cleópatra jaz morta.
Chove.
Embandeiraram o barco de maneira errada.
Chove sempre.
Para que olhas tu a cidade longínqua?
Tua alma é a cidade longínqua.
Chove friamente.
E quanto à mãe que embala ao colo um filho morto –
Todos nós embalamos ao colo um filho morto.
Chove, chove.
O sorriso triste que sobra a teus lábios cansados,
Vejo-o no gesto com que os teus dedos não deixam os teus anéis.
Por que é que chove?
Fernando Pessoa
(Cancioneiro - Episódios / A Múmia)
Na voz de Luís Gaspar:
Chove.
Embandeiraram o barco de maneira errada.
Chove sempre.
Para que olhas tu a cidade longínqua?
Tua alma é a cidade longínqua.
Chove friamente.
E quanto à mãe que embala ao colo um filho morto –
Todos nós embalamos ao colo um filho morto.
Chove, chove.
O sorriso triste que sobra a teus lábios cansados,
Vejo-o no gesto com que os teus dedos não deixam os teus anéis.
Por que é que chove?
Fernando Pessoa
(Cancioneiro - Episódios / A Múmia)
Na voz de Luís Gaspar:
domingo, 22 de outubro de 2006
Os Sulitários
Aconteceu este sábado, na Fnac do Chiado, em Lisboa, mais uma apresentação do livro “Os Sulitários” da autoria de Paulo Barriga e João Vilhena, um "poema em imagens" que desvenda o Alentejo “para lá dos lugares comuns”, editado e lançado pela Fundação Alentejo-Terra Mãe.
“Os Sulitários” é um livro de poesia e fotografia, criação colectiva do jornalista Paulo Barriga e do fotógrafo João Francisco Vilhena.
O livro assume-se como um “poema em imagens” em torno de um Alentejo menos convencional e muito para lá dos lugares-comuns que erradamente enunciam as planícies do Sul, a terra dos "Sulitários".
Fala do homem do Sul e do Sol. Fala do tempo e do espaço. Fala da fertilidade e da morte. Fala da revolta e da cisma. Fala do mar e dos desertos e é a primeira edição da Fundação Alentejo-Terra Mãe.
Recomendo.
sábado, 21 de outubro de 2006
14.º Festival de Polipoesia de Barcelona
Desde 1991 que Barcelona é palco de um Festival de Polipoesia que ao longos dos anos se tornou numa das mais importantes mostras de poesia experimental, sonora e de vanguarda celebradas na Europa.
Este Festival tem como objectivo mostrar as tendências actuais da poesia sonora, fonética, electrónica, oral, ou seja... Polipoesia.
Desde o seu início, o Festival é protagonizado pelo poeta Xavier Sabater, estando a organização a cargo de La Papa (Associação de Performers, Artistas e Poetas Associados).
Este ano, o Festival terá lugar hoje, 21 de Outubro, das 19 às 22 horas.
E os convidados serão:
Conxita Giménez - Tarragona (Polipoesia)
Albert Pellicer - Inglaterra (Polipoesia electrónica)
Human Trash (Txus Garcia) - Tarragona (Polipoesia)
Neus Dalmau - Barcelona (Polipoesia & action painting)
La CIRCumstància... en desconcert (Noel Tatu & Perepau Jiménez) - Granollers (Cabaret poético)
Cristi B & DJ Raja - Barcelona (Polipoesia & DJ session)
A Polipoesia é um movimento poético fundado em Itália por Enzo Minarelli nos anos 80. É, como o próprio termo indica, “muitas poesias”, ou múltiplas formas de interpretar um poema, já que aplica ao recitar simples de um poema, disciplinas como a performance, o ruído, a distorção ou desfragmentação fonética, os meios audiovisuais, a música e as novas tecnologias. Assim, a Polipoesia amplifica a Poesia Concreta, o Futurismo e o Dadaísmo e desenvolve aspectos inéditos e novas possibilidades. A poesia acontece assim sonora, gestualizada, interpretada, onírica e surrealista, dançada, electrificada... infinita.
sexta-feira, 20 de outubro de 2006
Le Bateau Ivre
O vento abençoou minhas manhãs marítimas.
Mais leve que uma rolha eu dancei nos lençóis
Das ondas a rolar atrás de suas vítimas,
Dez noites, sem pensar nos olhos dos faróis!
Mais doce que as maçãs parecem aos pequenos,
A água verde infiltrou-se no meu casco ao léu
E das manchas azulejantes dos venenos
E vinhos me lavou, livre de leme e arpéu.
Então eu mergulhei nas águas do poema
Do Mar, sarcófago de estrelas, latescente,
Devorando os azuis, onde às vezes - dilema
Lívido - um afogado afunda lentamente;
Onde, tingindo azulidades com quebrantos
E ritmos lentos sob o rutilante albor,
Mais fortes que o álcool, mas vastas que os nossos prantos,
Fermentam de amargura as rubéolas do amor!
Conheço os céus crivados de clarões, as trombas,
Ressacas e marés: conheço o entardecer,
A aurora em explosão como um bando de pombas,
E algumas vezes vi o que o homem quis ver!
Eu vi o sol baixar, sujo de horrores místicos,
Iluminando os longos túmulos glaciais;
Com atrizes senis em palcos cabalísticos,
Ondas rolando ao longe os frémitos de umbrais!
Sonhei que a noite verde em neves alvacentas
Beijava, lenta, o olhar dos mares com mil coros,
Soube a circulação das seivas suculentas
E o acordar louro e azul dos fósforos canoros!
Por meses eu segui, tropel de vacarias
Histéricas, o mar estuprando as areias,
Sem esperar que aos pés de ouro das Marias
Esmorecesse o ardor dos Oceanos sem peias.
Cheguei a visitar as Flóridas perdidas
Com olhos de jaguar florindo em epidermes
De homens! Arco-íris tensos como bridas
No horizonte do mar de glaucos paquidermes.
Vi fermentarem pântanos imensos, ansas
Onde apodrecem Liviatãs distantes!
O desmoronamento da água nas bonanças
E abismos a se abrir no caos, cataratantes!
Geleiras, sóis de prata, ondas e céus cadentes!
Naufrágios abissais na tumba dos negrumes,
Onde, pasto de insectos, tombam as serpentes
Dos curvos cipoais, com pérfidos perfumes!
Ah! Se as crianças vissem o dourar das ondas,
Áureos peixes do mar azul, peixes cantantes...
- Espumas em flor ninaram minhas rondas
E as brisas da ilusão me alaram por instantes.
Mártir de pólos e de zonas misteriosas,
O mar a soluçar cobria os meus artelhos
Com flores fantasmais de pálidas ventosas
E eu, como uma mulher, me punha de joelhos...
Quase ilha a balouçar entre borras e brados
De gralhas tagarelas com olhar de gelo,
Eu vogava, e por minha rede os afogados
Passavam, a dormir, descendo a contrapelo.
Mas eu, barco perdido em baías e danças,
Lançado no ar sem pássaros pela torrente,
De quem os Monitores e os arpões das Hansas
Não teriam pescado o casco de água ardente;
Livre, fumando em meio às virações inquietas,
Eu que furava o céu violáceo como um muro
Que mancham, acepipe raro aos bons poetas,
Líquens de sol e vómitos de azul escuro;
Prancha louca a correr em lúnulas e faíscas
E hipocampos de breu, numa escolta de espuma,
Quando os sóis estivais estilhaçavam em riscas
O céu ultramarino e seus funis de bruma;
Eu que tremia ouvindo, ao longe a estertorar,
O cio dos Behemóts e dos Maeltroms febris,
Fiandeiro sem fim dos marasmos do mar,
Anseio pela Europa e os velhos peitoris!
Eu vi os arquipélagos astrais! e as ilhas
Que o delírio dos céus desvela ao viajor;
- É nas noites sem cor que te esqueces e te ilhas,
Milhão de aves de ouro, ó futuro Vigor?
Sim, chorar eu chorei! São mornas as Auroras!
Toda lua é cruel e todo sol, engano:
O amargo amor opiou de ócios minhas horas.
Ah! que esta quilha rompa! Ah! que me engula o oceano!
Da Europa a água que eu quero é só o charco
Negro e gelado onde, ao crepúsculo violeta,
Um menino tristonho arremesse o seu barco
Trémulo como a asa de uma borboleta.
No meu torpor, não posso, ó vagas, as esteiras
Ultrapassar das naves cheias de algodões,
Nem vencer a altivez das velas e bandeiras,
Nem navegar sob o olho torvo dos pontões.
Jean-Arthur Rimbaud
(Tradução: Augusto de Campos)
O vento abençoou minhas manhãs marítimas.
Mais leve que uma rolha eu dancei nos lençóis
Das ondas a rolar atrás de suas vítimas,
Dez noites, sem pensar nos olhos dos faróis!
Mais doce que as maçãs parecem aos pequenos,
A água verde infiltrou-se no meu casco ao léu
E das manchas azulejantes dos venenos
E vinhos me lavou, livre de leme e arpéu.
Então eu mergulhei nas águas do poema
Do Mar, sarcófago de estrelas, latescente,
Devorando os azuis, onde às vezes - dilema
Lívido - um afogado afunda lentamente;
Onde, tingindo azulidades com quebrantos
E ritmos lentos sob o rutilante albor,
Mais fortes que o álcool, mas vastas que os nossos prantos,
Fermentam de amargura as rubéolas do amor!
Conheço os céus crivados de clarões, as trombas,
Ressacas e marés: conheço o entardecer,
A aurora em explosão como um bando de pombas,
E algumas vezes vi o que o homem quis ver!
Eu vi o sol baixar, sujo de horrores místicos,
Iluminando os longos túmulos glaciais;
Com atrizes senis em palcos cabalísticos,
Ondas rolando ao longe os frémitos de umbrais!
