quarta-feira, 4 de março de 2009

Os dias do Amor em Faro (parte IV)


Apresentação da antologia "Os dias do Amor" no passado dia 14 de Fevereiro, na Livraria Pátio de Letras, em Faro.
Vídeo de Adão Contreiras.


Definição do Amor


É um nada Amor que pode tudo,
É um não se entender o avisado,
É um querer ser livre e estar atado,
É um julgar o parvo por sisudo;

É um parar os golpes sem escudo,
É um cuidar que é e estar trocado,
É um viver alegre e enfadado,
É não poder falar e não ser mudo;

É um engano claro e mui escuro,
É um não enxergar e estar vendo,
É um julgar por brando ao mais duro;

É um não querer dizer e estar dizendo,
É um no mor perigo estar seguro,
É, por fim, um não sei quê, que não entendo.

Anónimo
(Séc. XVII-XVIII)



-o caçador.cativo

...............................................ao joão rasteiro

......em vão procuraram.se nas cidades

percorreu continentes e
quando desistiu
encontrou.se solto no ritmo lento
de uma valsa
dançada em contra.mão

desintegrado

sentiu as ondulações das cearas
que cearou em dança lenta
regressou estranho às recordações de antanho
antanho era a linguagem de seus avós

cresceu junto à terra gretada
pela fome das manhãs abertas
desde cedo sentiu a boca
apagada de desejo de terra pão
fustigada pelo vento

pulou a cerca
construída sobre os dias
como as copas das árvores que
costumava ouvir à noite entregue
aos seus passos de caçador furtivo
foi numa dessas deambulações que a encontrou
solta
aproximou.se
ela a medo levantou as asas
no voo ferido

soltou os cães e
ficou suspenso à dança do animal

em voo
primeiro raso
depois mais alto
arribando em direcção ao mundo
em tons de mel

engrossou o batimento das asas
ao som da pressa
do homem / caçador / cativo
daquele voar
enquanto filados
os cães esperaram a voz de comando

ele muito aquém da aventura
seguiu.lhe o volteio e
o silêncio da terra foi o elo que os uniu

ele o caçador cativo
ela solta à migração

o desejo deixou.os sob um manto de horas
semeadas a esmo
que estranho aquele olhar que
se projectava na mira do caçador
tornando.a vulnerável ao cúmplice
jogo do agarra e foge
ele o enfabulador
regressou caçador
ela de asas fechadas
pronta a deixar.se prender
olhou.o
ele viu.se
projectado no olhar em flash

uma ave / dona


gabriela rocha martins
(1948)




Antologia

Uma antologia é uma conclusão,
Mas ela apresentou-se assim, no meio daquelas pessoas.
Detalhou o seu melhor
Nas melhores palavras que executavam o meu silêncio.

Eu apresentei-me como poema do dia, como sempre fiz.
Apresentei-me como o último retrato do sol
Ou a última nuvem do romance que li.

Para minha surpresa, um dia mais tarde,
Ao ler-lhe a novíssima edição da antologia,
Apareci eu, vestido deste poema.

Tiago Nené
(1982)



O Amor é um Claro Mês

Os dias de chuva deixaram a memória aberta aos ventos. Lembro-me de ti e lembro-me de ontem. Vi-te. Sorrimo-nos. Era um silencioso e branco navio esse sorriso. Havia luz.
Amo-te, quero dizer-te. Amo-te como se nada mais existisse para lá de ti e de mim e da chuva breve. Tudo é simples. O amor é um claro mês. Mas as palavras são nada.
No silêncio poderia voar um pássaro que eu não soubesse nomear. Poderia haver um lugar desconhecido de todas as geografias. Poderia existir tão apenas uma ausência que deixa saudade e melancolia. Já viste a lua?

Fernando Cabrita
(1954
)

1 comentário:

Anónimo disse...

mt boas as contribuições dos poetas algarvios nesta antologia. qq um deles mt bom.