domingo, 10 de junho de 2007

West Indies, Ltd.

1.
West Indies! Nozes de coco, tabaco e aguardente…
Este é um escuro povo sorridente,
conservador e liberal,
ganadeiro e açucareiro,
onde às vezes corre muito dinheiro,
mas onde se vive sempre muito mal.
O sol cresta aqui todas as coisas,
do cérebro às rosas.
Sob o relampagueante fato de cetim
trazemos ainda a tanga;
gente simples e terna, descendente de escravos
e daquela chusma incivil
de variadíssima espécie,
que em nome de Espanha
Colombo cedeu às Índias em atitude gentil.

Aqui há brancos e negros e chineses e mulatos.
Trata-se, sem dúvida, de cores baratas,
pois através de tratos e contratos
se confundiram os tons e não há uma cor estável.
(Se alguém pensa o contrário, que avance um passo e fale.)
Há aqui tudo isso, e há partidos políticos
e oradores que dizem: “Nestes momentos críticos…”
Há bancos e banqueiros,
legisladores e bolsistas,
advogados e jornalistas,
médicos e porteiros.
Que pode faltar-nos?
E mesmo que nos faltasse mandá-lo-íamos buscar.
West Indies! Nozes de coco, tabaco e aguardente.
Este é um escuro povo sorridente…

Ah, terra insular!
Ah, terra estreita!
Não é verdade que parece feita
só para plantar um palmar?
Terra na rota do “Orinoco”,
ou de outro barco excursionista,
repleto de gente sem um artista
e sem um louco;
portos onde o que regressa de Taiti,
do Afeganistão ou de Seul
vem a comer o céu azul,
regando o com Bacardi;
portos que falam em inglês
que começa em yes e acaba em yes.
(Inglês de cicerones a quatro pés.)
West Indies! Nozes de coco, tabaco e aguardente.
Este é um escuro povo sorridente.

Rio-me de ti, nobre das Antilhas,
macaco que andas saltando de mata em mata,
palhaço que suas para não meter a pata
e sempre a metes até aos joelhos.
Rio-me de ti, branco de verdes veias
— vêem se bem, embora procures ocultá-las! —
rio-me de ti porque falas de aristocracias puras,
de engenhos florescentes e arcas cheias.
Rio-me de ti, negro macaqueador,
que abres os olhos diante do automóvel dos ricos,
e tens vergonha de olhar a tua pele escura,
quando tens o punho tão duro!
Rio-me de todos: do polícia e do bêbedo,
do pai e do seu rapaz,
do presidente e do bombeiro.
Rio-me de todos; rio-me do mundo inteiro.
Do mundo inteiro, que se emociona diante de quatro peludos erguidos muito inchados atrás dos seus ruidosos escudos
como quatro selvagens ao pé dum coqueiro.

6.
West Indies! West Indies! West Indies!
Este é um povo hirsuto,
de cobre, multicéfalo, onde a vida rasteja
com a lama seca estampada na pele.
Este é o presídio
onde cada homem tem atados os pés.
Esta é a grotesca sede de companies e trusts.
Aqui estão o lago de asfalto, as minas de ferro,
as plantações de café,
os port docks, os ferry boats, os ten cents…
Esta é a terra do all right
onde tudo está muito mal;
esta é a terra do very well,
onde ninguém está bem.

Aqui estão os servidores de Mr. Babbit.
Os que educam os filhos em West Point.
Aqui estão os que guincham: hello baby
e fumam “Chesterfield” e “Lucky Strike”.
Aqui estão os dançarinos dos fox trots,
os boys do jazz band
e os veraneantes de Miami e Palm Beach.
Aqui estão os que pedem bread an butter
e coffe and milk.
Aqui estão os absurdos jovens sifilíticos,
fumadores de ópio e marijuana,
exibindo em vitrinas as suas espiroquetas
e vestindo um fato cada semana.
Aqui está o melhor de Port au Prince.
O mais puro de Kingston, a high life de Havana…
Mas aqui estão também os que remam em lágrimas,
galerianos dramáticos, galerianos dramáticos.

Aqui estão eles,
os que trabalham com um feixe de clarões
a pedra dura onde a pouco e pouco se crispa
o punho dum titã. Os que acendem a chispa
vermelha, sobre o campo seco.
Os que gritam: ?Já vamos!?, e responde lhes o eco
de outras vozes: “Já vamos!” Os que em fero tumulto
sentem latir o sangue com sílabas de insulto.
Que fazer com eles,
Se trabalham com um feixe de clarões?

Aqui estão os que cotovelo com cotovelo
tudo arriscam, tudo
dão com generosas mãos;
aqui estão os que se sentem irmãos
do negro, que dobrando sobre a vala escura
a fronte, se derrete em suor puro,
e do branco, que sabe que a carne é argila
má quando a fere o chicote, e pior se a humilha,
sob a bota, porque então levanta
a voz, que é como um trovão brutal na garganta.
Esses são os que sonham acordados,
os que no fundo da mina lutam,
e ali a voz escutam
com que gritam os vivos e os mortos.

Esses, os iluminados,
os párias desconhecidos,
os humilhados,
os preteridos,
os esquecidos,
os desalinhados,
os amarrados,
os inteiriçados,
os que diante da mauser exclamam. “Irmãos soldados!”
e rolam feridos
com um fio vermelho nos lábios roxos.
(Que o tumulto siga a sua marcha!
Que flutuem as bárbaras bandeiras
e que as bandeiras ardam
sobre o tumulto!)

Nicolás Guillén
Tradução de Albano Martins

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