Sonhei que a noite verde em neves alvacentas
Beijava, lenta, o olhar dos mares com mil coros,
Soube a circulação das seivas suculentas
E o acordar louro e azul dos fósforos canoros!
Por meses eu segui, tropel de vacarias
Histéricas, o mar estuprando as areias,
Sem esperar que aos pés de ouro das Marias
Esmorecesse o ardor dos Oceanos sem peias.
Cheguei a visitar as Flóridas perdidas
Com olhos de jaguar florindo em epidermes
De homens! Arco-íris tensos como bridas
No horizonte do mar de glaucos paquidermes.
Vi fermentarem pântanos imensos, ansas
Onde apodrecem Liviatãs distantes!
O desmoronamento da água nas bonanças
E abismos a se abrir no caos, cataratantes!
Geleiras, sóis de prata, ondas e céus cadentes!
Naufrágios abissais na tumba dos negrumes,
Onde, pasto de insectos, tombam as serpentes
Dos curvos cipoais, com pérfidos perfumes!
Ah! Se as crianças vissem o dourar das ondas,
Áureos peixes do mar azul, peixes cantantes...
- Espumas em flor ninaram minhas rondas
E as brisas da ilusão me alaram por instantes.
Mártir de pólos e de zonas misteriosas,
O mar a soluçar cobria os meus artelhos
Com flores fantasmais de pálidas ventosas
E eu, como uma mulher, me punha de joelhos...
Quase ilha a balouçar entre borras e brados
De gralhas tagarelas com olhar de gelo,
Eu vogava, e por minha rede os afogados
Passavam, a dormir, descendo a contrapelo.
Mas eu, barco perdido em baías e danças,
Lançado no ar sem pássaros pela torrente,
De quem os Monitores e os arpões das Hansas
Não teriam pescado o casco de água ardente;
Livre, fumando em meio às virações inquietas,
Eu que furava o céu violáceo como um muro
Que mancham, acepipe raro aos bons poetas,
Líquens de sol e vómitos de azul escuro;
Prancha louca a correr em lúnulas e faíscas
E hipocampos de breu, numa escolta de espuma,
Quando os sóis estivais estilhaçavam em riscas
O céu ultramarino e seus funis de bruma;
Eu que tremia ouvindo, ao longe a estertorar,
O cio dos Behemóts e dos Maeltroms febris,
Fiandeiro sem fim dos marasmos do mar,
Anseio pela Europa e os velhos peitoris!
Eu vi os arquipélagos astrais! e as ilhas
Que o delírio dos céus desvela ao viajor;
- É nas noites sem cor que te esqueces e te ilhas,
Milhão de aves de ouro, ó futuro Vigor?
Sim, chorar eu chorei! São mornas as Auroras!
Toda lua é cruel e todo sol, engano:
O amargo amor opiou de ócios minhas horas.
Ah! que esta quilha rompa! Ah! que me engula o oceano!
Da Europa a água que eu quero é só o charco
Negro e gelado onde, ao crepúsculo violeta,
Um menino tristonho arremesse o seu barco
Trémulo como a asa de uma borboleta.
No meu torpor, não posso, ó vagas, as esteiras
Ultrapassar das naves cheias de algodões,
Nem vencer a altivez das velas e bandeiras,
Nem navegar sob o olho torvo dos pontões.
Jean-Arthur Rimbaud
(Tradução: Augusto de Campos)
Jean Arthur Rimbaud
Jean Nicholas Arthur Rimbaud nasceu em Charleville, (Ardennes, Norte de França), a 20 de Outubro de 1854.
Aluno brilhante, considerado desde cedo menino-prodígio, que se distinguia na composição de versos latinos, foi encorajado nas suas primeiras experiências poéticas pelo seu professor de retórica.
Em 1869 ganhou o seu primeiro prémio literário, no Concurso Académico de Douai, um concurso de versos latinos. Escreveu o seu primeiro poema conhecido em francês em Dezembro desse ano: "Les Etrennes des Orphelins".
Em 1870 entrou para a escola Georges Izambard. Nesta altura escreveu uma carta ao poeta Théodore de Banville, apresentando-lhes os poemas "Sensation", "Ophélie" e "Credo in Unam".
Um mês após o início da Guerra Franco-Prussiana Rimbaud fugiu de casa e foi de comboio para Paris. Foi preso à chegada, e saiu graças à intervenção de Izambard, que o levou de volta a Charleville. Em Outubro fugiu novamente, a pé, passando por Fumay, Charleroi e Bruxelas até chegar a Douai. Durante esta jornada escreveu os poemas "Au Cabaret Vert" e "Ma Boheme".
No ano seguinte fugiu de novo, de comboio, para Paris. Voltou a pé para Charleville. Em Março começou a colaborar no jornal Le Progrès des Ardennes. Nesta altura escreveu a Paul Verlaine "Lettre du Voyant", e compôs paralelamente "Le Bateau Ivre".
Foi para Paris, onde foi acolhido por Verlaine e bem recebido pelos poetas parisienses com o seu "Le Bateau Ivre".
Verlaine e Rimbaud viajaram juntos e foram presos temporariamente em Arras, por "conduta suspeita". Depois foram para Londres e três meses mais tarde Rimbaud voltou a Charleville, a pedido da sua mãe.
Em 1873 Verlaine, doente, chamou Rimbaud a Londres, porém, afastaram-se uns meses depois. Rimbaud, seguindo Verlaine que tinha viajado para Bruxelas, levou dois tiros de Verlaine durante uma discussão, que lesaram o seu punho esquerdo. Rimbaud voltou a Paris, e antes de partir, denunciou Verlaine à polícia. Verlaine foi preso. Após o incidente, Rimbaud iniciou o poema "Une Saison en Enfer".
Em 1874 Rimbaud começou a escrever as "Iluminacões", quando viajava com o poeta Germain Noveau para Londres. Noveau retornou a Franca e Rimbaud, doente, recebeu a visita da mãe e da irmã Vitalie. Publicou em Novembro o anúncio: "Parisiense de altos conhecimentos literários e linguísticos e excelente conversação ficaria contente em acompanhar um gentleman ou uma família que desejem viajar aos países do Sul ou do Oriente". Na sequência deste anúncio, viajou para Stuttgart e trabalhou como preceptor. Verlaine foi solto, e procurou Rimbaud, com o intuito, em vão, de o converter ao catolicismo. Entretanto, Rimbaud foi a pé para Itália. Retornou a Charleville doente, onde passou a maior parte do Inverno. Em Dezembro, morria a sua irmã Vitalie.
Em 1876 viajou para Viena onde foi assaltado e acabou sendo expulso do país. No mês seguinte entrou no exército colonial holandês e embarcou para Java, onde desertou e fugiu. Retornou a Charleville no último dia do ano.
Em 1877 viajou pela Suécia e pela Dinamarca, trabalhando como intérprete de um circo de Hamburgo.
No ano seguinte foi a Génova, de onde embarcou meses depois para Alexandria.
Retornou novamente à casa da família em 1879, doente, para se restabelecer de tifo. Após uma melhora, tornou-se comerciante em África. Viajou então pelo Egipto, pela Etiópia, atravessou o deserto a cavalo durante 20 dias e em 1882, foi o primeiro europeu a percorrer o rio Ugadine, seguindo a jornada como negociante da empresa onde trabalhava, que o encarregara de explorar o deserto da Somália.
Em Franca, em 1885, seis poemas inéditos seus foram publicados por Verlaine, entre eles "Le Bateau Ivre". Rimbaud juntou-se a Pierre Labatut, no final do ano, no comércio de tráfico de armas.
As "Iluminações" foram publicadas por Verlaine em 1886 na revista Vogue, que apresentou o autor como "o falecido Arthur Rimbaud".
Entre 1888 e 1890, Rimbaud iniciou novamente uma jornada, comandando uma caravana de 200 camelos e 3 mil fuzis, com destino ao líder rebelde Makonnen. Nesta época trabalhava como director de uma feitoria. Em Julho de 1890 foi surpreendido com uma carta da revista Le France Moderne que pedia a sua colaboração literária.
Em Abril de 1891 foi internado em Áden, na decorrência de um inchaço na perna direita. Quatro meses depois, retornou a Franca, onde convalesceu num hospital em Marselha. A perna foi-lhe amputada, após diagnóstico de cancro. Fez uma curta viagem com a sua irmã Isabelle a Marselha e três meses depois voltou a ser internado, morrendo em 10 de Novembro. Foi sepultado quatro dias depois em Charleville.
Rimbaud inspirou o movimento dos "decadentes", depois simbolistas, surrealistas. Na poesia de Rimbaud as ideias eram indicadas pela sugestão indirecta dos símbolos, pretendendo expressar emoções vagas e obscuras, que ele acreditava existirem em nós mesmos e que não se situavam no campo da realidade lógica ou da inteligência.
É de facto notável um adolescente que compôs, entre os 15 e 19 anos, poemas tão fulgurantes e visionários, de tão grande beleza.
Je ne parlerai pas,
je ne penserai rien.
Mais un amour immense
entrera dans mon âme.
(trecho de "Sensation", 1870)
Aluno brilhante, considerado desde cedo menino-prodígio, que se distinguia na composição de versos latinos, foi encorajado nas suas primeiras experiências poéticas pelo seu professor de retórica.
Em 1869 ganhou o seu primeiro prémio literário, no Concurso Académico de Douai, um concurso de versos latinos. Escreveu o seu primeiro poema conhecido em francês em Dezembro desse ano: "Les Etrennes des Orphelins".
Em 1870 entrou para a escola Georges Izambard. Nesta altura escreveu uma carta ao poeta Théodore de Banville, apresentando-lhes os poemas "Sensation", "Ophélie" e "Credo in Unam".
