terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Um livro de poesia a cada dia...
nem sabe o bem que lhe fazia


A carvão
Poesia reunida
Fernando de Castro Branco
Cosmorama, 2009






Rua de Costa Cabral

Ali os invernos eram longos mas suaves em sua crueldade.
Em Costa Cabral as noites eram húmidas,
mergulhava-se na madrugada com o amor preso nos dentes
e o que faltasse à vida era mesmo para rejeitar.
Pelas tantas chegavam o chulo e a prostituta
e se desesperavam em cavalgadas ruidosas
como se aos ouvidos sobejasse o que chiava:
dobradiças, encaixes ralos, folga nas madeiras
e a fraqueza de muitas mortes na cova do colchão.

Eu era o terceiro excluído, se bem que no longe
de quem olha o tecto e sente o ménage incompleto
no troisième que se ressente. E dobrado o cabo
das tormentas necessárias à juventude,
que após as aulas enfrentava promontórios ao virar da esquina,
sobrava na manhã o traço grosso
de quem leva pela rua a noite
escorrendo da cabeça.

Sem comentários: