Nâzim Hikmet, poeta turco, nasceu em 20 de Janeiro de 1902 na Salónica (na altura, parte do Reino Osmânico), filho de pais cultos, da classe dominante da época.
O seu pai era funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros, apesar de se opor à ditadura do Sultão Abdul Hamid II. A mãe, filha do filólogo Enver Pascha, tocava piano, pintava e lia poetas franceses no original, sobretudo Lamartine. Tanto a mãe, como o avô (também poeta) reconheceram e apoiaram desde sempre a inclinação de Nâzim para a poesia, que começou a escrever aos 14 anos.
Em 1917, seguindo a tradição da família, Nâzim entrou para a Escola de Cadetes de Heybeliada em Istambul, onde dava aulas o poeta Yahya Kemal Beyath, que apoiou e aconselhou Nâzim e o ajudou a publicar os seus poemas na revista “Yeni Mecmua”.
Em 1919, Nâzim foi colocado como oficial de Marinha no navio de guerra “Hamidiye”, onde contraiu uma grave pneumonia que o obrigou a abandonar o serviço em 1921. Em 1920, quando Istambul foi ocupada pela “Entente”, Nâzim tinha escrito uma série de poemas que exprimiam a sua ira, dirigida sobretudo contra os ingleses.
Com o seu amigo Vâlâ Nurettin, abandonou Istambul em segredo, com o objectivo de se juntarem ao Movimento de Libertação comandado por Mustafa Kemal Ataturk. Mas em vez de serem colocados na frente de combate, como pretendiam, enviaram-nos para Bolu para serem professores. E foi em Bolu que tiveram notícias da Revolução Russa, que lhes inflamou o sonho revolucionário. Ainda em 1921, partiram ambos para Moscovo, onde chegaram no ano seguinte.
Nâzim inscreveu-se na KUTV (Universidade Comunista dos Trabalhadores de Leste), onde veio a conhecer Meyerhold, Sverker Ek (historiador de literatura, sueco) e os poetas Bagritzki, Maiakovski e Selwinski. E foram Meyerhold e Maiakovski que influenciaram Nâzim durante muito tempo. Foi também nessa altura que entrou para o PC turco.
Quando acabou os estudos em 1924, Nâzim Hikmet regressou à Turquia. Trabalhou então para a revista “Sinema Potasi” (editada pelo pai), e colaborou com poemas e textos na revista “Aydinlik”, editada por membros dirigentes do PC turco.
Perseguido, refugiou-se durante algum tempo em Ismira. Depois de ter sido condenado à revelia a 15 anos de prisão (em 1925) e da subsequente ilegalidade, em 1927 deixou de novo a Turquia e voltou a Moscovo, onde permaneceu até 1928. Nessa altura foi publicado o seu primeiro livro de poesia, em Baku (Azerbeijão): "Canção dos Bebedores de Sol".
Depois de ter regressado de Moscovo, e de ter sido novamente preso, Nâzim começou a trabalhar para vários jornais, publicou poemas em várias revistas e editou o livro ”835 Linhas”.
A partir de 1929 adoptou uma posição crítica em relação aos principais poetas turcos, rejeitando a tradição e propondo novos caminhos na poesia.
Foi novamente preso em 1932, tendo o Ministério Público pedido a sua pena de morte, mas foi libertado no ano seguinte por ocasião de uma amnistia comemorativa dos dez anos da República.
Como era impossível continuar a assinar os trabalhos com o nome verdadeiro, adoptou um pseudónimo para escrever artigos em jornais e para assinar o seu romance “O Sangue não fala”, publicado em várias sequências.
Nos finais de 1937 a situação política na Turquia piorou, diligenciando um modo de convívio com a Inglaterra e a França, mas por outro lado, procurando relações distanciadas mas frutuosas com o Terceiro Reich, com o objectivo de silenciar os comunistas e outros que tinham detectado o perigo nazi.
Em 1938 Nâzim foi novamente preso, com base numa provocação, acusado de preparar uma revolta na marinha. Na prisão, Nâzim traduziu “A Guerra e a Paz” de Tolstoi, escreveu imensos poemas e começou a sua monumental obra “Paisagens Humanas do meu País”.
Em 1947 Nâzim apresentou ao Parlamento uma petição para revisão do seu processo, alegando inocência do crime de que tinha sido acusado, mas essa petição não surtiu efeito. Só dois anos depois o jornalista Ahmet Emin se esforçou no seu jornal “Vatan” para que Nâzim, preso injustamente, fosse libertado. Criou-se então uma onda de solidariedade que passou as fronteiras turcas e se manifestou fortemente em França.
Em Abril de 1950 Nâzim entrou em greve de fome. Apareceu então um jornal com o seu nome e que fez da sua libertação uma bandeira. Quase todos os intelectuais turcos e também numerosos políticos assinaram petições a seu favor. O Partido Democrático prometeu, em campanha eleitoral, uma amnistia geral que abrangeria Nâzim. Em Maio de 1950, o Partido Democrático ganhou as eleições e em Julho teve lugar a prometida amnistia, tendo Nâzim sido libertado, apesar da forte oposição de alguns deputados do novo partido do governo.
Nâzim Hikmet, que tinha sido transferido para um hospital de Istambul durante a greve de fome, recomeçou a vida, escrevendo guiões de filmes. Casou com Munevver, sua terceira mulher, e em 1951 nasceu o seu filho Mémet. Mas os círculos reaccionários recomeçaram a complicar-lhe a vida. Com 50 anos, e independentemente de ter sido cadete da Marinha, preparavam-se para o chamar de novo às fileiras e fizeram correr o boato que durante o serviço militar seria liquidado. Nessa altura já Nâzim tinha contraído uma grave doença cardíaca. Para fugir à ameaça de morte, em 17 de Junho de 1951 fugiu de Istambul num pequeno barco a motor que o levou ao Mar Negro. Aí, seguiu durante duas horas um cargueiro romeno, até que o deixaram subir a bordo. Depois de alguns dias em Bucareste, regressou a Moscovo. Em 25 de Junho foi expatriado por decreto do Conselho de Ministros. No exílio, em tempo de guerra fria e conflito na Coreia, foi eleito para o Conselho Mundial da Paz. Nesta condição visitou numerosos países, sempre com saudades do seu país natal.
Como comunista, no exílio de Moscovo, gostaria de ter participado activamente na política, mas à sua volta havia uma muralha impenetrável. Apesar dos seus esforços, não conseguiu voltar a encontrar Meyerhold nem os velhos comunistas turcos que viviam na União Soviética desde os anos 30. Depois do discurso secreto de Kruchtchev no 20º Congresso e da reabilitação dos bolcheviques e artistas revolucionários mandados executar, juntamente com comunistas turcos exilados, Nâzim percebeu o que tinha sucedido na terra dos seus sonhos durante os últimos 20 anos e a partir desta altura, empenhou-se em desmascarar a preversão do culto da personalidade e pela casta burocrática imposta por Staline.
No final dos anos 50 a sua saúde piorou. Em 1959 casou com a quarta mulher, Vera. Adoeceu gravemente depois de uma viagem à Tanganica. Já pressentindo a morte, escreveu "O meu enterro". Morreu de enfarte do miocárdio em Junho de 1963, de manhã cedo, quando ia comprar os jornais.
Nâzim Hikmet consegiu, graças ao seu génio e à sua enorme simpatia, causar naqueles que o liam e escutavam, uma enorme admiração, que vinha da sua coragem, experiência, sinceridade e humanidade.
A sua poesia é uma mensagem de esperança (de alguém que passou praticamente a vida inteira na prisão ou no exílio), lida em todo o mundo.
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