Um mês após o início da Guerra Franco-Prussiana Rimbaud fugiu de casa e foi de comboio para Paris. Foi preso à chegada, e saiu graças à intervenção de Izambard, que o levou de volta a Charleville. Em Outubro fugiu novamente, a pé, passando por Fumay, Charleroi e Bruxelas até chegar a Douai. Durante esta jornada escreveu os poemas "Au Cabaret Vert" e "Ma Boheme".
No ano seguinte fugiu de novo, de comboio, para Paris. Voltou a pé para Charleville. Em Março começou a colaborar no jornal Le Progrès des Ardennes. Nesta altura escreveu a Paul Verlaine "Lettre du Voyant", e compôs paralelamente "Le Bateau Ivre".
Foi para Paris, onde foi acolhido por Verlaine e bem recebido pelos poetas parisienses com o seu "Le Bateau Ivre".
Verlaine e Rimbaud viajaram juntos e foram presos temporariamente em Arras, por "conduta suspeita". Depois foram para Londres e três meses mais tarde Rimbaud voltou a Charleville, a pedido da sua mãe.
Em 1873 Verlaine, doente, chamou Rimbaud a Londres, porém, afastaram-se uns meses depois. Rimbaud, seguindo Verlaine que tinha viajado para Bruxelas, levou dois tiros de Verlaine durante uma discussão, que lesaram o seu punho esquerdo. Rimbaud voltou a Paris, e antes de partir, denunciou Verlaine à polícia. Verlaine foi preso. Após o incidente, Rimbaud iniciou o poema "Une Saison en Enfer".
Em 1874 Rimbaud começou a escrever as "Iluminacões", quando viajava com o poeta Germain Noveau para Londres. Noveau retornou a Franca e Rimbaud, doente, recebeu a visita da mãe e da irmã Vitalie. Publicou em Novembro o anúncio: "Parisiense de altos conhecimentos literários e linguísticos e excelente conversação ficaria contente em acompanhar um gentleman ou uma família que desejem viajar aos países do Sul ou do Oriente". Na sequência deste anúncio, viajou para Stuttgart e trabalhou como preceptor. Verlaine foi solto, e procurou Rimbaud, com o intuito, em vão, de o converter ao catolicismo. Entretanto, Rimbaud foi a pé para Itália. Retornou a Charleville doente, onde passou a maior parte do Inverno. Em Dezembro, morria a sua irmã Vitalie.
Em 1876 viajou para Viena onde foi assaltado e acabou sendo expulso do país. No mês seguinte entrou no exército colonial holandês e embarcou para Java, onde desertou e fugiu. Retornou a Charleville no último dia do ano.
Em 1877 viajou pela Suécia e pela Dinamarca, trabalhando como intérprete de um circo de Hamburgo.
No ano seguinte foi a Génova, de onde embarcou meses depois para Alexandria.
Retornou novamente à casa da família em 1879, doente, para se restabelecer de tifo. Após uma melhora, tornou-se comerciante em África. Viajou então pelo Egipto, pela Etiópia, atravessou o deserto a cavalo durante 20 dias e em 1882, foi o primeiro europeu a percorrer o rio Ugadine, seguindo a jornada como negociante da empresa onde trabalhava, que o encarregara de explorar o deserto da Somália.
Em Franca, em 1885, seis poemas inéditos seus foram publicados por Verlaine, entre eles "Le Bateau Ivre". Rimbaud juntou-se a Pierre Labatut, no final do ano, no comércio de tráfico de armas.
As "Iluminações" foram publicadas por Verlaine em 1886 na revista Vogue, que apresentou o autor como "o falecido Arthur Rimbaud".
Entre 1888 e 1890, Rimbaud iniciou novamente uma jornada, comandando uma caravana de 200 camelos e 3 mil fuzis, com destino ao líder rebelde Makonnen. Nesta época trabalhava como director de uma feitoria. Em Julho de 1890 foi surpreendido com uma carta da revista Le France Moderne que pedia a sua colaboração literária.
Em Abril de 1891 foi internado em Áden, na decorrência de um inchaço na perna direita. Quatro meses depois, retornou a Franca, onde convalesceu num hospital em Marselha. A perna foi-lhe amputada, após diagnóstico de cancro. Fez uma curta viagem com a sua irmã Isabelle a Marselha e três meses depois voltou a ser internado, morrendo em 10 de Novembro. Foi sepultado quatro dias depois em Charleville.
Rimbaud inspirou o movimento dos "decadentes", depois simbolistas, surrealistas. Na poesia de Rimbaud as ideias eram indicadas pela sugestão indirecta dos símbolos, pretendendo expressar emoções vagas e obscuras, que ele acreditava existirem em nós mesmos e que não se situavam no campo da realidade lógica ou da inteligência.
É de facto notável um adolescente que compôs, entre os 15 e 19 anos, poemas tão fulgurantes e visionários, de tão grande beleza.
Je ne parlerai pas,
je ne penserai rien.
Mais un amour immense
entrera dans mon âme.
(trecho de "Sensation", 1870)
Hoje nasceu...
20 de Outubro de 1854
Jean Arthur Rimbaud
Poeta francês
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Biografia
Poemas: Le Bateau Ivre
quinta-feira, 19 de outubro de 2006
Descanso na Fuga para o Egipto
A Caminho acaba de publicar um novo livro de poesia que chegará às livrarias a 26 de Outubro. Trata-se de “Descanso na Fuga para o Egipto” de Paulo Teixeira. A antologia que agora é editada reúne obras de uma das mais seguras vozes da poesia portuguesa das duas últimas décadas. Afirmando uma poesia que se assume como depositária de uma herança de vários séculos e latitudes, este Descanso na Fuga Para o Egipto abre com poemas do livro As Imaginações da Verdade (1985) e encerra com Orbe (2005).
Mediterrâneo
Eis as vésperas do que te espera.
Busca como Shelley os cânones passados,
os nomes de Átila e Aníbal
no oráculo justo e breve do poema.
Escreve o texto da alvorada no romano
vaso do papel e lança-o como um salva-vidas
sobre a extensão branca dos oceanos
até ao outro lado da terra.
Onde te espera o calor desses dedos
passeando outrora, desde Rodes até Sagunto,
sobre o mapa já lívido das injúrias terrenas.
Paulo Teixeira nasceu em Lourenço Marques, actual Maputo (Moçambique) em 1962.
Licenciou-se em Geografia e Planeamento Regional pela Universidade Nova de Lisboa, sendo actualmente professor do ensino secundário. Como poeta, pertence a uma geração revelada durante a década de 80, afirmando-se rapidamente como uma das suas vozes poéticas mais importantes.
A poesia de Paulo Teixeira caracteriza-se pela ambivalência crepuscular em relação a uma história civilizacional utilizada como vasto património de que o fazer poético se alimenta. Entendendo-nos como "herdeiros do mundo", o autor constrói uma poesia que se assume como depositária de uma herança de vários séculos e várias latitudes, num registo discursivo e conceptual que busca no passado histórico, mítico e místico, na tradição artística e literária, imagens onde se reflecte a devastação e a rarefacção do tempo presente.
Mar
Na melancolia de teus olhos
Eu sinto a noite se inclinar
E ouço as cantigas antigas
Do mar.
Nos frios espaços de teus braços
Eu me perco em carícias de água
E durmo escutando em vão
O silêncio.
E anseio em teu misterioso seio
Na atonia das ondas redondas
Náufrago entregue ao fluxo forte
Da morte.
Vinicius de Moraes
Na voz de Luís Gaspar:
Eu sinto a noite se inclinar
E ouço as cantigas antigas
Do mar.
Nos frios espaços de teus braços
Eu me perco em carícias de água
E durmo escutando em vão
O silêncio.
E anseio em teu misterioso seio
Na atonia das ondas redondas
Náufrago entregue ao fluxo forte
Da morte.
Vinicius de Moraes
Na voz de Luís Gaspar:
Vinicius de Moraes
Vinicius de Moraes nasceu a 19 de Outubro de 1913.
Em 1929 fez um bacharelato em Letras e em 1933 formou-se em Direito e terminou o Curso de Oficial de Reserva. Estimulado por Otávio de Faria, publicou o seu primeiro livro, “O caminho para a distância”.
Em 1935 publicou “Forma e exegese”, com o qual ganhou o prémio Felipe d’Oliveira.
Em 1936 publicou, em separata, o poema "Ariana, a mulher". Conheceu nesta altura Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, dos quais se tornou amigo.
Em 1938 publicou novos poemas e foi agraciado com a primeira bolsa do Conselho Britânico para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford, para onde partiu em Agosto do mesmo ano. Trabalhou como assistente do programa brasileiro da BBC. Conheceu, em casa de Augusto Frederico Schimidt, o poeta e músico Jayme Ovalle, de quem se tornou amigo.
Regressou de Inglaterra no final de 1939, devido à eclosão da II Grande Guerra e em Lisboa encontrou o seu amigo Oswald de Andrade com quem viajou para o Brasil.
Em 1940 passou uma longa temporada em São Paulo, onde fez amizade com Mário de Andrade.
Em 1941 começou a colaborar no jornal A Manhã, como crítico cinematográfico e a colaborar no Suplemento Literário ao lado de Rineiro Couto, Manuel Bandeira, Cecília Meireles e Afonso Arinos de Melo Franco, sob a orientação de Múcio Leão e Cassiano Ricardo.
Em 1942, a convite do então prefeito Juscelino Kubitschek, chefiou uma caravana de escritores brasileiros a Belo Horizonte, onde fez amizade com Otto Lara Rezende, Fernando Sabino, Hélio Pelegrino e Paulo Mendes Campos. Iniciou, com os seus amigos Rubem Braga e Moacyr Werneck de Castro, a roda literária do Café Vermelhinho, à qual se misturaram a maioria dos jovens arquitectos e artistas plásticos da época, como Oscar Niemeyer, Carlos Leão, Afonso Reidy, Jorge Moreira, José Reis, Alfredo Ceschiatti, Santa Rosa, Pancetti, Augusto Rodrigues, Djanira, Bruno Giorgi. Conheceu e tornou-se amigo da escritora Argentina Maria Rosa Oliver, através da qual conheceu Gabriela Mistral. Fez uma extensa viagem ao Nordeste do Brasil acompanhando o escritor americano Waldo Frank, a qual mudou radicalmente a sua visão política, tornando-se um antifascista convicto. Na estada em Recife, conheceu o poeta João Cabral de Melo Neto, de quem se tornaria, depois, grande amigo.
