segunda-feira, 28 de agosto de 2006

Poemas em voz alta

"A palavra"

A palavra é uma estátua submersa, um leopardo
que estremece em escuros bosques, uma anémona
sobre uma cabeleira. Por vezes é uma estrela
que projecta a sua sombra sobre um torso.
Ei-la sem destino no clamor da noite,
cega e nua, mas vibrante de desejo
como uma magnólia molhada. Rápida é a boca
que apenas aflora os raios de uma outra luz.
Toco-lhe os subtis tornozelos, os cabelos ardentes
e vejo uma água límpida numa concha marinha.
É sempre um corpo amante e fugidio
que canta num mar musical o sangue das vogais.

António Ramos Rosa


Na voz de Luís Gaspar:

3 comentários:

elsefire disse...

um dia destes também conto colocar um post sobre o Rosa. Este poema tem tudo a ver com talvez o maior tema da sua escrita: o uso da palavra e a sua criação. É de facto um grande poeta este senhor.

ricardo disse...

:D
optima escolha!

Anónimo disse...

António Ramos Rosa é um poeta que sabe tratar a palavra de forma admirável, correndo depois o risco de se deixar enredar na sua própria teia. Por isso, à magia do som e à beleza da construção frásica segue-se algumas vezes, para o leitor, a frustração de sentir complexa a passagem para o campo do Significado.