quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


A Leve Têmpora do Vento
Carlos de Oliveira
Antologia Poética
Quasi, 2001







Só, em meu quarto, escrevo à luz do olvido;
deixai que escreva pela noite dentro:
sou um pouco de dia anoitecido
mas sou convosco a treva florescendo.

Por abismos de mitos e descrenças
venho de longe, nem eu sei de aonde:
sou a alegria humana que se esconde
num bicho de fábulas e crenças.

Deixai que conte pela noite fora
como a vigília é longa e desumana:
doira-me os versos já a luz da aurora,
terra da nova pátria que nos chama.

Nunca o fogo dos fáscios nos cegou
e esta própria tristeza não é minha:
fi-la das lágrimas que Portugal chorou
para fazer maior a luz que se avizinha.

1 comentário:

AugustoMaio disse...

A luz de carbureto
que ferve no gasómetro do pátio
e envolve este soneto
num cheiro de laranjas com sulfato
(as asas pantanosas dos insectos
reflectidas nos olhos, no olfacto,
a febre de consumir o meu retrato,
a ameaçar os tectos
da casa que também adoecia
ao contágio da lama
e enfim morria
nos alicerces como numa cama)
a pedregosa luz da poesia
que reconstrói a casa, chama a chama.

Carlos de Oliveira, CASA, sobre o lado esquerdo