Em 1943 publicou as suas “Cinco elegias”, numa edição encomendada por Manuel Bandeira, Aníbal Machado e Otávio de Faria e ingressou, por concurso, na carreira diplomática.
Em 1944 dirigiu o Suplemento Literário de O Jornal, onde lançou, entre outros, Oscar Niemeyer, Pedro Nava, Marcelo Garcia, Francisco de Sá Pires, Carlos Leão e Lúcio Rangel, em colunas assinadas, e publicou desenhos de artistas plásticos até então pouco conhecidos, como Carlos Scliar, Athos Bulcão, Alfredo Ceschiatti, Eros (Martim) Gonçalves, Arpad Czenes e Maria Helena Vieira da Silva. Colaborou entretanto em vários jornais e revistas, como colunista e crítico de cinema. Fez amizade, nesta altura, com o poeta Pablo Neruda.
Em 1946 partiu para Los Angeles, como vice-cônsul. Ali permaneceu cinco anos sem voltar ao Brasil. Publicou em edição de luxo, ilustrada por Carlos Leão, o livro “Poemas, sonetos e baladas”.
Em 1947, em Los Angeles, estudou cinema com Orson Welles e Gregg Toland. Lançou, com Alex Viany, a revista Film.
Em 1950 foi ao México visitar o seu amigo Pablo Neruda, gravemente enfermo. Ali conheceu o pintor David Siqueiros e reencontrou o seu grande amigo, o pintor Di Cavalcanti.
Em 1951, de volta ao Brasil, começou a colaborar no jornal Última Hora, a convite de Samuel Wainer, como cronista diário e posteriormente crítico de cinema.
Em 1952 foi nomeado delegado no festival de Punta Del Leste, fazendo paralelamente a sua cobertura para o Última Hora. Partiu logo depois para a Europa, para estudar a organização dos festivais de cinema de Cannes, Berlim, Locarno e Veneza, no sentido da realização dos Festival de Cinema de São Paulo. Em Paris, conheceu o seu tradutor francês, Jean Georges Rueff, com quem trabalhou, em Estrasburgo, na tradução de suas “Cinco elegias”.
No ano seguinte colaborou no tablóide semanário Flan, de Última Hora, sob direcção de Joel Silveira. Apareceu nesta alttura a edição francesa das Cinq élégies, em edição de Pierre Seghers. Entretanto, fez amizade com o poeta cubano Nicolás Guillén e compôs o seu primeiro samba, música e letra, "Quando tu passas por mim". Fez crónicas diárias para o jornal A Vanguarda e partiu para Paris como segundo secretário de Embaixada.
Em 1954 saiu a primeira edição da sua “Antologia Poética”. A revista Anhembi publicou a sua peça “Orfeu da Conceição”, premiada no concurso de teatro do IV Centenário do Estado de São Paulo.
Em 1955 compôs em Paris uma série de canções de câmara com o maestro Cláudio Santoro. Começou a trabalhar para o produtor Sasha Gordine, no roteiro do filme Orfeu Negro.
Em 1956 colaborou no quinzenário Para Todos a convite do seu amigo Jorge Amado, em cujo primeiro número publicou o poema "O operário em construção". Paralelamente aos trabalhos da produção do filme Orfeu Negro, resolveu encenar a sua peça “Orfeu da Conceição”. Convidou Antônio Carlos Jobim para fazer a música do espectáculo, iniciando com ele a parceria que, logo depois, com a inclusão do cantor e violonista João Gilberto, daria início ao movimento de renovação da música popular brasileira a que se convencionou chamar bossa nova. Retornou a Paris no fim do ano.
Em 1957 foi transferido da Embaixada em Paris para a Delegação do Brasil junto à UNESCO. No fim do ano foi para Montevidéu, regressando depois ao Brasil. Publicou a primeira edição do seu “Livro de Sonetos”.
Em 1958 partiu para Montevidéu. Saiu o LP “Canção do Amor Demais”, de músicas suas com Antônio Carlos Jobim, cantadas por Elizete Cardoso. No disco ouvia-se, pela primeira vez, a batida da bossa nova, no violão de João Gilberto, que acompanhava a cantora em algumas faixas, entre as quais o samba "Chega de Saudade", considerado o marco inicial do movimento.
Em 1959 saiu o Lp “Por Toda Minha Vida”, com canções suas e de Jobim, interpretadas pela cantora Lenita Bruno. O filme "Orfeu negro" ganhou a Palme d’Or do Festival de Cannes e o Oscar, de Hollywood, como melhor filme estrangeiro do ano. Foi publicado neste ano o seu livro “Novos poemas II”.
Em 1960 saiu a segunda edição da sua “Antologia Poética”, a edição popular da peça “Orfeu da Conceição”, e “Recette de Femme et autres poèmes”, tradução de Jean-Georges Rueff.
Em 1961 começou a compor com Carlos Lira e Pixinguinha.
Apareceu Orfeu Negro, em tradução italiana de P.A. Jannini, em Milão.
Em 1962 começou a compôr com Baden Powell, dando inicio à série de afro-sambas, entre os quais, "Berimbau" e "Canto de Ossanha". Compôs, com música de Carlos Lyra, as canções da sua comédia musicada “Pobre menina rica”. Em Agosto fez um espectáculo com Antônio Carlos Jobim e João Gilbert, onde foram lançados pela primeira vez grandes sucessos internacionais como "Garota de Ipanema" e o "Samba da bênção". Fez também um espectáculo com Carlos Lyra, para apresentar “Pobre menina rica” e onde foi lançada a cantora Nara Leão. Compôs com Ari Barroso as últimas canções do grande compositor popular, entre as quais "Rancho das namoradas". Apareceu nesta altura a primeira edição de “Para viver um grande amor”, livro de crónicas e poemas. Gravou, como cantor, o seu disco com a actriz e cantora Odete Lara.
Em 1963 começou a compôr com Edu Lobo.
Em 1964 colaborou com crónicas semanais para a revista Fatos e Fotos, assinando paralelamente crónicas sobre música popular para o Diário Carioca. Começou a compôr com Francis Hime. Fez um espectáculo de grande sucesso com o compositor e cantor Dorival Caymmi, na boate Zum-Zum, onde lançou o Quarteto em Cy. Do show foi feito um LP.
Em 1965 saiu “Cordélia e o peregrino”. Ganhou o primeiro e o segundo lugares do I Festival de Música Popular de São Paulo, da TV Record, com canções em parceria com Edu Lobo e Baden Powell. Começou a trabalhar com o director Leon Hirszman, do Cinema Novo, no roteiro do filme Garota de Ipanema.
Em 1966 foram feitos documentários sobre o poeta pelas televisões americana, alemã, italiana e francesa. Apareceu o seu livro de crónicas “Para uma menina com uma flor”. O seu "Samba da bênção", em parceria com Baden Powell, foi incluído no filme Un homme… une femme, vencedor do Festival de Cannes do mesmo ano.
Em 1967 foram publicadas a 6ª edição da sua “Antologia poética” e a 2ª do seu "Livro de sonetos” (aumentada).
Em 1968 foi publicada a primeira edição de sua “Obra poética”. Poemas seus foram traduzidos para o italiano por Ungaretti.
Em 1970 iniciou a sua parceria com Toquinho.
Em 1973 publicou "A Pablo Neruda".
Em 1979, voltando de uma viagem à Europa, sofreu um derrame cerebral no avião. Perderam-se, na ocasião, os originais de "Roteiro lírico e sentimental da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro".
Morreu no dia 9 de Julho, de edema pulmonar, em sua casa, na Gávea, na companhia de Toquinho e da sua última mulher.
Extraviaram-se os originais do seu livro "O dever e o haver".
Em 1929 fez um bacharelato em Letras e em 1933 formou-se em Direito e terminou o Curso de Oficial de Reserva. Estimulado por Otávio de Faria, publicou o seu primeiro livro, “O caminho para a distância”.
Em 1935 publicou “Forma e exegese”, com o qual ganhou o prémio Felipe d’Oliveira.
Em 1936 publicou, em separata, o poema "Ariana, a mulher". Conheceu nesta altura Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, dos quais se tornou amigo.
Em 1938 publicou novos poemas e foi agraciado com a primeira bolsa do Conselho Britânico para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford, para onde partiu em Agosto do mesmo ano. Trabalhou como assistente do programa brasileiro da BBC. Conheceu, em casa de Augusto Frederico Schimidt, o poeta e músico Jayme Ovalle, de quem se tornou amigo.
Regressou de Inglaterra no final de 1939, devido à eclosão da II Grande Guerra e em Lisboa encontrou o seu amigo Oswald de Andrade com quem viajou para o Brasil.
Em 1940 passou uma longa temporada em São Paulo, onde fez amizade com Mário de Andrade.
Em 1941 começou a colaborar no jornal A Manhã, como crítico cinematográfico e a colaborar no Suplemento Literário ao lado de Rineiro Couto, Manuel Bandeira, Cecília Meireles e Afonso Arinos de Melo Franco, sob a orientação de Múcio Leão e Cassiano Ricardo.
Em 1942, a convite do então prefeito Juscelino Kubitschek, chefiou uma caravana de escritores brasileiros a Belo Horizonte, onde fez amizade com Otto Lara Rezende, Fernando Sabino, Hélio Pelegrino e Paulo Mendes Campos. Iniciou, com os seus amigos Rubem Braga e Moacyr Werneck de Castro, a roda literária do Café Vermelhinho, à qual se misturaram a maioria dos jovens arquitectos e artistas plásticos da época, como Oscar Niemeyer, Carlos Leão, Afonso Reidy, Jorge Moreira, José Reis, Alfredo Ceschiatti, Santa Rosa, Pancetti, Augusto Rodrigues, Djanira, Bruno Giorgi. Conheceu e tornou-se amigo da escritora Argentina Maria Rosa Oliver, através da qual conheceu Gabriela Mistral. Fez uma extensa viagem ao Nordeste do Brasil acompanhando o escritor americano Waldo Frank, a qual mudou radicalmente a sua visão política, tornando-se um antifascista convicto. Na estada em Recife, conheceu o poeta João Cabral de Melo Neto, de quem se tornaria, depois, grande amigo.
Em 1943 publicou as suas “Cinco elegias”, numa edição encomendada por Manuel Bandeira, Aníbal Machado e Otávio de Faria e ingressou, por concurso, na carreira diplomática.
Em 1944 dirigiu o Suplemento Literário de O Jornal, onde lançou, entre outros, Oscar Niemeyer, Pedro Nava, Marcelo Garcia, Francisco de Sá Pires, Carlos Leão e Lúcio Rangel, em colunas assinadas, e publicou desenhos de artistas plásticos até então pouco conhecidos, como Carlos Scliar, Athos Bulcão, Alfredo Ceschiatti, Eros (Martim) Gonçalves, Arpad Czenes e Maria Helena Vieira da Silva. Colaborou entretanto em vários jornais e revistas, como colunista e crítico de cinema. Fez amizade, nesta altura, com o poeta Pablo Neruda.
Em 1946 partiu para Los Angeles, como vice-cônsul. Ali permaneceu cinco anos sem voltar ao Brasil. Publicou em edição de luxo, ilustrada por Carlos Leão, o livro “Poemas, sonetos e baladas”.
Em 1947, em Los Angeles, estudou cinema com Orson Welles e Gregg Toland. Lançou, com Alex Viany, a revista Film.
Em 1950 foi ao México visitar o seu amigo Pablo Neruda, gravemente enfermo. Ali conheceu o pintor David Siqueiros e reencontrou o seu grande amigo, o pintor Di Cavalcanti.
Em 1951, de volta ao Brasil, começou a colaborar no jornal Última Hora, a convite de Samuel Wainer, como cronista diário e posteriormente crítico de cinema.
Em 1952 foi nomeado delegado no festival de Punta Del Leste, fazendo paralelamente a sua cobertura para o Última Hora. Partiu logo depois para a Europa, para estudar a organização dos festivais de cinema de Cannes, Berlim, Locarno e Veneza, no sentido da realização dos Festival de Cinema de São Paulo. Em Paris, conheceu o seu tradutor francês, Jean Georges Rueff, com quem trabalhou, em Estrasburgo, na tradução de suas “Cinco elegias”.
No ano seguinte colaborou no tablóide semanário Flan, de Última Hora, sob direcção de Joel Silveira. Apareceu nesta alttura a edição francesa das Cinq élégies, em edição de Pierre Seghers. Entretanto, fez amizade com o poeta cubano Nicolás Guillén e compôs o seu primeiro samba, música e letra, "Quando tu passas por mim". Fez crónicas diárias para o jornal A Vanguarda e partiu para Paris como segundo secretário de Embaixada.
Em 1954 saiu a primeira edição da sua “Antologia Poética”. A revista Anhembi publicou a sua peça “Orfeu da Conceição”, premiada no concurso de teatro do IV Centenário do Estado de São Paulo.
Em 1955 compôs em Paris uma série de canções de câmara com o maestro Cláudio Santoro. Começou a trabalhar para o produtor Sasha Gordine, no roteiro do filme Orfeu Negro.
Em 1956 colaborou no quinzenário Para Todos a convite do seu amigo Jorge Amado, em cujo primeiro número publicou o poema "O operário em construção". Paralelamente aos trabalhos da produção do filme Orfeu Negro, resolveu encenar a sua peça “Orfeu da Conceição”. Convidou Antônio Carlos Jobim para fazer a música do espectáculo, iniciando com ele a parceria que, logo depois, com a inclusão do cantor e violonista João Gilberto, daria início ao movimento de renovação da música popular brasileira a que se convencionou chamar bossa nova. Retornou a Paris no fim do ano.
Em 1957 foi transferido da Embaixada em Paris para a Delegação do Brasil junto à UNESCO. No fim do ano foi para Montevidéu, regressando depois ao Brasil. Publicou a primeira edição do seu “Livro de Sonetos”.
Em 1958 partiu para Montevidéu. Saiu o LP “Canção do Amor Demais”, de músicas suas com Antônio Carlos Jobim, cantadas por Elizete Cardoso. No disco ouvia-se, pela primeira vez, a batida da bossa nova, no violão de João Gilberto, que acompanhava a cantora em algumas faixas, entre as quais o samba "Chega de Saudade", considerado o marco inicial do movimento.
Em 1959 saiu o Lp “Por Toda Minha Vida”, com canções suas e de Jobim, interpretadas pela cantora Lenita Bruno. O filme "Orfeu negro" ganhou a Palme d’Or do Festival de Cannes e o Oscar, de Hollywood, como melhor filme estrangeiro do ano. Foi publicado neste ano o seu livro “Novos poemas II”.
Em 1960 saiu a segunda edição da sua “Antologia Poética”, a edição popular da peça “Orfeu da Conceição”, e “Recette de Femme et autres poèmes”, tradução de Jean-Georges Rueff.
Em 1961 começou a compor com Carlos Lira e Pixinguinha.
Apareceu Orfeu Negro, em tradução italiana de P.A. Jannini, em Milão.
Em 1962 começou a compôr com Baden Powell, dando inicio à série de afro-sambas, entre os quais, "Berimbau" e "Canto de Ossanha". Compôs, com música de Carlos Lyra, as canções da sua comédia musicada “Pobre menina rica”. Em Agosto fez um espectáculo com Antônio Carlos Jobim e João Gilbert, onde foram lançados pela primeira vez grandes sucessos internacionais como "Garota de Ipanema" e o "Samba da bênção". Fez também um espectáculo com Carlos Lyra, para apresentar “Pobre menina rica” e onde foi lançada a cantora Nara Leão. Compôs com Ari Barroso as últimas canções do grande compositor popular, entre as quais "Rancho das namoradas". Apareceu nesta altura a primeira edição de “Para viver um grande amor”, livro de crónicas e poemas. Gravou, como cantor, o seu disco com a actriz e cantora Odete Lara.
Em 1963 começou a compôr com Edu Lobo.
Em 1964 colaborou com crónicas semanais para a revista Fatos e Fotos, assinando paralelamente crónicas sobre música popular para o Diário Carioca. Começou a compôr com Francis Hime. Fez um espectáculo de grande sucesso com o compositor e cantor Dorival Caymmi, na boate Zum-Zum, onde lançou o Quarteto em Cy. Do show foi feito um LP.
Em 1965 saiu “Cordélia e o peregrino”. Ganhou o primeiro e o segundo lugares do I Festival de Música Popular de São Paulo, da TV Record, com canções em parceria com Edu Lobo e Baden Powell. Começou a trabalhar com o director Leon Hirszman, do Cinema Novo, no roteiro do filme Garota de Ipanema.
Em 1966 foram feitos documentários sobre o poeta pelas televisões americana, alemã, italiana e francesa. Apareceu o seu livro de crónicas “Para uma menina com uma flor”. O seu "Samba da bênção", em parceria com Baden Powell, foi incluído no filme Un homme… une femme, vencedor do Festival de Cannes do mesmo ano.
Em 1967 foram publicadas a 6ª edição da sua “Antologia poética” e a 2ª do seu "Livro de sonetos” (aumentada).
Em 1968 foi publicada a primeira edição de sua “Obra poética”. Poemas seus foram traduzidos para o italiano por Ungaretti.
Em 1970 iniciou a sua parceria com Toquinho.
Em 1973 publicou "A Pablo Neruda".
Em 1979, voltando de uma viagem à Europa, sofreu um derrame cerebral no avião. Perderam-se, na ocasião, os originais de "Roteiro lírico e sentimental da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro".
Morreu no dia 9 de Julho, de edema pulmonar, em sua casa, na Gávea, na companhia de Toquinho e da sua última mulher.
Extraviaram-se os originais do seu livro "O dever e o haver".
terça-feira, 17 de outubro de 2006
Pedro Tamen na Casa Fernando Pessoa
A Casa Fernando Pessoa celebra amanhã, 18 de Outubro, pelas 18h30, junto com a editora Oceanos, os 50 anos de vida literária de Pedro Tamen.
Será inaugurada uma exposição bio-bibliográfica sobre o autor (com livros, fotos, críticas literárias e duas esculturas) que ficará patente até 9 de Novembro, no espaço da recepção da Casa Fernando Pessoa.
Na mesma sessão, terá lugar o lançamento de Analogia e Dedos (Oceanos), a mais recente recolha de poemas de Pedro Tamen, que será apresentada por Carla Braga.
António Lobo Antunes, Maria Velho da Costa, Maria do Rosário Pedreira e o pintor Manuel Amado, entre outros, lerão a poesia do homenageado.
António Ramos Rosa
António Victor Ramos Rosa nasceu em Faro, em 17 de Outubro de 1924. Nos anos 50, altura em que era apenas conhecido como crítico literário e ensaísta, foi fundador e/ou co director das revistas literárias "Árvore", "Cassiopeia" e "Cadernos do Meio Dia", tendo também colaborado em diversas publicações francesas, espanholas e brasileiras. É com a publicação do livro "Grito Claro" que se torna conhecido como poeta.
Organizou e prefaciou várias antologias e foi tradutor de algumas obras.
A sua poesia figura em inúmeras antologias estrangeiras, nomeadamente na Europa e América Latina. Estão reflectidos, ao longo da sua obra, desde o subjectivismo inicial ao cultivo puramente objectivo, elementos neo-realistas, surrealistas, neo-clássicos e neo-barrocos.
A sua obra tem sido reconhecida publicamente, e a comprová-lo está a crescente acumulação de prémios relacionados com a sua actividade e os recitais que são realizados com os poemas do autor. O seu nome também já foi apontado como candidato ao Prémio Nobel da Literatura.
Em 1976 recebeu o prémio de tradução da Fondation de Hautvilliers e em 1988 foi-lhe atribuído o Prémio Fernando Pessoa. Recentemente, o Prémio literário do PEN Clube Português (27.ª edição), referente à obra editada em 2005, na modalidade de Poesia foi atribuído a António Ramos Rosa pelo livro "Génese" (Roma Editora).
Obra: O grito claro (Poesia), 1958, Viagem através duma nebulosa (Poesia), 1960, Voz inicial (Poesia), 1960, Sobre o rosto da terra (Poesia), 1961, Poesia, liberdade livre, 1962 ; 1986, Ocupação do espaço (Poesia), 1963, Terrear (Poesia), 1964, Estou vivo e escrevo sol (Poesia), 1966, A construção do corpo (Poesia), 1969, Líricas Portuguesas: 4.ª série, selec., pref. e notas de Ramos Rosa (Antologia Poética), 1969, Nos seus olhos de silêncio (Poesia), 1970, A pedra nua (Poesia), 1972, Horizonte imediato (Antologia), 1974, Não posso adiar o coração. Obra poética, 1º vol (Antologia), 1974, Ciclo do cavalo (Poesia), 1975, Animal olhar. Obra poética, 2º vol. (Antologia), 1975, Respirar a sombra viva. Obra poética, 3º vol. (Antologia), 1975, Boca incompleta (Poesia), 1977, A imagem (Poesia), 1977, A palavra e o lugar (Antologia), 1977, As marcas no deserto (Poesia), 1978 ; 1980, A nuvem sobre a página (Poesia), 1978, Círculo aberto (Poesia), 1979, A poesia moderna e a interrogação do real, 2 vols., 1979 ; 1980, Figurações (Poesia), 1979, Declives (Poesia), 1980, Le domaine enchanté (Poesia), 1980, O incêndio dos aspectos (Poesia), 1980, Figuras: fragmentos (Poesia), 1980, O centro na distância (Poesia), 1981, O incerto exacto (Poesia), 1982, Gravitações (Poesia), 1983, Quando o inexorável (Poesia), 1983, Matéria de amor (Antologia), 1983, Dinâmica subtil (Poesia), 1984, Ficção (Poesia), 1985, Mediadoras (Poesia), 1985, Clareiras (Poesia), 1986, Vinte poemas para Albano Martins (Poesia), 1986, Volante verde (Poesia), 1986, Incisões oblíquas, 1987, No calcanhar do vento (Poesia), 1987, A mão de água e a mão de fogo (Antologia), 1987, O deus nu(lo) (Poesia), 1988, O livro da ignorância (Poesia), 1988, Duas águas: um rio, em col. (Poesia), em colab. com Casimiro de Brito, 1989 ; 2002, Acordes (Poesia), 1989, Três lições materiais (Poesia), 1989, Obra poética, 1º vol. (Antologia), 1989, Estrias (Poesia), 1990, O não e o sim (Poesia), 1990, Facilidade do ar (Poesia), 1990, Oásis branco (Poesia), 1991, A intacta ferida (Poesia), 1991, A rosa esquerda (Poesia), 1991, A parede azul. Estudos sobre poesia e artes plásticas, 1991, Rotações, em col. (Poesia), em colab. com Agripina Costa Marques, Carlos Poças Falcão, 1991, As armas imprecisas (Poesia), 1992, Clamores (Poesia), 1992, Dezassete poemas (Poesia), 1992, Pólen-silêncio (Poesia), 1992, Lâmpadas com alguns insectos (Poesia), 1993, O centro inteiro, em col. (Poesia), em colab. com Agripina Costa Marques, António Magalhães, 1993, O navio da matéria (Poesia), 1994, O teu rosto (Poesia), 1994 ; 2002, Três (Poesia), 1995, À la table du vent, ed. bilingue, trad. Patrick Quillier, pref. Robert Brechon (Poesia), 1995, Delta seguido de Pela primeira vez (Poesia), 1996, Figuras solares (Poesia), 1996, Nomes de ninguém (Poesia), 1997, À mesa do vento seguido de As espirais de Dioniso (Poesia), 1997, Versões/Inversões (Poesia), 1997, Poemas escolhidos, org. Maria Filipe Ramos Rosa (Antologia), 1997, A imagem e o desejo (Poesia), 1998, A imobilidade fulminante (Poesia), 1998, Pátria soberana seguido de Nova ficção (Poesia), 1999 ; 2001, O princípio da água (Poesia), 2000, As palavras (Poesia), 2001, Antologia poética, pref., selec. e bibliog. de Ana Paula Coutinho Mendes (Antologia), 2001, Deambulações oblíquas (Poesia), 2001, O deus da incerta ignorância seguido de Incertezas ou evidências (Poesia), 2001, O aprendiz secreto (Poesia), 2001, Os volúveis diademas (Poesia), 2002, O alvor do mundo. Diálogo poético, em col. (Poesia), 2002, Cada árvore é um ser para ser em nós (Poesia), 2002, O sol é todo o espaço (Poesia), 2002, Os animais do sol e da sombra seguido de O corpo inicial (Poesia), 2003, Meditações metapoéticas, em col. c/ Robert Bréchon (Poesia), 2003, O que não pode ser dito (Poesia), 2003, Relâmpago do nada (Poesia), 2004, O poeta na rua. Antologia portátil, sel. e pref. de Ana Paula Coutinho Neves (Antologia Poética), 2004, Génese seguido de Constelações (Poesia), 2005.
Organizou e prefaciou várias antologias e foi tradutor de algumas obras.
A sua poesia figura em inúmeras antologias estrangeiras, nomeadamente na Europa e América Latina. Estão reflectidos, ao longo da sua obra, desde o subjectivismo inicial ao cultivo puramente objectivo, elementos neo-realistas, surrealistas, neo-clássicos e neo-barrocos.
A sua obra tem sido reconhecida publicamente, e a comprová-lo está a crescente acumulação de prémios relacionados com a sua actividade e os recitais que são realizados com os poemas do autor. O seu nome também já foi apontado como candidato ao Prémio Nobel da Literatura.
Em 1976 recebeu o prémio de tradução da Fondation de Hautvilliers e em 1988 foi-lhe atribuído o Prémio Fernando Pessoa. Recentemente, o Prémio literário do PEN Clube Português (27.ª edição), referente à obra editada em 2005, na modalidade de Poesia foi atribuído a António Ramos Rosa pelo livro "Génese" (Roma Editora).
Obra: O grito claro (Poesia), 1958, Viagem através duma nebulosa (Poesia), 1960, Voz inicial (Poesia), 1960, Sobre o rosto da terra (Poesia), 1961, Poesia, liberdade livre, 1962 ; 1986, Ocupação do espaço (Poesia), 1963, Terrear (Poesia), 1964, Estou vivo e escrevo sol (Poesia), 1966, A construção do corpo (Poesia), 1969, Líricas Portuguesas: 4.ª série, selec., pref. e notas de Ramos Rosa (Antologia Poética), 1969, Nos seus olhos de silêncio (Poesia), 1970, A pedra nua (Poesia), 1972, Horizonte imediato (Antologia), 1974, Não posso adiar o coração. Obra poética, 1º vol (Antologia), 1974, Ciclo do cavalo (Poesia), 1975, Animal olhar. Obra poética, 2º vol. (Antologia), 1975, Respirar a sombra viva. Obra poética, 3º vol. (Antologia), 1975, Boca incompleta (Poesia), 1977, A imagem (Poesia), 1977, A palavra e o lugar (Antologia), 1977, As marcas no deserto (Poesia), 1978 ; 1980, A nuvem sobre a página (Poesia), 1978, Círculo aberto (Poesia), 1979, A poesia moderna e a interrogação do real, 2 vols., 1979 ; 1980, Figurações (Poesia), 1979, Declives (Poesia), 1980, Le domaine enchanté (Poesia), 1980, O incêndio dos aspectos (Poesia), 1980, Figuras: fragmentos (Poesia), 1980, O centro na distância (Poesia), 1981, O incerto exacto (Poesia), 1982, Gravitações (Poesia), 1983, Quando o inexorável (Poesia), 1983, Matéria de amor (Antologia), 1983, Dinâmica subtil (Poesia), 1984, Ficção (Poesia), 1985, Mediadoras (Poesia), 1985, Clareiras (Poesia), 1986, Vinte poemas para Albano Martins (Poesia), 1986, Volante verde (Poesia), 1986, Incisões oblíquas, 1987, No calcanhar do vento (Poesia), 1987, A mão de água e a mão de fogo (Antologia), 1987, O deus nu(lo) (Poesia), 1988, O livro da ignorância (Poesia), 1988, Duas águas: um rio, em col. (Poesia), em colab. com Casimiro de Brito, 1989 ; 2002, Acordes (Poesia), 1989, Três lições materiais (Poesia), 1989, Obra poética, 1º vol. (Antologia), 1989, Estrias (Poesia), 1990, O não e o sim (Poesia), 1990, Facilidade do ar (Poesia), 1990, Oásis branco (Poesia), 1991, A intacta ferida (Poesia), 1991, A rosa esquerda (Poesia), 1991, A parede azul. Estudos sobre poesia e artes plásticas, 1991, Rotações, em col. (Poesia), em colab. com Agripina Costa Marques, Carlos Poças Falcão, 1991, As armas imprecisas (Poesia), 1992, Clamores (Poesia), 1992, Dezassete poemas (Poesia), 1992, Pólen-silêncio (Poesia), 1992, Lâmpadas com alguns insectos (Poesia), 1993, O centro inteiro, em col. (Poesia), em colab. com Agripina Costa Marques, António Magalhães, 1993, O navio da matéria (Poesia), 1994, O teu rosto (Poesia), 1994 ; 2002, Três (Poesia), 1995, À la table du vent, ed. bilingue, trad. Patrick Quillier, pref. Robert Brechon (Poesia), 1995, Delta seguido de Pela primeira vez (Poesia), 1996, Figuras solares (Poesia), 1996, Nomes de ninguém (Poesia), 1997, À mesa do vento seguido de As espirais de Dioniso (Poesia), 1997, Versões/Inversões (Poesia), 1997, Poemas escolhidos, org. Maria Filipe Ramos Rosa (Antologia), 1997, A imagem e o desejo (Poesia), 1998, A imobilidade fulminante (Poesia), 1998, Pátria soberana seguido de Nova ficção (Poesia), 1999 ; 2001, O princípio da água (Poesia), 2000, As palavras (Poesia), 2001, Antologia poética, pref., selec. e bibliog. de Ana Paula Coutinho Mendes (Antologia), 2001, Deambulações oblíquas (Poesia), 2001, O deus da incerta ignorância seguido de Incertezas ou evidências (Poesia), 2001, O aprendiz secreto (Poesia), 2001, Os volúveis diademas (Poesia), 2002, O alvor do mundo. Diálogo poético, em col. (Poesia), 2002, Cada árvore é um ser para ser em nós (Poesia), 2002, O sol é todo o espaço (Poesia), 2002, Os animais do sol e da sombra seguido de O corpo inicial (Poesia), 2003, Meditações metapoéticas, em col. c/ Robert Bréchon (Poesia), 2003, O que não pode ser dito (Poesia), 2003, Relâmpago do nada (Poesia), 2004, O poeta na rua. Antologia portátil, sel. e pref. de Ana Paula Coutinho Neves (Antologia Poética), 2004, Génese seguido de Constelações (Poesia), 2005.
Hoje nasceu...
17 de Outubro de 1924
António Ramos Rosa
Poeta português
Artigos relacionados:
Biografia
Poemas: ”A Palavra”; ”Um caminho de palavras”
Outros artigos:
Prémio do PEN Clube Português 2006
A Rosa Intacta
Grande Prémio de Poesia APE/CTT para António Ramos Rosa
Ramos Rosa candidato ao Prémio Rainha Sofia
Estante de Culto: ”António Ramos Rosa - Antologia Poética”
segunda-feira, 16 de outubro de 2006
Companhia Chão de Oliva encena poemas de Cesário Verde
A companhia de teatro Chão de Oliva, de Sintra, vai levar a palco poemas e cartas de Cesário Verde no espectáculo «Se eu não morresse, nunca!», a estrear a 19 de Outubro.
A partir de poemas e excertos de cartas de Cesário Verde, o encenador João de Mello Alvim criou um espectáculo assente em apenas três actores, que tratam o texto não de uma forma declamatória, mas como se fosse um texto de prosa.
A recolha de textos coube a Manuel Sanches a partir de «O Livro de Cesário Verde», compilado por Silva Pinto e editado em 1887, um ano após a morte do poeta, assim como de novas edições a cargo de Joel Serrão e Teresa Sobral Cunha, que reúne 32 cartas e um texto crítico de Fernando Pessoa.
Esta é a segunda vez que a companhia Chão de Oliva aborda um texto poético, depois de em 1998 ter estreado uma peça a partir da poesia de Alexandre O'Neill.
A peça «Se eu não morresse, nunca!» estará em cena de 19 de Outubro a 19 de Novembro na Casa Teatro de Sintra. A companhia não exclui encenar também outros poetas, como Camilo Pessanha, Antero de Quental ou Mário de Sá-Carneiro.
Cesário Verde é considerado um dos poetas que melhor descreveu o quotidiano e a dicotomia campo/cidade.
Morreu em 1886 com apenas 31 anos sem ter publicado qualquer obra poética.
Um ano após a sua morte, Silva Pinto, amigo do escritor, compilou os seus poemas em «O Livro de Cesário Verde».
domingo, 15 de outubro de 2006
Domingo
Quando chega domingo,
faço tenção de todas as coisas mais belas
que um homem pode fazer na vida.
Há quem vá para o pé das águas
deitar-se na areia e não pensar...
E há os que vão para o campo
cheios de grandes sentimentos bucólicos
porque leram, de véspera, no boletim do jornal:
«bom tempo para amanhã»...
Mas uma maioria sai para as ruas pedindo,
pois nesse dia
aqueles que passeiam com a mulher e os filhos
são mais generosos.
Um rapaz que era pintor
não disse nada a ninguém
e escolheu o domingo para se matar.
Ainda hoje a família e os amigos
andam pensando porque seria.
Só não relacionam que se matou num domingo!
Mariazinha Santos
(aquela que um dia se quis entregar,
que era o que a família desejava,
para que o seu futuro ficasse resolvido),
Mariazinha Santos
quando chega domingo,
vai com uma amiga para o cinema.
Deixa que lhe apalpem as coxas
e abafa os suspiros mordendo um lencinho que sua mãe lhe bordou,
quando ela era ainda muito menina...
Para eu contar isto
é que conheço todas as horas que fazem um dia de domingo!
À hora negra das noites frias e longas
sei duma hora numa escada
onde uma velha põe sua neta
e vem sorrir aos homens que passam!
E a costureirinha mais honesta que eu namorei
vendeu a virgindade num domingo
— porque é o dia em que estão fechadas as casas de penhores!
Há mais amargura nisto
que em toda a História das Guerras.
Partindo deste princípio,
que os economistas desconhecem ou fingem desconhecer,
eu podia destruir esta civilização capitalista, que inventou o domingo.
E esta era uma das coisas mais belas
que um homem podia fazer na vida!
Então,
todas as raparigas amariam no tempo próprio
e tudo seria natural
sem mendigos nas ruas nem casas de penhores...
Penso isto, e vou a grandes passadas...
E um domingo parei numa praça
e pus-me a gritar o que sentia,
mas todos acharam estranhos os meus modos
e estranha a minha voz...
Mariazinha Santos foi para o cinema
e outras menearam as ancas
— ao sol
como num ritual consagrado a um deus! —
até chegar o homem bem-amado entre todos
com uma nota de cem na mão estendida...
Venha a miséria maior que todas
secar o último restolho de moral que em mim resta;
e eu fique rude como o deserto
e agreste como o recorte das altas serras;
venha a ânsia do peito para os braços!
E vou a grandes passadas
como um louco maior que a sua loucura...
O rapaz que era pintor
aconchegou-se sobre a linha férrea
para que a morte o desfigurasse
e o seu corpo anónimo fosse uma bandeira trágica
de revolta contra o mundo.
Mas como o rosto lhe estava intacto
vai a família ao necrotério e ficou aterrada!
Conheci-o numa noite de bebedeira
e acho tudo aquilo natural.
A costureirinha que eu namorei
deixava-se ir para as ruas escuras
sem nenhum receio.
Uma vez que chovia até entrámos numa escada.
Somente sequer um beijo trocámos...
E isto porque no momento próprio
olhava para mim com um propósito tão sereno
que eu, que dela só desejava o corpo bom feito,
me punha a observar o outro aspecto do seu rosto,
que era aquela serenidade
de pessoa que tem a vida cheia e inteira.
No entanto, ela nunca pôs obstáculo
que nesse instante as minhas mãos segurassem as suas.
Hoje encontramo-nos aí pelos cafés...
(ela está sempre com sujeitos decentes)
e quando nos fitamos nos olhos,
bem lá no fundo dos olhos,
eu que sou homem nascido
para fazer as coisas mais heróicas da vida
viro a cabeça para o lado e digo:
— rapaz, traz-me um café...
O meu amigo, que era pintor,
contou-me numa noite de bebedeira:
— Olha,
quando chega domingo,
não há nada melhor que ir para o futebol...
E como os olhos se me enevoassem de água,
continuou com uma voz
que deve ser igual à que se ouve nos sonhos:
— .... no entanto, conheço um homem
que ia para a beira do rio
e passava um dia inteirinho de domingo
segurando uma cana donde caia um fio para a água...
... um dia pescou um peixe,
e nunca mais lá voltou...
O pior é pensar:
que hei-de fazer hoje, que toda a gente anda alegre
como se fosse uma festa?... —
O rapaz que era pintor sabia uma ciência rara,
tão rara e certa e maravilhosa
que deslumbrado se matou.
Pago o café e saio a grandes passadas.
Hoje e depois e todos os dias que vierem,
amo a vida mais e mais
que aqueles que sabem que vão morrer amanhã!
Mariazinha Santos,
que vá para o cinema morder o lencinho que sua mãe lhe bordou...
E os senhores serenos, acompanhados da mulher e dos filhos,
que parem ao sol
e joguem um tostão na mão dos pedintes...
E a menina das horas longas e frias
continue pela mão de sua avó...
E tu, que só andas com cavalheiros decentes,
ó costureirinha honesta que eu namorei um dia,
fita-me bem no fundo dos olhos,
fita-me bem no fundo dos olhos!
Então,
virá a miséria maior que todas
secar o último restolho de moral que em mim resta;
e eu ficarei rude como o deserto
e agreste como o recorte das altas serras:
e virá a ânsia do peito para os braços!
Domingo que vem,
eu vou fazer as coisas mais belas
que um homem pode fazer na vida!
Manuel da Fonseca
Na voz de Mário Viegas:
faço tenção de todas as coisas mais belas
que um homem pode fazer na vida.
Há quem vá para o pé das águas
deitar-se na areia e não pensar...
E há os que vão para o campo
cheios de grandes sentimentos bucólicos
porque leram, de véspera, no boletim do jornal:
«bom tempo para amanhã»...
Mas uma maioria sai para as ruas pedindo,
pois nesse dia
aqueles que passeiam com a mulher e os filhos
são mais generosos.
Um rapaz que era pintor
não disse nada a ninguém
e escolheu o domingo para se matar.
Ainda hoje a família e os amigos
andam pensando porque seria.
Só não relacionam que se matou num domingo!
Mariazinha Santos
(aquela que um dia se quis entregar,
que era o que a família desejava,
para que o seu futuro ficasse resolvido),
Mariazinha Santos
quando chega domingo,
vai com uma amiga para o cinema.
Deixa que lhe apalpem as coxas
e abafa os suspiros mordendo um lencinho que sua mãe lhe bordou,
quando ela era ainda muito menina...
Para eu contar isto
é que conheço todas as horas que fazem um dia de domingo!
À hora negra das noites frias e longas
sei duma hora numa escada
onde uma velha põe sua neta
e vem sorrir aos homens que passam!
E a costureirinha mais honesta que eu namorei
vendeu a virgindade num domingo
— porque é o dia em que estão fechadas as casas de penhores!
Há mais amargura nisto
que em toda a História das Guerras.
Partindo deste princípio,
que os economistas desconhecem ou fingem desconhecer,
eu podia destruir esta civilização capitalista, que inventou o domingo.
E esta era uma das coisas mais belas
que um homem podia fazer na vida!
Então,
todas as raparigas amariam no tempo próprio
e tudo seria natural
sem mendigos nas ruas nem casas de penhores...
Penso isto, e vou a grandes passadas...
E um domingo parei numa praça
e pus-me a gritar o que sentia,
mas todos acharam estranhos os meus modos
e estranha a minha voz...
Mariazinha Santos foi para o cinema
e outras menearam as ancas
— ao sol
como num ritual consagrado a um deus! —
até chegar o homem bem-amado entre todos
com uma nota de cem na mão estendida...
Venha a miséria maior que todas
secar o último restolho de moral que em mim resta;
e eu fique rude como o deserto
e agreste como o recorte das altas serras;
venha a ânsia do peito para os braços!
E vou a grandes passadas
como um louco maior que a sua loucura...
O rapaz que era pintor
aconchegou-se sobre a linha férrea
para que a morte o desfigurasse
e o seu corpo anónimo fosse uma bandeira trágica
de revolta contra o mundo.
Mas como o rosto lhe estava intacto
vai a família ao necrotério e ficou aterrada!
Conheci-o numa noite de bebedeira
e acho tudo aquilo natural.
A costureirinha que eu namorei
deixava-se ir para as ruas escuras
sem nenhum receio.
Uma vez que chovia até entrámos numa escada.
Somente sequer um beijo trocámos...
E isto porque no momento próprio
olhava para mim com um propósito tão sereno
que eu, que dela só desejava o corpo bom feito,
me punha a observar o outro aspecto do seu rosto,
que era aquela serenidade
de pessoa que tem a vida cheia e inteira.
No entanto, ela nunca pôs obstáculo
que nesse instante as minhas mãos segurassem as suas.
Hoje encontramo-nos aí pelos cafés...
(ela está sempre com sujeitos decentes)
e quando nos fitamos nos olhos,
bem lá no fundo dos olhos,
eu que sou homem nascido
para fazer as coisas mais heróicas da vida
viro a cabeça para o lado e digo:
— rapaz, traz-me um café...
O meu amigo, que era pintor,
contou-me numa noite de bebedeira:
— Olha,
quando chega domingo,
não há nada melhor que ir para o futebol...
E como os olhos se me enevoassem de água,
continuou com uma voz
que deve ser igual à que se ouve nos sonhos:
— .... no entanto, conheço um homem
que ia para a beira do rio
e passava um dia inteirinho de domingo
segurando uma cana donde caia um fio para a água...
... um dia pescou um peixe,
e nunca mais lá voltou...
O pior é pensar:
que hei-de fazer hoje, que toda a gente anda alegre
como se fosse uma festa?... —
O rapaz que era pintor sabia uma ciência rara,
tão rara e certa e maravilhosa
que deslumbrado se matou.
Pago o café e saio a grandes passadas.
Hoje e depois e todos os dias que vierem,
amo a vida mais e mais
que aqueles que sabem que vão morrer amanhã!
Mariazinha Santos,
que vá para o cinema morder o lencinho que sua mãe lhe bordou...
E os senhores serenos, acompanhados da mulher e dos filhos,
que parem ao sol
e joguem um tostão na mão dos pedintes...
E a menina das horas longas e frias
continue pela mão de sua avó...
E tu, que só andas com cavalheiros decentes,
ó costureirinha honesta que eu namorei um dia,
fita-me bem no fundo dos olhos,
fita-me bem no fundo dos olhos!
Então,
virá a miséria maior que todas
secar o último restolho de moral que em mim resta;
e eu ficarei rude como o deserto
e agreste como o recorte das altas serras:
e virá a ânsia do peito para os braços!
Domingo que vem,
eu vou fazer as coisas mais belas
que um homem pode fazer na vida!
Manuel da Fonseca
Na voz de Mário Viegas:
Manuel da Fonseca
Manuel Dias da Fonseca nasceu em Santiago do Cacém, em 15 de Outubro de 1911. Fez os estudos secundários em Lisboa, tendo-se dedicado desde cedo ao jornalismo. Em 1925 publicou num semanário de província os seus primeiros versos e narrativas.
Iniciou-se na poesia com a colectânea "Rosa dos Ventos" (1940) e na ficção, com os contos "Aldeia Nova" (1942). Ligado ao neo-realismo, evoluiu no sentido de um regionalismo crescente, ligado ao seu Alentejo natal, retratando o povo desta região e a miséria por ele sofrida. Contestatário e observador por natureza, a sua escrita era seguida de perto pela censura.
Colaborou em várias publicações, de que se destacam as revistas "Afinidades", "Altitude", "Árvore", "Vértice", "O Pensamento", "Sol Nascente", "Seara Nova", os jornais "O Diabo" e "Diário" e fez parte do grupo do "Novo Cancioneiro".
Escreveu, para além das obras referidas, os volumes de poesia "Planície" (1941), "Poemas Completos" (1958), "Poemas Dispersos" (1958), os contos "O Fogo e as Cinzas" (1951), "Um Anjo no Trapézio" (1968), "Tempo de Solidão" (1973), "Crónicas Algarvias" (1986), e os romances "Cerromaior" (1943), e "Seara de Vento" (1958).
Colaborou também no jornal "A Capital" em 1986, com as "Crónicas Algarvias".
Preparou ainda a "Antologia de Fialho de Almeida" (1984).
Manuel da Fonseca faleceu em 1993.
Iniciou-se na poesia com a colectânea "Rosa dos Ventos" (1940) e na ficção, com os contos "Aldeia Nova" (1942). Ligado ao neo-realismo, evoluiu no sentido de um regionalismo crescente, ligado ao seu Alentejo natal, retratando o povo desta região e a miséria por ele sofrida. Contestatário e observador por natureza, a sua escrita era seguida de perto pela censura.
Colaborou em várias publicações, de que se destacam as revistas "Afinidades", "Altitude", "Árvore", "Vértice", "O Pensamento", "Sol Nascente", "Seara Nova", os jornais "O Diabo" e "Diário" e fez parte do grupo do "Novo Cancioneiro".
Escreveu, para além das obras referidas, os volumes de poesia "Planície" (1941), "Poemas Completos" (1958), "Poemas Dispersos" (1958), os contos "O Fogo e as Cinzas" (1951), "Um Anjo no Trapézio" (1968), "Tempo de Solidão" (1973), "Crónicas Algarvias" (1986), e os romances "Cerromaior" (1943), e "Seara de Vento" (1958).
Colaborou também no jornal "A Capital" em 1986, com as "Crónicas Algarvias".
Preparou ainda a "Antologia de Fialho de Almeida" (1984).
Manuel da Fonseca faleceu em 1993.
Hoje nasceu...
15 de Outubro de 1911
Manuel da Fonseca
Escritor português
Artigos relacionados:
Biografia
Poemas: Aldeia ; Domingo ; Segundo (poemas da infância) ;
sábado, 14 de outubro de 2006
Ruy Belo em Sintra
A primeira edição da Tertúlia de Poetas de Sintra, dedicada ao poeta Ruy Belo vai ter lugar no dia 19 de Outubro, às 21 horas, no espaço Saca de Café, com entrada livre.
As inscrições deverão ser feitas até dia 18 de Outubro, através dos seguintes endereços de e-mail: nestevens@sapo.pt e joze.sabugo@oninet.pt
A conversa irá fluir à volta do mote “Um Poeta no País Possível”, relacionado com o legado poético de Ruy Belo.
sexta-feira, 13 de outubro de 2006
Poemas em voz alta
"O menino da sua mãe"
No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas traspassado
— Duas, de lado a lado —,
Jaz morto, e arrefece.
Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.
Tão jovem! que jovem era!
(Agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
"O menino da sua mãe".
Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lha a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.
De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço... Deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.
Lá longe, em casa, há a prece:
"Que volte cedo, e bem!"
(Malhas que o Império tece!)
Jaz morto, e apodrece,
O menino da sua mãe.
Fernando Pessoa
(Cancioneiro)
Na voz de Luís Gaspar:
No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas traspassado
— Duas, de lado a lado —,
Jaz morto, e arrefece.
Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.
Tão jovem! que jovem era!
(Agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
"O menino da sua mãe".
Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lha a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.
De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço... Deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.
Lá longe, em casa, há a prece:
"Que volte cedo, e bem!"
(Malhas que o Império tece!)
Jaz morto, e apodrece,
O menino da sua mãe.
Fernando Pessoa
(Cancioneiro)
Na voz de Luís Gaspar:
quinta-feira, 12 de outubro de 2006
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